O vírus da zika é capaz de matar células-tronco de glioblastoma, um tipo mortal de câncer no cérebro, de acordo com um novo estudo realizado por cientistas americanos. As células-tronco dos tumores são especialmente resistentes aos tratamentos convencionais contra o câncer. De acordo com os autores da pesquisa, publicada nesta terça-feira (5), na revista científica “The Journal of Experimental Medicine”, a descoberta abre caminho para que um dia o zika seja utilizado como um tratamento complementar para o glioblastoma. Sabendo que o zika tem preferência por destruir células-tronco do cérebro de bebês em desenvolvimento – causando malformações como a microcefalia -, os pesquisadores decidiram investigar se essa característica do vírus poderia ser dirigida contra as células de glioblastoma, que é o tipo mais comum de tumor cerebral. “Nós mostramos que o vírus da zika pode matar o tipo de célula de glioblastoma que tende a ser resistente aos tratamentos atuais, levando a maior parte dos pacientes à morte”, disse um dos autores do estudo, Michael Diamond, da Universidade Washington, em St. Louis. Atualmente o tratamento padrão para o glioblastoma é extremamente agressivo, incluindo cirurgia, quimioterapia e radioterapia. Ainda assim, a maior parte dos tumores voltam a aparecer dentro de seis meses. De acordo com os autores do estudo, as chamadas células-tronco do glioblastoma frequentemente sobrevivem ao agressivo tratamento e continuam se dividindo, produzindo novas células tumorais que substituem aquelas que foram mortas pelas cirurgias e drogas. “É frustrante tratar um paciente de forma tão agressiva, apenas para vermos seu tumor voltar a aparecer alguns meses depois. Nós imaginamos que talvez a natureza pudesse fornecer uma arma para atacarmos as células que são provavelmente as maiores responsáveis por esse ressurgimento”, disse outro dos autores do estudo, Milan Chheda, também da Universidade Washington. Os cientistas notaram que as células-tronco do glioblastoma, com sua capacidade quase ilimitada de produzir novas células, lembram as células neuroprogenitoras, que são responsáveis por gerar células novas para o cérebro em desenvolvimento. As células neuroprogenitoras são os alvos preferidos do vírus da zika. Em colaboração com pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego, os cientistas da Universidade de Washington testaram se o vírus poderia matar células-tronco em glioblastomas removidos de pacientes em biópsia para realização do diagnóstico. Os cientistas infectaram os tumores com o vírus da zika, que se espalhou pelos tumores, infectando e matando as células-tronco de câncer, evitando claramente as demais células tumorais. A descoberta sugere que a infecção por zika e um tratamento com quimioterapia e radioterapia podem ter efeitos complementares. Os tratamentos padrão matam as células tumorais em massa, mas frequentemente deixam intactas as céulas-tronco, que acabam regenerando o tumor. O vírus da zika, por sua vez, ataca as células-tronco, mas ignora a maior parte do tumor. “Imaginamos que um dia o zika vá ser utilizado em combinação com as terapias já existentes para erradicar o tumor completamente”, disse Chheda. Para descobrir se o vírus poderia ajudar a tratar o câncer em um animal vivo, os cientistas injetaram o vírus da zika nos cérebros de 18 camundongos e uma solução de água salgada (um placebo) no cérebro de outros 15 animais. Duas semanas após a injeção, os tumores ficaram consideravelmente menores nos camundongos tratados com zika, que também sobreviveram bem mais tempo que os animais que receberam o placebo. Se o zika fosse utilizado em humanos, o vírus precisaria ser injetado no cérebro, provavelmente durante a cirurgia de remoção do tumor primário. Se o vírus fosse introduzido em outra parte do corpo, o sistema imunológico da pessoa o destruiria antes que ele chegasse ao cérebro. De acordo com os autores do estudo, a ideia de injetar no cérebro de uma pessoa um vírus conhecido por causar danos cerebrais pode soar alarmante, mas o zika poderia ser seguro para uso em adultos, porque seus alvos principais – as células neuroprogenitoras – são raras no cérebro já desenvolvido. O cérebro do feto, por outro lado, é repleto dessas células, o que explica, em parte, por que a infecção por zika antes do nascimento produz graves danos cerebrais – enquanto a infecção natural na idade adulta causa sintomas mais amenos.
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