A Bahia teve 512 pessoas mortas por policiais da ativa, no 1º semestre de 2020, segundo dados do Monitor da Violência, divulgados nesta quinta-feira (3). O número coloca a Bahia na terceira posição entre os estados com mais casos de pessoas mortas pela polícia. O Rio de Janeiro lidera a lista (775 casos), seguido de São Paulo (514).
O Monitor da Violência é um levantamento feito pelo G1 com base nos dados oficiais de 25 estados e do Distrito Federal. Apenas Goiás se recusou a passar os dados. Para conseguir as informações, foram solicitados os casos de “confrontos com civis ou lesões não naturais com intencionalidade” envolvendo policiais na ativa. Os pedidos foram feitos para as secretarias da Segurança Pública dos estados por meio da Lei de Acesso à Informação e das assessorias de imprensa.
- METODOLOGIA: Monitor da Violência
Apesar de em números brutos a Bahia ocupar o terceiro lugar na lista, o estado fica na quarta colocação com relação ao índice de mortes causadas pela polícia a cada 100 mil habitantes, com taxa de 3,4. à frente da Bahia estão Amapá (8,1), Sergipe (4,6) e Rio de Janeiro (4,5).
Com relação ao índice por 100 mil habitantes, Bahia ocupa 4º lugar da lista — Foto: Juliane Souza/Arte
No 1º semestre de 2019, a Bahia teve 361 pessoas mortas por policiais da ativa. Com isso o aumento desses casos foi de 41% em 2020.
Um desses casos foi o do fotógrafo Sandro Silva Santos, de 36 anos, ocorrido na cidade de Itabuna, sul da Bahia, em 1º de janeiro deste ano. Testemunhas disseram à polícia que Sandro Santos estava colocando uma porta na casa da sogra, quando foi surpreendido pelo PM Felipe Prado de Araújo, que chegou ao local atirando. A polícia diz que se trata de um crime por ciúmes, porque Sandro era o atual namorado da ex-companheira do policial. O policial Felipe Prado Araújo, de 40 anos, foi preso poucos dias depois do crime.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) informou que investe em treinamento para que as ações policiais tenham como principal objetivo prender criminosos. O órgão destacou que, “nos casos de resistências com confrontos, as equipes são capacitadas para reagir proporcionalmente, como determina a lei”. A nota ainda afirma que essas ocorrências são apuradas pelas Corregedorias e, existindo qualquer ilegalidade, os policiais envolvidos são responsabilizados.
Já com relação ao número de policiais da ativa mortos, a Bahia contabilizou quatro casos no primeiro semestre deste ano, e seis no do ano passado.
Dados nacionais
Ao menos 3.148 pessoas foram mortas por policiais no primeiro semestre deste ano em todo o país. O número é 7% mais alto que o registrado no mesmo período do ano passado, quando foram contabilizadas 2.934 mortes.
Os casos de policiais que morreram em serviço e fora de serviço também apresentaram alta nos primeiros seis meses deste ano. Foram 103 policiais mortos, contra 83 no ano passado, o que representa um aumento de 24%.
Chama a atenção que o aumento de mortes neste ano aconteceu mesmo durante a pandemia do novo coronavírus, que fez com que estados adotassem diversas medidas de isolamento social. Ou seja, houve alta na violência mesmo com menos pessoas nas ruas.
Os dados revelam que:
- O Brasil teve ao menos 3.148 pessoas mortas por policiais no primeiro semestre deste ano – um aumento de 7% em relação ao mesmo período de 2019, quando foram registradas 2.934 vítimas (sem contar Goiás em ambos os anos)
- A taxa de mortes pela polícia ficou em 1,5 a cada 100 mil habitantes
- O Rio de Janeiro é o estado com mais pessoas mortas no primeiro semestre: 775
- O Amapá é o estado com a maior taxa de letalidade policial: 8,1 por 100 mil habitantes
- O país teve 103 policiais assassinados nos primeiros seis meses do ano (24% a mais que em 2019, quando 83 oficiais foram mortos)
- São Paulo é o estado com mais policiais mortos: 28
- Rio Janeiro tem a maior taxa de policiais mortos (0,5 por 1 mil policiais)
Alta inesperada e lógica de guerra
Segundo Dennis Pacheco e Samira Bueno, do FBSP, os números do levantamento preocupam. “Ao contrário das expectativas criadas diante da redução da violência letal verificada nos anos anteriores, o Brasil não foi capaz de transformá-la em tendência de um ciclo virtuoso”, dizem.
“Mesmo diante da pandemia de Covid-19, que resultou em medidas de isolamento social em quase todo o país e na queda dos crimes contra o patrimônio, a violência letal voltou a crescer, na evidência da incapacidade das nossas autoridades implementarem uma política nacional de segurança pública que seja capaz de preservar a vida de todas e todos os cidadãos.”
Renato Alves e Fernando Salla, do NEV-USP, destacam que é importante notar que “a letalidade policial não apenas produz grande número de mortes entre cidadãos comuns, mas vitima também a própria polícia”. E que um elemento essencial por trás deste número é a ótica de guerra.
“A lógica acionada é da guerra, onde não cabe a moldura dos controles democráticos e dos limites impostos pelas leis. A narrativa apresentada pelos policiais é de que o inimigo (criminoso/suspeito) está sempre bem armado e enfrenta a polícia com poder de fogo e risco para os policiais”, afirmam.
“Neste contexto, impõem-se o ‘matar ou morrer’. Nessa lógica, tanto as circunstâncias como o próprio viver estão permanentemente em risco. Ainda que uns percam mais que os outros, a maioria perde, pois ninguém está seguro, sejam eles cidadãos comuns ou os próprios policiais”.
G1