O Brasil é referência mundial em vacinação graças ao Programa Nacional de Imunizações, criado em 1973 e considerado o maior programa de vacinação pública e gratuita do mundo, mas especialistas alertam para a queda das taxas.
Nos últimos anos o país inseriu novas imunizações e, atualmente, o calendário do Ministério da Saúde inclui 15 vacinas aplicadas antes dos 10 anos.
Porém, em 2019, pela primeira vez desde 1994, quando os dados começaram a ser disponibilizados, o Brasil não atingiu a meta de imunizar 95% do público-alvo, enquanto neste ano a cobertura vacinal contra as principais doenças está em torno de 50% .
“O que está acontecendo este ano é uma calamidade pública. Até 2019, era motivo de preocupação dado o risco para o país do retorno de doenças, como o sarampo”, disse Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
Graças ao seu amplo programa de vacinação, o Brasil erradicou o sarampo em 2016, mas a doença reapareceu em 2018 e, só no ano passado, o país registrou mais de 13.000 casos confirmados e 15 mortes. Até julho deste ano, foram registrados 7.293 casos e cinco óbitos, segundo o Ministério da Saúde.
Agora, em meio à emergência sanitária do coronavírus, as autoridades temem que a cobertura vacinal termine o ano bem abaixo do ideal, entre 90 e 95%.
Segundo Ballalai, a taxa de imunização caiu entre 30% e 50% em 2020, principalmente devido ao “medo” do contágio pelo coronavírus. Mas este não é o único fator que levou a uma redução drástica na cobertura vacinal, que vem despencando desde 2015.
A especialista destaca que o país vive um fenômeno conhecido como “hesitação vacinal”, que é quando as pessoas procuram menos as vacinas devido ao aumento da confiança de que estão protegidas.
“A prevenção é movida pelo medo de um determinado risco. Se eu não tiver mais medo de uma doença, não vou me vacinar. O que falta ao brasileiro é o medo de doenças”, acrescentou.
Entre os principais fatores para essa queda, segundo o Ministério da Saúde, está “a falsa sensação de segurança” diante do controle da doença, “o desconhecimento” da população mais jovem e, principalmente, o surgimento de notícias falsas e de grupos antivacina.
A coordenadora do Programa de Imunizações da cidade de São Paulo, Adriana Peres, lembrou que a alta adesão da população à vacinação nas últimas décadas permitiu que muitas doenças fossem controladas, o que produz a sensação errada de que elas desapareceram.
“As pessoas, os pais, acreditam que não precisam ser vacinados nem seus filhos porque acham que as doenças não existem mais. Por isso tivemos, por exemplo, o retorno do sarampo”, disse.
Os especialistas destacam que, graças ao Programa Nacional de Imunizações, o Brasil ainda tem uma cobertura vacinal “bastante razoável”, mas alertam que, se as taxas de vacinação continuarem caindo, o país voltará a sofrer com surtos de doenças erradicadas.
“A tendência é que a população gradualmente se torne não imune por falta de vacinas. Isso pode culminar em casos graves de doenças já superadas e aumento nas taxas de mortalidade”, alertou o infectologista Marcelo Otsuka, vice-presidente da a Sociedade de Pediatria de São Paulo.
No início do século 20, o Rio de Janeiro, então capital do Brasil, vivia uma semana de terror em meio à “Revolta da Vacina”, movimento de desordem civil contra a Lei de Vacinação Obrigatória, que buscava imunização contra os varíola.
A cidade se tornou um verdadeiro campo de batalha, que resultou em cerca de trinta mortes, dezenas de feridos e a propagação da varíola, além de outras doenças.
Mais de um século depois, os movimentos antivacinas voltam a ganhar força no Brasil e em diversos países do mundo, principalmente nos Estados Unidos e na Europa.
“Diante da expectativa de uma possível vacina contra a covid-19, começou tudo de novo. Esses movimentos voltaram com força total e começaram a se expandir também aqui no Brasil”, disse o=a vice-presidente da SBIm.