Em fevereiro deste ano, o piloto de helicóptero Felipe Ramos Morais saiu de São Paulo, juntamente com a namorada, com destino a Fortaleza para realizar, como de costume, um voo a serviço da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Felipe havia sido convocado pelo chefe do tráfico da Baixada Santista, Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, 32 anos, para fazer uma viagem com ele e mais dois passageiros — também integrantes da organização criminosa — da capital cearense para a cidade de São Paulo.
Sem saber, Felipe conduziu, no dia 15 de fevereiro, a viagem que ficou conhecida como “voo da morte”. Ele levou os líderes do PCC Rogério Jeremias de Simone, conhecido como Gegê do Mangue, e Fabiano Alves de Sousa, o Paca, para serem assassinados por Cabelo Duro na cidade de Aquiraz, a cerca de 30 km de Fortaleza.
Seis meses depois, no dia 3 de agosto, o MP-CE (Ministério Público do Ceará) denunciou à Justiça do Estado nove homens e uma mulher suspeitos de participarem do crime contra os dois líderes do Primeiro Comando da Capital.
O Ministério Público conseguiu avançar nas investigações sobre morte a Gegê do Mangue e Paca graças à colaboração do piloto Felipe, que deu “preciosos detalhes sobre o assassinato das vítimas”. Ele é o único preso entre os denunciados.
De acordo com o documento que o R7 teve acesso, encaminhado à 1ª Vara da Comarca de Aquiraz, Cabelo Duro atuou no planejamento e execução dos assassinatos com determinações do denunciado conhecido como Fuminho, 47 anos.
Cabelo Duro foi assassinado com tiros de fuzil no dia 22 de fevereiro, no Jardim Anália Franco (zona leste de São Paulo). Das 10 pessoas denunciadas, nove estão foragidas e com prisão decretada e o piloto Felipe está detido na Superintendência da Polícia Federal no Ceará.
Felipe foi preso no dia 14 de maio, em Caldas Novas (160 km de Goiânia), apontado como o responsável por conduzir o helicóptero que levou Gegê do Mangue e Paca à cidade de Aquiraz, onde foram assassinados.
Segundo o MP-CE, metade dos denunciados residiam em cidades da Baixada Santista e, sob comando de Cabelo Duro, integravam uma organização criminosa associada à facção PCC que dominava o tráfico de drogas e armas, roubos e lavagem de dinheiro na região do litoral paulista.
Dos outros cinco denunciados, ainda conforme o Ministério Público, um morava na cidade de São Paulo, um em Mauá (Grande SP), outro em Mombaça (300 km de Fortaleza). Um tinha três endereços residenciais diferentes (Mombaça, Mauá e São Paulo) e outro constava que morava em Fortaleza ou na capital paulista.
As investigações apontam que Cabelo Duro havia reclamado que Gegê do Mangue e Paca estavam desviando quantias milionárias do PCC, planejavam levar seus aliados ao Paraguai para ajudar na logística do tráfico e que eles “não levantavam a bunda de suas cadeiras em suas mansões para irem nas favelas a fim de resolverem os problemas da facção”.
Cabelo Duro teria dito ainda ao piloto Felipe que os dois também morreriam no dia do crime contra Gegê do Mangue e Paca. De acordo com as investigações do Ministério Público, o helicóptero que Felipe pilotava seria alvo de tiros de uma metralhadora calibre ponto 50. No entanto, a influência de Cabelo Duro no PCC fez com que a facção entregasse a ele a responsabilidade de matar a dupla — poupando a vida dele (Cabelo Duro) e do piloto.
Com a suposta mudança de planos da facção, o primeiro voo do dia 15 de fevereiro tinha, além do piloto Felipe, Cabelo Duro e outros cinco integrantes do PCC — dois cearenses, dois da Baixada Santista e outro de Mauá. A princípio, o piloto afirma ter recebido a informação de Cabelo Duro que faria uma viagem com apenas mais outras duas pessoas.
Na investigação, Felipe teria dito que era normal Cabelo Duro mudar repentinamente a quantidade de passageiros nos voos da facção, mas estranhou a forma como as mudanças e conversas estavam sendo feitas. O piloto diz que chegou a pensar que seria morto também.
Os denunciados foram até uma localidade identificada como Lagoa Encantada, próximo à reserva indígena de Aquiraz, onde teve uma reunião entre os seis integrantes da facção. Felipe ficou dentro do helicóptero ainda ligado, conforme havia sido ordenado por Cabelo Duro. O piloto seguia temendo o que poderia acontecer com ele.
A preocupação de Felipe surgiu principalmente porque, no mês anterior, em janeiro, havia sido torturado por traficantes do Guarujá subordinados a Cabelo Duro. De acordo com as investigações, o líder do PCC na Baixada Santista estava devendo para Felipe por viagens do piloto no helicóptero da facção. Quando o detido foi cobrar Cabelo Duro, foi espancado.
As agressões, segundo Felipe à polícia, fizeram com que ele saísse do Guarujá e passasse a morar em Goiás. O piloto ainda teria sido avisado que a tortura ocorreu por causa das cobranças feitas por ele a Cabelo Duro e, além de parar de pedir o pagamento, começou a ser ameaçado caso deixasse o PCC sem suporte aéreo. Por isso, de acordo com ele, conduziu o “voo da morte”.
O ‘voo da morte’
Conforme as investigações, depois da reunião entre os Cabelo Duro e os outros cinco membros do PCC, o líder da facção em Guarujá disse para Felipe voltar com ele para a Praia do Futuro, em Fortaleza. No local, Gegê do Mangue e Paca chegaram em um Land Rover e embarcaram na aeronave.
Durante o “voo da morte”, que estavam os quatro a bordo (Felipe, Cabelo Duro, Gegê do Mangue e Paca), as vítimas teriam sido informadas por Cabelo Duro que iriam pousar em Aquiraz para pegar tambores de combustível. Felipe estranhou por causa que a aeronave estava abastecida.
Ainda sem entender o que estava acontecendo, Felipe apenas seguia as ordens de Cabelo Duro. Quando pousou, as vítimas acreditavam que iriam buscar os tambores de combustível. No entanto, apareceram os outros cinco integrantes do PCC que haviam ficado no local após a reunião. Segundo Felipe, todos estavam armados com pistola.
O piloto teria levantado as mãos enquanto Cabelo Duro executava Gegê do Mangue e Paca. O primeiro levou um único tiro na região nasal, enquanto o segundo foi baleado quatro vezes: na cabeça, maxilar, cotovelo e região da barriga.
R7