Fotos: Bruno Concha/Secom
Eram 8h quando o relógio digital localizado entre o Mercado Modelo e o Monumento à Cidade de Salvador, no Comércio, marcava 28 graus. Uma hora depois, o mesmo aparelho registrava 30 de temperatura. “Quando saí de casa vi na TV que o dia de hoje vai chegar a 32 graus”, anunciou a hoteleira Rosângela Santos, 52 anos, enquanto passava protetor solar no meio da rua, antes do cortejo da Lavagem do Bonfim.
De fato, o clima pela manhã estava tão quente quanto a fé de uma multidão de fiéis e devotos que se concentraram frente à Basílica da Nossa Senhora da Conceição da Praia para o início da maior manifestação religiosa de rua da Bahia. Atmosfera essa que atrai gente de todos os cantos. Até mesmo os super-heróis.
Parado em frente ao Mercado Modelo, estava nada mais nada menos que o Capitão América chamando atenção de quem passava sentido à Colina Sagrada. “ Vim para salvar a humanidade. Agora, estou esperando os outros Vingadores chegarem para fazer o cortejo”, disse Edvaldo Ramos, 52 anos, fantasiado de um dos célebres personagens das histórias em quadrinhos da Marvel.
Entre detalhes dos adereços usado pelo tal capitão, o escudo com o símbolo do Esporte Clube Bahia. “Sempre torci. É meu time de coração. Venho assim pra lavagem desde 2010. Mas é meio complicado ficar com essa roupa por causa do calor. Por conta disso nem sei se vou fazer o percurso todo”, emendou ele, mostrando que até os super-heróis tem suas fraquezas.
Demonstrações de fé – Perto do Elevador Lacerda, a carioca Fátima Martins, 55, estava acompanhada do marido e dos filhos. A economista recordou que é o décimo ano que participa da lavagem e que hoje ia tentar fazer o percurso de aproximadamente 8km até a Basílica Santuário da Nosso Senhor do Bonfim. “Fiz vários pedidos ao Senhor do Bonfim. Para todas as áreas da minha vida. Pretendo chegar até a Colina e pegar a fitinha lá, inclusive”, afirmou.
O célebre ditado “Quem tem fé vai a pé”, que muitas vezes remete ao roteiro de aproximadamente três horas de caminhada que a multidão faz da Conceição da Praia (Comércio) até a Colina Sagrada (Bonfim) não se aplica ao aposentado Denivaldo Tosta, 60. Ele levou puma bicicleta toda colorida, quase que 100% adornada somente com as fitinhas do Bonfim. Ou seja, vai seguir o trajeto religioso pedalando mesmo. “Troco as fitinhas da bike quatro vezes ao ano. Um reconhecimento ao Senhor do Bonfim por ter me livrado de uma cirurgia na coluna”, citando os recentes problemas de hérnia de disco.
Em cada trecho do percurso da Lavagem do Bonfim se via mobilizações de entidades culturais e manifestações profano-religiosas. Por pelo menos cinco anos, o grupo Cara Pintada composto pelo boi bumbá, uma mulinha e por percussionistas, viajaram 103 km de Lustosa, em Teodoro Sampaio, a Salvador para participar do cortejo com batuque dos tambores e dos ritmos e manifestações presentes no interior baiano. Teve também muita capoeira, roda de samba, fanfarras. Elementos culturais já tradicionais mas que sempre dão aquele tempero especial à festa.
“Estou maravilhada. É a primeira vez que venho. Tem de tudo aqui. Dá para dançar, se divertir. Um pré-Carnaval!” aprovou a advogada Adriana Lariú, 47, que veio de Natal, capital do Rio Grande do Norte. Aliás, o tio dela, o escritor baiano Nilvado Lariú, autor do famoso Dicionário de Baianês, também estava presente para acompanhar a família durante os festejos. “Meu Bonfim faz parte do lugar onde moro. Embora eu não tenha religião, todos os santos pelos quais o baiano é devoto, eu sou”, disse.