Pesquisa realizada pela Universidade de Waterloo, no Canadá, e publicada na terça-feira (1º) no jornal científico Annals of Internal Medicine trouxe um dado preocupante: que um em cada 20 norte-americanos com mais de 55 anos fuma maconha ou haxixe (extração de cannabis) regularmente. Mostra que o uso da droga nessa faixa etária aumentou nos Estados Unidos, passando de 4,2% em 2016 para 5,9% em 2018. O uso entre os homens aumentou de 5,5% em 2016 para 8,3% em 2018, enquanto o uso entre as mulheres passou de 3,2% para 3,9%.
Cenário perigoso diante de tantos estudos que apontam para uma outra direção, mostrando os perigos iminentes até de morte e danos irreparáveis para a saúde de quem consome maconha, sejam pessoas próximas da terceira idade ou não.
As substâncias químicas presentes na cannabis foram associadas a um risco aumentado de ataque cardíaco, insuficiência cardíaca e fibrilação arterial em estudos observacionais, segundo declaração científica da American Heart Association (AHA) divulgada recentemente, em 5 de agosto.
“Os profissionais de saúde precisam de uma maior compreensão das implicações da cannabis para a saúde, que tem o potencial de interagir com medicamentos e desencadear eventos e doenças cardiovasculares, como ataques cardíacos e derrames”, afirmou Robert L.Page, professor de farmácia clínica do Departamento de Cardiologia da Universidade do Colorado, na declaração científica.
Segundo a declaração, o uso da maconha com estatinas, para baixar o colesterol, e anticoagulantes, para prevenir infarto e AVC, aumentaria o nível de circulação dessas substâncias no sangue, elevando a chance de reações adversas.
A declaração aponta que, após uma hora após o consumo da cannabis, o THC THC (ácido tetrahidrocanabinol), componente químico presente na planta, pode induzir anormalidades do ritmo cardíaco, como taquicardia, contrações ventriculares prematuras, fibrilação atrial e arritmias ventriculares.
O THC tem sido associado a cardiomiopatia (disfunção do músculo cardíaco), angina (dor no peito), ataques cardíacos, distúrbios do ritmo cardíaco, morte cardíaca súbita e outras condições cardiovasculares graves. Nos Estados Unidos, de onde se constata o aumento de consumo e onde a maconha foi legalizada, houve um aumento nas hospitalizações e emergências por ataques cardíacos..
As motivações para o consumo da droga na maturidade, a margem de supostas possibilidades terapêuticas, levantam discussões. O que levaria pessoas próximas da terceira idade a se tornarem usuários de drogas? Adriano Moraes, representante do projeto Vício Tem Cura da Igreja Universal, responsável pela recuperação de dependentes químicos, traz uma explicação: o descaso como os mais velhos são tratados no convívio social:
– A sociedade na qual vivemos não dá valor a pessoas de idade e isso tem sido feito até pela própria família. Então, elas buscam refúgio nessa substância para amenizar a dor e a solidão
O psicólogo Yuri Busin, doutror em neurociência cognitiva e diretor do Centro de Atenção à Saúde Mental – Equilíbrio, afirma que “qualquer dependência vai gerar muitos prejuízos de ações e convivência”, pois a pessoa deixa de fazer atividades do cotidiano e só pensa no alvo de seu vício.
De acordo com ele, a dependência química – em que o corpo solicita determinada substância – é rara no caso da maconha, porém existe a dependência emocional.
– Então, eu só e sinto bem se eu fizer isso e crio diversas condições para o meu bem-estar. Mas esse não é um parâmetro realista, porque existem outras coisas que fazem bem
Ele acrescenta que os prejuízos não se limitam ao usuário e se estendem para aqueles que o cercam:
– Pode vir a afetar diversas entidades, como família, amigos, que não entendem o uso e vão rechaçar. A partir disso acontecem brigas.
Esquizofrenia
O consumo da maconha aumenta o risco de esquizofrenia em quem tem propensão genética à doença, conforme demonstrou um estudo da Escola de Psicologia Experimental da Universidade Bristol, no Reino Unido publicada no periódico científico Psychological Medicine. A pesquisa também revela que esquizofrênicos tendem a usar mais a droga.
O estudo reitera uma pesquisa pioneira sobre o tema, divulgado em 1987 pela revista científica Lancet, que aponta que fumar maconha eleva o risco em 3,7 vezes o diagnóstico de esquizofrenia.
Outro estudo, realizado por pesquisadores canadenses publicado em abril no períodico médico Jama (Journal of the American Medical Association) revela que a síndrome de abstinência afeta metade dos usuários regulares ou dependentes da maconha. A análise englobou 47 estudos e 23.518 participantes.
Moraes, do projeto Vício tem Cura da Igreja Universal, alerta para esse risco de se tornar viciado. “Todo vício é uma ação repetitiva que degenera, causa danos e influencia diretamente na vida da pessoa, fazendo com que ela fique escrava da substância”, destaca.
-No caso específico da maconha, temos visto pessoas que tiveram o emocional diretamente afetado, a ponto de buscarem psicólogos e até mesmo recorrerem à internação.
A razão para o aumento do consumo entre os mais velhos nos Estados Unidos pode ter múltiplas origens, segundo o pesquisador Bill Jesdale, um dos autores do estudo. Ele aponta que os 11 Estados onde o uso recreativo de maconha é legalizado apresentaram os maiores aumentos, porém o uso de cannabis na faixa etária pesquisada aumentou em quase todo os Estados Unidos.
Para Pat Aussem, vice-presidente associada de desenvolvimento de conteúdo clínico para o consumidor da Partnership to End Addiction de Nova York, que revisou o estudo, os adultos mais velhos estão usando maconha para aliviar dores, neuropatia, ansiedade, depressão, insônia e uma série de outras condições médicas.
Aussem, no entanto, se preocupa com a possibilidade deles não estarem prontos para aumento da potência da maconha que possui um processo de cultivo mais cuidadoso hoje em dia. Outra preocupação é a possibilidade de interação com outros medicamentos.
-Existem centenas de medicamentos que interagem com a maconha. Por exemplo, há uma preocupação de que o uso da maconha pode aumentar o risco de sangramento em adultos mais velhos que tomam anticoagulantes.
Ela acrescenta que apenas alguns Estados americanos exigem que o farmacêutico participe da distribuição medicinal da maconha, então algumas pessoas estão por conta própria para descobrir o tipo de produto, a dosagem, as interações medicamentosas e os efeitos adversos.
O pesquisador e psiquiatra Renato Filev, do Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), observa que o aumento do uso de maconha por essa população nos Estados Unidos acontece no país que regulou a utilização da cannabis e seus derivados para fins terapêuticos.
De acordo com Filev, 9 em cada 100 pessoas que usam maconha têm depêndencia. A taxa é menor do que entre aqueles que consomem tabaco (33%) e álcool (15% a 17%)
– A dependência é um fenômeno multifatorial. Envolve o indíviduo, o contexto em que ele está e qual a substância usada
-Ela é caracterizada pelos profissionais a partir de uma escala de fatores. Mas o principal deles é a percepção da pessoa de que isso está fazendo mal para ela e da incapacidade de modificar seu comportamento de maneira autônoma
Filev ressalta que os malefícios do uso da maconha são mais evidentes entre os adolescentes e jovens. Dentre eles, estão aumento da ansiedade e transtorno psicótico.
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