Passar mais tempo na escola e participar de atividades como teatro, dança e reforço escolar aumenta a chance de estudantes do ensino médio serem aprovados no vestibular. Além disso, eles terão, em média, um salário maior do que os demais ao ingressar no mercado de trabalho.
O resultado faze parte da pesquisa inédita Mais integral, mais oportunidades: um estudo sobre a trajetória dos egressos da rede estadual de Pernambuco, feita pelo Laboratório de Pesquisa e Avaliação em Aprendizagem da Fundação Getúlio Vargas (Learn/FGV) e pelo Instituto Sonho Grande, em parceria com a Secretaria de Educação de Pernambuco.
De acordo com o levantamento, alunos formados em escolas de tempo integral têm 63% de chance de entrar no ensino superior, enquanto os de escolas de tempo parcial têm 46%. A diferença é de 17 pontos percentuais.
A pesquisa mostra que ter cursado o ensino médio em escolas de tempo integral confere aos estudantes no ensino médio R$ 265 a mais de rendimento, o que corresponde a 18% do salário mensal médio. Enquanto os jovens que cursaram o ensino médio em escolas de tempo parcial ganham, em média, R$ 1.452,22, os egressos de escolas em tempo integral recebem R$ 1.717,66.
Os dados foram coletados em entrevistas com 2.814 estudantes formados no ensino médio entre 2009 e 2014 e que frequentaram tanto escolas integrais quanto escolas parciais da rede estadual de Pernambuco, considerada referência na implantação do ensino em tempo integral.
Redução da desigualdade
Na educação em tempo integral, os estudantes têm aulas não apenas em um turno – quando passam cerca de 5 horas na escola – mas participam também de atividades no contraturno. Nesse caso, a jornada integral é, em geral, de 7 horas diárias.
“Uma educação em tempo integral obedece o currículo regular e traz ainda outros elementos, como assessoria aos alunos, que passam a contar com um professor como tutor. Eles pensam sobre o querem ser e como chegarão lá, entre outros”, disse o diretor de projeto do Instituto Sonho Grande, Rangel Barbosa. “Esses elementos, juntos, fazem com que a escola seja mais completa”, acrescentou.
O estudo mostra que o ensino em tempo integral ajuda a diminuir as diferenças sociais. Enquanto estudantes negros de escolas parciais têm salários 10% menores do que os de estudantes brancos das mesmas escolas, a diferença é extinta entre os egressos do ensino integral.
Há impacto também em questões de gênero. As mulheres egressas de escolas em tempo integral têm mais chance de integrar o mercado de trabalho do que as demais. Entre as alunas egressas de escolas parciais, que participaram da pesquisa, 59% estavam trabalhando. Já entre as que cursaram escolas em tempo integral, esse percentual aumenta para 66%.
Para ter efeitos positivos na formação de estudantes, o aumento da jornada escolar tem que proporcionar o desenvolvimento das habilidades dos alunos, de acordo com o professor da Escola de Economia de São Paulo e coordenador do Learn/FGV, Vladimir Ponczek. “A literatura mostra que aumentar a jornada por aumentar não tem grandes efeitos. Aumentar a jornada com atividades centradas não apenas na parte cognitiva das aulas de reforço, mas em habilidades socioemocionais é mais importante.”
Vínculos mais fortes
Para Liniker Scolfild, ex-aluno da Escola de Referência em Ensino Médio Senador Paulo Pessoa Guerra, em Recife (PE), o ensino médio em tempo integral ajudou a criar vínculos, tanto com professores quanto entre alunos, uma vez que ele passava a maior parte do tempo no local. “Eu ia todo final de semana para o colégio. Tinha aulas de teatro, dança, arte e outras oficinas.”
Scolfild é médico e professor universitário e disse que deve a trajetória que seguiu à sua formação na escola. “Tem uma frase que um professor de física dizia: persistir, insistir e nunca desistir, quem sabe faz agora e não espera acontecer, que eu sempre lembro em tudo que eu faço”, disse.
Hoje em dia, ele ainda volta à escola para ministrar oficinas e aulas ligadas à saúde aos estudantes. Segundo ele, a filha de 8 anos, Maria Clara, também vai estudar em uma escola de tempo de integral.
Ensino integral
Aumentar o percentual de estudantes e de escolas com oferta de educação em tempo integral no Brasil é uma das metas do Plano Nacional de Educação, Lei 13.005/2014, que estabelece metas e estratégias para a educação até 2024. Pela lei, a educação em tempo integral deve chegar a metade das escolas públicas e atender a um quarto dos estudantes.
De acordo com o último Censo Escolar, de 2018, o percentual de matrículas em tempo integral caiu no ensino fundamental, passando de 16,3% em 2017 para 10,9% em 2018. No ensino médio, a situação foi oposta. O percentual de matrículas em tempo integral passou de 8,4% em 2017 para 10,3% em 2018, nas escolas públicas.