Os 535 parlamentares aposentados pelo Congresso Nacional receberam, em média, R$ 14.153,36 no mês de agosto. O valor é quase dez vezes maior do que a média paga aos trabalhadores comuns, aposentados pelo INSS, que é de R$ 1.473,12.
O Senado Federal gastou no mês passado R$ 987,9 mil para pagar aposentadorias de 59 políticos. A média que cada um ganhou foi ainda maior: R$ 16.744,38.
A Câmara dos Deputados, que possui 476 parlamentares aposentados, desembolsou R$ 6,5 milhões para os benefícios em agosto.
Um levantamento exclusivo do R7 analisou individualmente as folhas de pagamento dos políticos aposentados.
Os dados mostram que 88% dos ex-parlamentares estão no modelo antigo de aposentadoria — o IPC (Instituto de Previdência dos Congressistas), extinto em 1997 —, mais flexível do que o atual PSSC (Plano de Seguridade Social dos Congressistas).
A troca para o novo regime é feita apenas quando termina um mandato. Ou seja, quem permanece se reelegendo desde 1997 ainda poderá se aposentar pelo IPC caso não se eleja neste ano ou opte por sair do Congresso, desde que naquela data tivesse cumprido os requisitos exigidos: mínimo de oito anos de mandato e 50 anos de idade..
O valor a receber era calculado com base em uma tabela progressiva definida por lei e proporcional ao tempo em que permaneceu no cargo. O mínimo a ser recebido era de 26% do salário mensal de parlamentares. Com base nisso, 167 ex-parlamentares que ficaram por oito anos no cargo e se aposentaram pelo IPC recebem hoje R$ 8.778,38 mensais.
A reportagem constatou também que a maioria (262) dos ex-congressistas recebe entre R$ 12 mil e R$ 24,2 mil. Quarenta e dois políticos têm proventos entre R$ 25 mil e R$ 33,7 mil (veja gráfico abaixo).
Senador de 1971 a 1985 e posteriormente de 1991 a 2015, José Sarney (MDB), por exemplo, aposentou-se com 40 anos de mandato. Ele recebe atualmente R$ 29.036,18 mensais.
O ex-deputado Rubem Medina ficou na Câmara entre 1975 e 2003 e aparece com aposentadoria de R$ 33.763.
Um trabalhador que contribuísse durante 35 anos pelo teto do INSS se aposentaria hoje ganhando no máximo R$ 5.645,80 — valor passível de redução devido à aplicação do fator previdenciário, que na prática diminui o valor do benefício para quem se aposenta mais jovem.
Infogram/Diego Junqueira/R7
Se o parlamentar ficar por 35 anos no Congresso e completar 60 anos, poderá requerer a aposentadoria integral: R$ 33.763.
O PSSC (Plano de Seguridade Social dos Congressistas), criado em 1997, é facultativo. O parlamentar que opta por contribuir paga atualmente R$ 3.713,93 (11% do salário). Caso não queira, a contribuição será obrigatoriamente para o INSS.
O novo modelo exige 35 anos de contribuição previdenciária em qualquer regime e 60 anos de idade (independentemente do sexo). O tempo de contribuição pode ser complementado com o que já foi pago para o INSS, por exemplo, desde que o parlamentar pague retroativamente a diferença em relação ao PSSC.
O parlamentar não pode acumular a aposentadorias, independentemente de ter contribuído para o serviço público ou para o INSS. Ele deve optar pela aposentadoria do PSSC, na proporção dos anos de mandato, ou pelo INSS.
Por exemplo, um deputado que tenha ficado no cargo por dois anos, somou mais sete anos de tempo de mandatos eletivos (estadual e municipal) e averbou tempo de contribuição ao INSS para completar 35 anos. Se tiver 60 anos de idade, poderá se aposentar pelo plano do congresso com um salário que atualmente será de R$ 8.681,92.
Apenas 64 dos 535 aposentados se incluem nesse novo modelo de aposentadoria.
Para o advogado e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ivandick Cruzelles Rodrigues, apesar das mudanças feitas com a criação do PSSC, o novo regime ainda é muito mais vantajoso do que o INSS.
“Eu não vejo motivos para existir esse regime diferenciado É uma condição, do meu ponto de vista, imoral. Mas é um regime facultativo, o deputado adere se quiser. Se for um deputado mais comprometido com a população, ele vai continuar no regime geral [INSS]. Um deputado comprometido com seus próprios interesses, provavelmente, vai aderir ao regime dos congressistas”, diz.
Roberto Piscitelli, economista e professor da UnB (Universidade de Brasília), avalia que a necessidade de um plano de previdência exclusivo para congressistas seria menor se uma reforma política limitasse as reeleições para os cargos de senadores e deputados.
“Não se pode transformar o mandato parlamentar em uma carreira, em um projeto de vida. […] O que ocorreu é que eles ficavam tanto tempo no Congresso que criaram um plano próprio”, observa.
Ele pondera, no entanto, que qualquer mudança que venha a ocorrer deve manter o direito adquirido. “Assim como a reforma da Previdência não poderá mexer em situações já concedidas”, afirma.
A lei que criou o PSSC determina que “não é devido o pagamento dos proventos da aposentadoria a que se refere esta Lei enquanto o beneficiário estiver investido em mandato eletivo federal, estadual, distrital ou municipal, salvo quando optar por este benefício, renunciando à remuneração do cargo”.
No entanto, quem se aposentou pelo extinto IPC não se inclui nesta regra. É o caso do governador de Santa Catarina, Eduardo Pinho Moreira (MDB), que recebe vencimentos do Estado e da Câmara. Em resposta ao R7, assessoria do político diz que os proventos dele cumprem a legislação em vigor.
Esse acúmulo é permitido porque o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) estabeleceu que os benefícios do IPC devem ser excluídos da incidência do teto constitucional.
As duas casas do Legislativo têm previsão de gastar 162,3 milhões neste ano apenas com a chamada previdência especial de ex-parlamentares e pensionistas.
Além de usufruírem do benefício, os ex-parlamentares ainda transferem o pagamento a seus dependentes quando morrem. Segundo a lei, o valor mínimo dessa pensão é de 13% do salário dos parlamentares, o que corresponde hoje a R$ 4.389,19.
Somente na Câmara dos Deputados são 715 pensionistas de ex-deputados.
O Senado tem em sua folha de pagamento 84 pensionistas de ex-senadores. O gasto foi de R$ 626.340,49, o que representa um valor médio de R$ 7.456,42 por benefício.
A pensão para cônjuges de congressistas é vitalícia. Já no caso do INSS, com uma mudança na lei em 2015, apenas recebe quem tiver mais de 44 anos no momento da morte do marido ou da mulher. Nas demais faixas etárias, o pagamento é limitado a um período de três a vinte anos, de acordo com a faixa etária.
Dessa forma, se a mulher tem 20 anos quando o parlamentar morre, ela tem direito a receber a pensão pelo resto da vida.
“Uma reforma da Previdência que queira atacar esse assunto [privilégios] vai ter que acabar com esse plano [PSSC]. Esse sistema de seguridade social [do Congresso] não beneficia a sociedade. Que tipo de bem-estar estamos gerando pagando superaposentadorias? Quando a sociedade percebe que existe uma classe privilegiada, a ordem social — a cola que nos mantém unidos — é ameaçada”, observa o professor Ivandick Rodrigues.
R7