É muito popular a cena em que Agnaldo Timóteo é “tirado do armário” sem querer por Felipeh Campos em uma participação no programa Superpop, na Rede TV, em 2011.
Na ocasião, o colunista diz que, assim como ele, o cantor seria homossexual assumido. No que prontamente o músico rebate, até com certa impaciência: “Não, não. Não sou não. Nem assumido, nem desassumido. Apenas Agnaldo Timóteo”.
Essa, talvez, é a melhor e única definição que contempla com justiça um ser humano tão multifacetado quanto ele. No filme Eu, Pecador, que será exibido na Mostra de Cinema de São Paulo nos dias 27, 28 e 29 de outubro e 1º de novembro, fica claro que Timóteo vai além de rótulos e definições. E sempre travou uma luta interna contra os próprios desejos.
Segundo o diretor Nelson Hoineff, passar um ano ao lado do músico e político o ajudou a entender as contradições do comportamento de Timóteo.
— Ele é o tipo de pessoa que pode elogiar o Lula ou o Maluf numa semana e, na outra, fazer críticas pesadas aos dois. O tipo de pessoa que pode ter romance com outro homem e ainda assim ser homofóbico. Não é personagem. Esse é ele mesmo. Contraditório e interessante.
Feito em 2016, durante a campanha eleitoral para vereador do Rio de Janeiro (que o músico acabou perdendo), o filme tem o objetivo de revelar tudo que o Timóteo omitiu até então.
Sempre discreto no que diz respeito à vida pessoal, o cantor nunca assumiu romances em público. Isso, aliado ao conteúdo revelador de letras como a de Galeria do Amor, sempre resultou em desconfiança sobre a possibilidade de ele ter se relacionado com homens durante a vida, o que no filme finalmente é confirmado.
— Inicialmente, ele não queria falar sobre. Mas o convenci. Agnaldo é mais do que isso. Expliquei que falar sobre o assunto jamais seria algo prejudicial. E ele se abriu, contando até para qual pessoa determinadas músicas foram feitas.
Isso, no entanto, já causou um problema ao músico e ao diretor. Ao ser exibido na Mostra do Rio, o filme revelou um relacionamento entre Agnaldo e um ex-chefe de gabinete dele, que hoje está casado e tem filhos. O homem exigiu que a cena fosse removida. O que Hoineff concordou em fazer.
— Eram cinco segundos, se muito. Foi um romance que ele teve quando esse homem tinha 19 anos. Tiramos, porque não prejudica o resultado final.
Bomba relógio ambulante
Ao conviver com o cantor por um ano, Hoineff descobriu que Timóteo é o que ele chama de “bomba relógio ambulante”. Principalmente ao lidar com o público, seja nos palcos ou nos palanques.
— Tive a ideia de fazer o filme no início de 2016 e queria aproveitar a campanha para vereador para retratar o Timóteo na rua, no meio do povo. É ali que observei como ele é uma figura que pode mudar de humor de um momento para o outro. O que é ótimo, já que vivemos tempos de entrevistas ensaiadas na mídia. Com Timóteo, isso não funciona.
O que motivou Hoineff a retratar o cantor em seu sétimo longa-metragem foi uma conversa que os dois tiveram durante a preparação do documentário sobre Cauby Peixoto, em 2012. Evasivo e quase sempre calado, o diretor teve dificuldade em tirar revelações do músico, morto em 2016. Foi quando ele procurou Agnaldo Timóteo, um dos poucos amigos de Cauby, para tentar extrair mais informações.
O título escolhido foi Eu, Pecador, inspirado em uma música de 1977. A letra composta pelo artista sugere o sentimento de culpa por conta da própria orientação sexual.
Além dessa música, ganham destaque Passarela da Minha Vida (faixa inédita composta com letra explícita para um caso de amor que durou 20 anos),Ciúme Louco e Galeria do Amor. A última foi lançada em 1975, no auge da Ditadura Militar, e fala sobre a Galeria Alaska, então considerado o maior point de encontro LGBT do Brasil.
— Sempre soube que expor a vida dele era algo delicado. Mas ele não só fez isso, como contou a real inspiração de cada música, numa sinceridade e sensibilidade que só o Timóteo consegue transparecer.
Procurado pela nossa reportagem para falar sobre o caso, a assessoria do cantor não se posicionou.
R7