Um estudo recente realizado nos Estados Unidos identificou que mulheres de 25 a 44 anos sofrem mais AVCs (acidentes vasculares cerebrais) do que homens na mesma faixa etária.
Os resultados da análise de cerca de 20 mil casos de AVCs isquêmicos nos EUA entre 2001 e 2014 foram publicados na revista científica Stroke, da Associação Americana do Coração.
O acidente vascular cerebral ocorre quando um vaso sanguíneo do cérebro fica bloqueado por um coágulo (AVC isquêmico) ou se rompe e sangra (AVC hemorrágico).
Em 2016, foram registrados 13,7 milhões de derrames em todo o mundo, sendo 9,5 milhões deles isquêmicos, segundo a World Stroke Organization.
Os pesquisadores norte-americanos encontraram em pessoas de 18 a 44 anos uma prevalência mais alta de AVC entre mulheres do que nos homens, sendo mais significativa no grupo de 25 a 44 anos.
Nesta quinta-feira (29), Dia Mundial do AVC, estes dados se tornam fundamentais para prevenir derrames, afirma o cirurgião endovascular Elias Tanus, coordenador do setor de neurointervenção do Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, no Rio de Janeiro.
“O estudo trouxe um novo paradigma, tanto é que novas avaliações são necessárias para se chegar a uma conclusão definitiva. O que se acreditava era que as mulheres naquela faixa etária, por terem menos componentes de fatores de risco cardiovasculares, não tinham um fator maior de propensão a derrame porque elas têm uma menor predisposição à doença cardíaca.”
O médico observa ainda que os AVCs isquêmicos são as principais causas de sequelas hoje em todo o mundo, e quando elas ocorrem em alguém jovem, podem afetar a vida daquela pessoa para sempre.
“[São] pessoas que têm uma vida inteira produtiva e que têm um risco maior que pode estar sendo negligenciado. Quando tem uma pessoa de 30 anos que tem uma sequela e não consegue mais exercer o trabalho dela, isso é um transtorno social muito grande, além de alterar a vida dela totalmente.”
O anticoncepcional oral com estrogênio na composição é um dos fatores de risco para ter AVC. Isto porque, explica o médico, diferente do hormônio natural do organismo da mulher, essa “dose extra” promove alterações significativas no mecanismo de coagulação do sangue, facilitando a formação de trombos podem entupir um vaso sanguíneo.
No entanto, Tanus recomenda que as pacientes que fizerem uso desse tipo de medicação sempre converse com seus médicos.
“Não quer dizer que você não pode usar. Cada paciente tem que ter um tratamento individualizado, analisar os prós e contras.”
Além do anticoncepcional, gestação, enxaqueca, obesidade e tabagismo são considerados fatores de risco para acidente vascular cerebral.
Em 2019, quando vivia na Austrália, Raquel Malafaia começou a se ter alguns sinais de que algo não ia bem, mas passou cerca de um mês sem dar muita atenção.
“Eu comecei a sentir muita dor de cabeça do lado esquerdo, na parte do olho, uma dor bem profunda. Eu achava que era cansaço. Depois, apareceram outros sintomas, uns formigamentos que vinham e iam embora, na cabeça, na bochecha, nas costas, na língua, nos dedos da mão direita… e aí comecei a ter fraqueza na mão, a ponto do meu celular cair da mão”, lembra a jovem.
Quando o braço direito ficou dormente, ela foi ao médico, mas teria que pagar o equivalente a R$ 2.600 por uma ressonância magnética da cabeça.
Sem dinheiro naquele momento para pagar, Raquel decidiu esperar os resultados de exames de sangue e urina. O médico não teve objeções, e ela voltou para casa ainda sem força no braço.
“No dia seguinte, acordei e fui tomar banho. Quando fui levantar meus dois braços para lavar o cabelo, não conseguia levantar. Saí do banho e falei para a menina que morava comigo que tinha alguma coisa de errado acontecendo, mas minha língua travava, não acompanhava o meu raciocínio”.
A colega chamou uma ambulância, que chegou em 10 minutos. Raquel foi levada para um hospital e descobriu que não havia tido apenas um AVC, mas cinco naquelas semanas anteriores.
“A dor de cabeça e os formigamentos que eu estava sentindo já eram pequenos AVCs”, conta.
A jovem passou cinco dias internada, dois deles sem mexer o braço e falar. Rapidamente ela se recuperou, sem precisar de fisioterapia e fonoterapia.
“Na época, eu tomava pílula anticoncepcional há 15 anos e fumava. Eles me disseram que essa não foi a causa específica, mas fui diagnosticada com uma síndrome rara, chamada Moyamoya. Em algum momento da minha vida, minhas carótidas da cabeça do lado esquerdo ficaram mais estreitas, e aí meu sangue passa com mais dificuldade. Claro que os fatores de risco aceleraram.”
Apesar de Raquel ter sentido dor de cabeça, o AVC isquêmico não costuma apresentar dor, explica Elias Tanus.
“O AVC isquêmico, infelizmente, não dói. Quem não sabe o que está acontecendo acaba perdendo tempo de tratamento porque fica na expectativa de que a força da mão vai voltar, a fala vai melhorar. A pessoa acaba perdendo tempo de tratamento por não sentir dor.”
Os sintomas variam de acordo com a área do cérebro onde ocorre o entupimento do vaso sanguíneo.
Normalmente, os pacientes podem apresentar sensação de fraqueza ou dormência em um lado do rosto ou do corpo, dificuldade para falar, engolir ou para entender o que as pessoas dizem, confusão, perda da coordenação e pontos cegos na visão.
Saber identificar os sintomas de um AVC é essencial para conseguir o tratamento rápido. Assim como em um infarto, quanto antes você chegar ao hospital, menor a chance de ter complicações.
“O tempo para o tratamento não está relacionado à idade do paciente. O tratamento ideal é que o paciente receba medicação para tentar dissolver esse trombo em até quatro horas do início dos sintomas. Se o remédio não conseguir diluir esse trombo, tem que ir por dentro da artéria e retirá-lo em até seis horas.”
R7