Minha geração no Jornalismo teve a oportunidade de conviver, conhecer e até entrevistar Irmã Dulce. Eu, repórter iniciante, já era pautado para ir às Obras Sociais, no bairro de Roma, para acompanhar eventos e às vezes, entrevistá-la, pessoalmente. Antes de falar da minha experiência em bate-papo com uma santa, vou lembrar de quando meu pai a conheceu:
Sempre disposta a garantir o sustento das suas crianças, seus pobres, idosos e pacientes, Irmã Dulce, pessoalmente, ia à feira pedir mantimentos. Meu velho, feirante, lembrou certa vez de como a freira, acompanhada de crianças, velhos e religiosos, ia à Feira de São Joaquim pedir o apoio diretamente, sem medo, preconceito, ou vergonha… E todos doavam o mínimo que fosse, em feijão, farinha ou dinheiro.
Já ouvi de muitos reclamarem que a freira se aproximada de quem quer que fosse que pudesse ajudar. Fez isso com políticos de todas as estirpes, banqueiros, empresários. Independente da militância política, da fama, do poder econômico, o importante era o seu objetivo humanitário, a escolha de uma vida.
Devo ter entrevistado a Irmã em três oportunidades (não consigo fixar bem), mas uma delas posso considerar ter sido “meu dia com a santa”. Procurei-a nas Obras Sociais. Acho que tinha ligado antes para saber se ela atenderia, mas sabia que ela sempre se mostrava disposta a falar com a imprensa (ela, como ninguém, sabia a importância de divulgar sua obra, não como vaidade, mas pela necessidade de manter a chama sempre acesa).
– Irmã, podemos conversar um pouco?
– Meu filho, estou muito ocupada, mas se você me acompanhar, vamos conversando.
– Claro Irmã!
E a segui em atendimento a crianças desnutridas, jovens e adultos com necessidades especiais, doentes, pacientes em estado grave, idosos que vinham abraçá-la a todo momento, agradecer, pedir, orar… Juro que rodar horas o antigo Hospital Santo Antônio acompanhando a freirinha me cansou fisicamente. Ela sequer demonstrava o mínimo sinal de cansaço. Franzina, já arqueada (e seus últimos dias foram dormindo sentada), certamente, se alimentava do amor gerado por sua bondade.
A todos atendia sem pestanejar, sem se impressionar com ferimentos, aparência, gênero, raça, ou militância política.Sinto não ter tirado uma foto ao lado dela. Na época, não se pensava em selfie e jornalistas também não posavam ao lado das fontes.
Já me perguntaram se a achava Santa, ou qual o significado de ser Santo. Respondo, não sei. Sei que Ela era Santa e era Ela o único significado da palavra “santa” que conheço.
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Chico Araújo
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