Mais da metade da população brasileira não tem acesso pleno e permanente a alimentos durante a pandemia do novo coronavírus.
É o que aponta o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da covid-19 no Brasil, desenvolvido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN).
O levantamento, feito em 2.180 domicílios nas cinco regiões do país, em áreas urbanas e rurais, entre 5 e 24 de dezembro de 2020, aponta que em 55,2% das casas os habitantes conviviam com a “insegurança alimentar”, ou seja, sem acesso permanente aos alimentos, um aumento de 54% desde 2018 (36,7%).
Em números absolutos: no período abrangido pela pesquisa, 116,8 milhões de brasileiros não tinham acesso pleno e permanente a alimentos.
Desses, 43,4 milhões (20,5% da população) não contavam com alimentos em quantidade suficiente e 19,1 milhões (9% da população) estavam passando fome.
É um cenário que não deixa dúvidas de que a combinação das crises econômica, política e sanitária provocou uma imensa redução da segurança alimentar em todo o Brasil.
Segundo a pesquisa a insegurança alimentar cresceu em todo país, mas as desigualdades regionais seguem acentuadas. As regiões Nordeste e Norte são as mais afetadas pela fome.
Em 2020, o índice de insegurança alimentar esteve acima dos 60% no Norte e dos 70% no Nordeste – enquanto o percentual nacional é de 55,2%.
Já a insegurança alimentar grave (a fome), que afetou 9% da população brasileira como um todo, esteve presente em 18,1% dos lares do Norte e em 13,8% do Nordeste.
O Nordeste apresentou o maior número absoluto de pessoas em situação de insegurança alimentar grave, quase 7,7 milhões. Já no Norte, que abriga apenas 7,5% dos habitantes do Brasil, viviam 14,9% do total das pessoas com fome no país no período.
Além disso, a conhecida condição de pobreza das populações rurais, sejam elas de agricultores(as) familiares, quilombolas, indígenas ou ribeirinhos(as), tem reflexo importante nas condições de segurança alimentar.
Nessas áreas, em todo o país, a fome se mostrou uma realidade em 12% dos domicílios.
A mostra ainda apontou que em 11,1% dos domicílios chefiados por mulheres os habitantes estavam passando fome, contra 7,7% quando a pessoa de referência era homem.
Das residências habitadas por pessoas pretas e pardas, a fome esteve em 10,7%. Entre pessoas de cor/raça branca, esse percentual foi de 7,5%.
A fome se fez presente em 14,7% dos lares em que a pessoa de referência não tinha escolaridade ou possuía Ensino Fundamental incompleto.
Com ensino fundamental completo ou ensino médio incompleto, caiu para 10,7%. E, finalmente, em lares chefiados por pessoas com ensino médio completo em diante, despencou para 4,7%.
A fome vem acompanhada de muitas outras carências, destacadamente a falta de água.
A insegurança hídrica, medida pelo fornecimento irregular ou mesmo falta de água potável, atingiu 40,2% e 38,4% dos domicílios do Nordeste e Norte, respectivamente, em 2020. Esses percentuais são quase três vezes superiores aos das demais regiões.
O abastecimento irregular de água é uma das condições que aumentam a transmissão pessoa a pessoa da covid-19, ocorrendo com maior frequência em domicílios e regiões mais pobres do país.
Segundo a pesquisa, a proporção de domicílios rurais com habitantes em situação de fome dobra quando não há disponibilidade adequada de água para a produção de alimentos (de 21,8% para 44,2%).
Cerca de metade dos entrevistados relatou redução da renda familiar durante a pandemia, provocando inclusive cortes nas despesas essenciais.
Esses lares constituem o grupo com maior proporção de insegurança alimentar leve – por volta de 40%.
Isso aponta para o impacto da pandemia entre famílias que tinham renda estável, que provavelmente foram empurradas da segurança alimentar para a insegurança alimentar leve.
A crise econômica agravada pela pandemia está fazendo com que a insegurança alimentar se alastre inclusive entre os que não se encontram em condição de pobreza.
R7