A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou nesta terça-feira (18) um marco regulatório para a oferta de terapia gênica, que inclui técnicas de modificação do DNA com fins medicinais, e celular no Brasil.
A norma traz critérios para que empresas possam obter o registro dos chamados “produtos de terapias avançadas”.
Na prática, a medida abre novo espaço para pesquisas e a oferta desse tipo de tratamento, considerado uma aposta em casos de pacientes com doenças raras ou sem alternativas terapêuticas disponíveis.
Até então, as regras existentes visavam apenas o aval ao desenvolvimento de estudos clínicos. Agora, a agência cria uma nova categoria para registro desses tratamentos no país.
“É uma categoria que inclui tanto produtos de terapia gênica, que vem para revolucionar o tratamento de doenças genéticas, quanto os de terapias celulares. Podemos ter, por exemplo, uma célula que é modificada geneticamente para atacar diretamente um tumor, ou uma célula organizada para reparar um tecido lesionado”, afirma Renata Barca, especialista da agência que trabalhou na regulamentação.
Atualmente, a Anvisa monitora ao menos três estudos clínicos com terapias gênicas e celulares avançadas.
Dois produtos também já tiveram pedidos de registro protocolados, mas faltava a aprovação das regras para que a análise pudesse ocorrer. Um deles é indicado para tratamento de distrofia de retina hereditária, e outro é para distrofia muscular espinhal.
Para receber o aval, empresas devem apresentar dossiês com dados de segurança, qualidade e eficácia, assim como ocorre para medicamentos em geral.
Em alguns casos, haverá a possibilidade de autorização condicional para terapias com estudos de eficácia (chamados de fase 3) ainda em desenvolvimento. A situação vale para aquelas voltadas a doenças graves debilitantes e diante da ausência de outros tratamentos.
Empresas também terão que apresentar um plano de mitigação de riscos e de monitoramento de pacientes. O prazo dependerá de análises de risco –em geral, deve levar de cinco a 15 anos.
As regras seguem modelo aprovado na Europa e nos Estados Unidos.
Uma das grandes promessas da terapia gênica é ir à raiz dos problemas que desencadeiam o câncer.
Todo tumor surge de mutações, ou seja, alterações nas “letras” químicas que compõem o genoma, ou conjunto de DNA das células. Tais mutações promovem o crescimento desordenado das células tumorais à custa do restante do organismo e, frequentemente, não são detectadas pelos sistemas de vigilância do corpo. Se fosse possível alterar geneticamente esses sistemas de defesa para que soubessem de antemão como atacar os tumores, ou se houvesse meios de corrigir o DNA das próprias células do tumor, a doença seria desarmada “por dentro”.
A tática tem potencial para ser menos invasiva do que procedimentos cirúrgicos ou radioterapia e mais específica do que a quimioterapia, que acaba afetando células sadias. Além disso, pode alcançar tumores que, por estarem localizados em áreas sensíveis, como o cérebro ou o entorno de artérias, hoje são considerados inoperáveis.
Um marco importante para a área veio em agosto de 2017, quando a FDA (agência americana que regula fármacos e alimentos) aprovou pela primeira vez o uso de uma forma de geneterapia nos EUA, no intuito de enfrentar um tipo de leucemia (câncer sanguíneo). Pouco depois, em outubro, a mesma agência deu aval a uma técnica similar, voltada para o tratamento de certos linfomas.
Para o relator da medida, o diretor Fernando Mendes, a norma permitirá o desenvolvimento, no Brasil, de terapias que podem ser aplicadas em casos em que não há outras alternativas. “Isso poderá trazer acesso para a população que não tem mais nada de arcabouço terapêutico”, afirma.
A aprovação foi comemorada por representantes de empresas farmacêuticas e pacientes com doenças raras que acompanharam a reunião. O grupo, porém, manifestou preocupação em relação ao acesso devido ao custo dos tratamentos.
Segundo João Batista Silva Jr, da gerência de sangue, tecidos, células e órgãos da Anvisa, a aprovação das novas regras abre espaço para que o SUS e planos de saúde possam avaliar a oferta de possíveis terapias que forem registradas. O preço, porém, é tido como um dos principais impeditivos –em geral, são produtos de altíssimo custo.
Bahia Notícias