São mulheres a maior parte das vítimas de exposição de fotos ou vídeos íntimos (nudes) que circulam pela internet. Segundo a Defensoria Pública do Distrito Federal, a maior parte das imagens íntimas é vazada por ex-companheiros, geralmente inconformados com a separação.
Não há uma lei específica que tipifique a chamada “pornografia de vingança”. Contudo, a legislação brasileira prevê outras punições para essas ações enquadradas como crimes contra a honra.
“O relacionamento era mantido na base da confiança. Mas em uma cultura profundamente machista, os homens pensam que as mulheres são sua propriedade e não aceitam o fim do relacionamento. É uma objetificação do corpo da mulher”, explica a defensora pública e coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria, Dulcielly Nóbrega.
Divulgar ou gravar imagens íntimas sem autorização é considerado violação de intimidade por uso indevido da imagem. O compartilhamento desse material nas redes sociais configura um agravante a essa conduta pelo efeito viral desse conteúdo, repassado simultaneamente a diversos usuários.
No ano passado, a ONG Safernet, que promove direitos humanos na internet, recebeu 322 denúncias de exposição íntima on-line. O diretor da ONG, Rodrigo Nejm, explica que quando esse tipo de conteúdo cai no ambiente on-line, a maneira como se multiplica é quase ilimitada.
Denúncia
Para denunciar as violações, as vítimas podem recorrer às delegacias de repressão a crimes cibernéticos, presentes em 17 estados: Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul, São Paulo, Sergipe, Rio de Janeiro e Tocantins.
A ONG Safernet também registra as queixas contra páginas na internet que expõem a vítima e auxilia as mulheres a requerer a remoção do conteúdo da rede.
As pessoas que compartilham esse tipo de material podem ser enquadradas no crime de difamação (Art. 139), já que atribui fato negativo e ofensivo à reputação de alguém, prevendo pena de detenção, de três meses a um ano, além de multa; e crime de injúria (Art.140), quando atribui palavras ou qualidades negativas à vítima, neste acaso, a pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa.
Busca por apoio
Segundo o diretor da Safernet, as consequências desses crimes para a vítima são desastrosas e vão desde de prejuízos materiais – como a perda do emprego após a divulgação das imagens – a problemas emocionais, como a dificuldade de se relacionar com outras pessoas. Depressão e transtornos de ansiedade também são comuns nesses casos e por isso é importante procurar ajuda de um profissional.
“Procurar apoio psicossocial, procurar ajuda da defensoria pública para ajuizar a denúncia. São crimes que têm consequências drásticas, e a maioria das vítimas são as mulheres”, afirma Dulcielly. “É praticamente um linchamento social, e por isso tem de ter um crime específico para combater os danos causados”, defendeu.
Legislação
Para resguardar os usuários, o Marco Civil da Internet, sancionado em 2014, dispõe no artigo 21 sobre a única exceção para que conteúdos sejam excluídos da rede sem ordem judicial. Isso é possível justamente em situações denunciadas por internautas que tenham tido sua intimidade exposta na internet. As empresas nas quais o conteúdo foi veiculado têm formulários que são preenchidos pelas vítimas para pedir a remoção dos arquivos.
A norma determina ainda que o provedor desse conteúdo também pode ser responsabilizado pela violação da intimidade da vítima.
Além do uso de câmeras escondidas e vazamentos, há ainda os casos em que o material é roubado do computador ou celular da vítima. Hackers ou mesmo funcionários de assistências técnicas lançam mão de diferentes técnicas para invadir o dispositivo e acessar os registros íntimos armazenados. “O intuito é humilhar”, explica Rodrigo.
A atriz Carolina Dieckmann foi alvo dessa violação. Após ter fotos íntimas roubadas e divulgadas na internet, ainda foi ameaçada de pagar R$ 10 mil para que as imagens não fossem publicadas.
Depois do episódio, foi sancionada a lei 12.737 em 2012, que recebeu o nome da atriz e descreve como crime a invasão de dispositivos para violar os dados nele contidos para chantagear a vítima. A pena para os condenados por esses crimes varia de seis meses a dois anos de prisão, além do pagamento de multa.
Para Dulcielly, a prevenção e combate a esses crimes deve ocorrer também a partir da mudança no imaginário coletivo. “[Esse] é um problema de violência de gênero. Para mudar isso, tem de haver uma mudança de cultura. A prevenção deve começar dentro das escolas e também por meio de campanhas educativas.”