Os primeiros olhares foram trocados na escola. Descobriram que ambos disputariam vagas em faculdades de Medicina. Os carinhos e papos agradáveis certamente evoluiriam para o namoro. Mas veio o coronavírus e o primeiro decreto, da prefeitura, de suspensão das aulas. Logo depois, o governo também baixou decreto suspendo por mais tempo ainda as atividades em escolas, faculdades, cursinhos.
Continuaram mantendo contato. Luiz, um jovem negro, de corpo atlético, cabelo cortado rente e dono de um sorriso de propaganda de creme dental. Vivian, morena clara, com pouco mais de 1,60 metro, era discreta. Não usava roupas coladas, sensuais, mas era conhecida pelo belo corpo, somente exibido na praia e em aulas de natação. Ambos com 17 anos.
Ah! O amor!
O isolamento social os afastou fisicamente, mas mantiveram as mensagens trocadas, graças a tecnologia. Logo ao despertar, após o café, depois da aula online, depois do almoço, meio da tarde, final de tarde, noite. Contatos intensos, principalmente por vídeo. Era namoro, eles sabiam, mas não tinham ainda trocado um beijo, carinhos, cafunés.
Viviam chegou até e perder a vergonha e exibir numa ligação de vídeo o biquíni novo, amarelo, de lacinho, que usaria na volta do confinamento. Ele, atlético, exibia-se pulando corda e fazendo apoio na sala do apartamento de três quartos, localizado no Imbuí.
Quase dois meses se passaram, a vontade de se encontrar crescia. Tomaram coragem. Ele, pediu permissão aos pais para deixar o confinamento, ao menos por duas horas. Ela, olhou com olhos de menina pidona nos olhos do pai, professor universitário, e disse que queria ver o garoto, pois se amavam. Roque até quis relutar, mas fazer o quê? Entendia essa vontade adolescente de estar juntos.
Permitiu, cheio de cuidados. “Não podem trocar carinhos, nada de beijos… é para conversar. Usem álcool em gel, lavem as mãos. Se toquem apenas com os cotovelos. Não sou radical, mas precisamos evitar a contaminação ao máximo”.
Luís chegou de carona com o pai.
Juntos, finalmente, mas distantes um metro e meio um do outro no playground do prédio onde Lilian reside, em Pituaçu. O cumprimento com os cotovelos veio com um arrepio. Apenas viam os olhos, um do outro. Ele notou as orelhas vermelhas dela quando disse que estava apaixonado, mesmo sem nunca terem trocado um beijo. Um beijo… mas como? Como iriam se beijar para selar definitivamente aquele namoro?
Como bons alunos de biologia, decidiram que no próximo encontro trocariam esse beijo. E trocaram… Ele usava duas máscaras, ela também. Acertaram que prenderiam a respiração por um minuto (e treinaram durante toda a semana). Aproximaram as bocas, mesmo por trás de tanto pano e, sem se tocar, trocar carinhos com as mãos, encostaram as bocas, abertas. O beijo aconteceu.
Na semana seguinte os dois caíram doentes, contaminados pela Covid-19. Nada sério, mas até agora não conseguiram descobrir quem pegou de quem.
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Chicossauro Rex
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