De olho em uma disputa em que os eleitores são seus pares, candidatos à presidência do Senado têm afastado a possibilidade de investigar na Casa o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), alvo de suspeitas envolvendo movimentações financeiras e integrantes de seu gabinete na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
Partidos de oposição, como o PT, defendem a instalação de uma CPI (comissão parlamentar de inquérito) para investigar o senador eleito.
“Esta questão do Flávio Bolsonaro é algo anterior à sua posse no Senado, não é um crime que cometeu enquanto senador. Mas é muito grave o que está acontecendo. Precisamos investigar isso. Se o Judiciário, o Ministério Público não derem conta, nós queremos conversar com parlamentares, com outros partidos, a instalação de uma CPI. Não podemos deixar a população sem retorno”, disse a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), que tem mandato de senadora até 31 de janeiro e, no dia seguinte, assume como deputada federal.
O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) apontou que o filho do presidente Jair Bolsonaro recebeu em sua conta bancária 48 depósitos, em dinheiro, em junho e julho de 2017, sempre no valor de R$ 2.000, totalizando R$ 96 mil.
De acordo com reportagem do Jornal Nacional, os depósitos foram feitos no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Alerj, e os remetentes não foram identificados. Flávio alega que recebeu dinheiro em espécie pela venda de um imóvel e que depositou R$ 2.000 por ser o limite no caixa eletrônico.
Além disso, há investigações sobre funcionários do gabinete de Flávio na Alerj.
O Coaf diz que Fabrício Queiroz, que era policial militar e motorista do filho de Bolsonaro, movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
Além do valor, considerado incompatível com o patrimônio de Queiroz, chamaram a atenção o volume de saques -que chegaram a cinco em um mesmo dia- e o fato de ele ter recebido repasses de oito funcionários do gabinete de Flávio.
Soma-se a isso o fato de que uma operação deflagrada no Rio de Janeiro nesta semana tinha como um dos alvos de mandado de prisão o ex-capitão da PM Adriano Nóbrega, suspeito de chefiar milícias na cidade. A mãe e a mulher dele foram funcionárias comissionadas no gabinete de Flávio até 2018. Flávio atribui as indicações a Queiroz.
A reportagem ouviu seis dos nove pré-candidatos ao comando do Senado: Renan Calheiros (MDB-AL), Simone Tebet (MDB-MS), Angelo Coronel (PSD-BA), Alvaro Dias (PODE-PR), Esperidião Amin (PP-SC) e Major Olímpio (PSL-SP).
A maioria dos entrevistados disse que não se deve pré-julgar Flávio e que ele já está sendo alvo de investigação do Ministério Público.
“Tenho uma tese de que ninguém deve pré-julgar ninguém. Acho que o senador Flávio Bolsonaro vai ter a oportunidade de externar e fazer a sua defesa. Se lá na frente ele cometer algum delito, cabe à Justiça apreciar e julgar. Mas não será Angelo Coronel, presidente do Senado, se for, que vou ser o algoz de nenhum parlamentar”, disse o próprio senador eleito pelo PSD da Bahia.
Para Renan Calheiros, Flávio não pode ser investigado no Rio de Janeiro, já que é senador eleito, nem no Senado.
“A investigação no Senado só acontece em circunstâncias especialíssimas. Temos com relação a ele as melhores expectativas, de que é um moço que quer trabalhar, que quer fazer um bom mandato, que tem posições e defende-as. O que nós queremos é o melhor dele neste momento complexo da vida nacional. A expectativa que nós temos é a melhor possível”, disse Renan.
Concorrente de Renan na bancada do MDB, Simone Tebet disse que é prematuro avançar nesta pauta porque é necessário haver algo concreto para se analisar.
“Acima de tudo, é importante ter os fatos. Os fatos têm que estar claros. Tenho que ter algo concreto no que me debruçar. Lembrando que tudo que foi feito antes da posse, a princípio, não cabe investigação por parte da Casa. Isso fica por conta do Ministério Público, do Poder Judiciário. A não ser que queira fazer barulho, pré-julgamento ou fazer com o partido do outro o que não quis que se fizesse com o próprio partido, fora isso, é muito prematuro você avançar nesta pauta. Não somos Ministério Público, muito menos Judiciário”, disse a senadora.
Pré-candidato pelo PSL, partido dos Bolsonaro, Major Olímpio (SP) disse que as investigações sobre Flávio não afetam o governo e que não acredita no avanço de investigações no Senado.
“A oposição tem que fazer o papel dela, é da democracia. Não creio que vá prosperar nenhuma iniciativa destas”, afirmou nesta semana.
Esperidião Amin disse não ter opinião formada e defendeu a atuação do Ministério Público.
“Não tenho a menor ideia ainda porque não conheço o teor da investigação que está em curso. Acho que as instituições estão funcionando corretamente. Não tenho reparos ao que as instituições que estão atuando têm feito. Portanto, não acho que devo opinar sobre o que não conheço”, afirmou o senador eleito.
Alvaro Dias, que teve o combate à corrupção como sua principal bandeira na disputa pela Presidência da República, no ano passado, diz que o Senado não deve interferir.
“Já há uma investigação em curso que diz respeito à Assembleia do Rio de Janeiro e não ao Senado Federal. Temos que aguardar as investigações, sempre valorizando o Ministério Público, Polícia Federal, todos esses órgãos da investigação. Mas sem interferência da nossa parte. Sem pré-julgar, temos que aguardar.
“O Congresso Nacional é foro sim para fazer investigação”, insiste Gleisi Hoffmann. “Tem muita coisa para ele explicar. É muito grave o que aconteceu. Acho muito difícil eles afastarem do Palácio do Planalto este tipo de crise. É uma crise que envolve o centro familiar.”
Os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE), Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Fernando Collor (PTC-AL), cujos nomes também figuram como pré-candidatos à presidência do Senado, foram procurados diretamente ou por meio de suas assessorias, mas não responderam até a publicação da reportagem.
Bahia Notícias