Chicossauro Rex: Histórias do meu Pai II – A fuzarca

Lá pelos idos de 1940, muitas cidades baianas eram comandadas por coronéis. Estes podiam ser donos de fazenda de cacau, engenho, criadores de gado… A morte de um desses verdadeiros “donos” de cidades pequenas mobilizava toda a população
A meninada de Coração de Maria, na Fazenda Torneiro, acompanhava os pais no roçado. Estudar, para muitos roceiros, era uma atividade vista com desconfiança.
– Um garoto desses já em idade de ajudar o pai no roçado com essa coisa de estudar. Isso é coisa de preguiçoso!
A frase foi ouvida por Zeca e seus primos várias vezes. Adolescentes, seguiam uma rotina de trabalho de mais de 10 horas por dia cuidando de roçados e levando mercadorias como fumo, cana, banana e mandioca para os armazéns que as revendia.
Morreu o coronel Peu de Lima. Mangangão da cidade e de outras mais próximas; o velório do respeitado senhor, a quem muitos meninos tomavam a benção como afilhados, movimentou os diversos cantos de Coração de Maria. O enterro mobilizou toda a cidade. Para levar a população ao velório, caminhões e carros particulares foram deslocados.
Zeca nunca tinha subido em um veículo motorizado. Nem ele, nem seus primos, nem os amigos, vizinhos. Aquelas máquinas eram novidade para quem estava acostumado a se deslocar por léguas no lombo de um jegue ou de carroça. Foi a primeira vez em cima daquele bicho que não precisava ser puxado por tração animal. Foram convidados à boleia do caminhão e seguiram em direção a cidade. Mal conheciam o coronel, mas a viagem foi algo de tão divertido e diferente na vida dos meninos trabalhadores que acabou virando festa. E por onde passavam, cantava, mexiam com amigos ou desconhecidos.
– O Dêda, seu fracote!
– Zuza, moleque de recado!
– Manezinho… cadê o jumento?
– Toizinho, cadê Memê!
– Tonhe, abestado!
– Cezinha, coroinha!!
Gargalhavam e se divertiam. Uma festa, enquanto o caminhão ia passando pelas ruas de barro batido. O enterro do coronel acabou sendo o dia mais divertido da adolescência dos meninos da Fazenda Torneiro.
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