Sabemos da luta histórica das mulheres negras por sobrevivência, em uma sociedade estruturalmente racista. De acordo com dados divulgados, em 2022, pela Gestão Kairós – consultoria de sustentabilidade e diversidade –, entre 900 líderes entrevistados, 25% são mulheres e, entre elas, apenas 3% são negras. A partir disso, podemos refletir sobre a realidade e desafios que enfrentamos em relação ao capital, recursos e ferramentas para desenvolvimento profissional.
Trazendo um pouco da minha vivência enquanto mulher preta, desde a minha graduação em Relações Internacionais, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) – e também na pós-formação –, senti a grande diferença de experiências em relação aos meus colegas de curso. A maioria já possuía uma rede de relacionamento e familiares que tiveram acesso às universidades e organizações, o que consequentemente ajudava a abrir portas. Neste mesmo período, observei fatores de exclusão que não são explícitos, mas que acontecem todos os dias, justamente por conta das vivências e realidades completamente opostas.
Hoje, percebo o quanto essa disparidade se refletiu, principalmente, no momento da busca de oportunidades de estágio e trainee em escritórios. Eu não tinha uma rede de contatos estabelecida ou sequer um direcionamento, como no caso dos meus colegas. Então, após a formação, meu primeiro emprego foi como recepcionista bilíngue, onde percebi rapidamente que o cargo não oferecia espaço para progressão.
Demitida no pós-licença maternidade, logo no início da pandemia, busquei encarar o desafio como uma nova oportunidade e não me anulei como profissional. Fui atrás de novos caminhos e resolvi estudar marketing digital, em um curso oferecido pela B2Mamy, iniciativa que apoiou mães periféricas. Neste lugar, encontrei uma rede de apoio com outras pessoas de vivências semelhantes, além de fazer conexões incríveis que me abriram portas para hoje poder gerenciar projetos. Neste período, busquei referências inspiradoras – pretas intelectuais e líderes – como Anielle e Marielle Franco e Lélia Gonzalez, o que foi de um impacto extremamente positivo em minhas aspirações e confiança. Essas figuras abriram meus olhos e me mostraram que é possível galgar novas possibilidades e caminhos.
Não há dúvidas que existem inúmeras barreiras políticas, sociais e culturais que precisam ser superadas para o avanço das mulheres negras nas organizações. Por isso, é importante olhar para esses corpos, reconhecer potencial intelectual e identificar a capacidade de contribuição, além de oferecer oportunidades de desenvolvimento, ao invés de optar por excluí-las por não possuir qualificações técnicas específicas.
Pensando em promover igualdade, diversidade e inclusão, bem como combater o racismo e o sexismo nas organizações, é necessário adotar políticas específicas, como a criação de vagas exclusivas para pessoas pretas e outras minorias. Além disso, é fundamental criar programas de permanência, desenvolvimento e apoio psicológico, compreendendo as barreiras que impedem o avanço e os suportes adequados. Realizar um letramento voltado às diversas realidades de vida também é crucial para uma inclusão real. Por fim, a redistribuição do poder e a promoção da diversidade não apenas trazem benefícios para uma sociedade sustentável, mas também se mostram rentáveis para as organizações.
Ter mulheres negras ocupando cargos de liderança nas empresas traz diversos benefícios e vantagens, já que a vivência faz com que as mesmas possuam diversas ferramentas de disrupção, com capacidade analítica e de acolhimento aos desafios pessoais de colegas e times. A liderança não se trata apenas de gerenciar projetos, mas principalmente de lidar com o ser-humano e, neste sentido, a diversidade de perspectivas é essencial para a tomada de decisões e o sucesso organizacional. Ao acolher olhares diversos, promove-se uma experiência mais completa e genuína, gerando pertencimento e resultados positivos para a sociedade e organizações como um todo.