O transtorno de ansiedade é uma doença conhecida. De acordo com estudo conduzido pela OMS (Organização Mundial da Saúde), entre 1990 e 2013, o número de pessoas com depressão ou ansiedade aumentou em quase 50%, passando de 416 milhões para 615 milhões. A ansiedade, que se manifesta de várias formas como TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo) ou mesmo Síndrome do Pânico, pode afetar qualquer um em qualquer lugar.
Celebridades como Selena Gomez, Zayn Malik, ex-integrante do One Direction, já afirmaram sofrer com a doença. Camila Cabello, uma das vocalistas do grupo Fifth Harmony, chegou a abandonar um show durante uma crise de ansiedade. Com tantos casos, seria correto dizer que os jovens estão ficando mais ansiosos?
Uma pesquisa realizada com jovens americanos de 1938 a 2007 mostrou que cinco vezes mais estudantes sofriam de ansiedade e outras desordens mentais em comparação com pessoas da mesma idade que viviam no final da década de 1930, em plena época da Grande Depressão. A resposta para esse aumento, segundo o estudo, seria que atualmente existe uma cobrança maior por aparência, riqueza e status social.
O que aumentou doença ou diagnóstico?
A ansiedade só recebeu um estatuto clínico ao final do século 19, com trabalhos de Sigmund Freud, é o que explica Milena de Barros Viana, professora de psicologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). “A partir da década de 1980, a psicanálise cede lugar à chamada psiquiatria biológica e o conceito de neurose sai de cena. A partir daí passamos a falar em transtornos de ansiedade (e não mais em neurose).”
Sim, os critérios diagnósticos mudaram. Entretanto, alguns estudos sugerem também que estamos ficando mais ansiosos (e deprimidos). “
Milena de Barros Viana, da Unifesp
Apesar de concordar quanto a melhora na forma de obter um diagnóstico, Miguel Jorge, psiquiatra da Unifesp, afirma que a ansiedade também foi afetada pelas mudanças da sociedade, em particular, as de grandes centros urbanos.
“Atualmente existe uma competição maior no mercado de trabalho, além de estarmos expostos a estímulos constantes através da comunicação e com a participação em mídias sociais. Todas essas coisas contribuem para despertar a ansiedade”, explica.
Ficar conectado o tempo todo influencia?
Estar conectado o tempo inteiro pode agravar ou mesmo provocar quadros de ansiedade, explicam os especialistas.
“Se há necessidade de estar o tempo todo conectado e isso acaba tomando conta da vida da pessoa ao ponto dela se sentir mal quando não está conectada, ou deixar de fazer outras coisas que são importantes para ela, então sim, esse tipo de ansiedade pode ser ligada à tecnologia”, explica Ana Arantes professora de psicologia da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).
Mas as redes sociais também encontraram um papel além da cobrança por status social. Em diversos grupos, pessoas com transtorno semelhantes, se reúnem para conversar online sobre as dificuldades do cotidiano.
“Para mim, as redes sociais têm sido uma ajuda! Pois, quando me sinto pior ou estou a passar por uma crise, sei que existe um lugar onde posso falar dos meus pensamentos, comportamentos e sentimentos e que alguém me vai entender! É quase uma terapia de grupo” diz a portuguesa Eli Correia, 43, que sofre com crises de pânico desde os 17 anos.
Só os jovens estão mais ansiosos?
Uma pesquisa publicada pela Universidade de Cambridge, afirmou que as mulheres são quase duas vezes mais propensas a experimentar ansiedade do que os homens. Mas nem todos os especialistas concordam com esses dados.
“Não sei se isso é válido ainda hoje, minha experiência, em meu consultório é que a ansiedade tem a mesma frequência em homens e mulheres. “
Miguel Jorge, psiquiatra especializado em depressão,
Para a professora Milena Viana, o resultado do estudo é coerente com a realidade. “Os hormônios sexuais femininos, ao que parece, tornam indivíduos do sexo feminino mais predispostos a estes quadros clínicos (e também à depressão)”, explica.
Segundo a professora Ana Arantes, não seriam apenas os fatores biológicos que influenciaram o fator da ansiedade ser mais frequente em mulheres. Para a psicóloga o ambiente social e cultural também influencia a frequência do transtorno.
“O tempo todo somos bombardeadas com regras sobre como devemos nos comportar, nos sentir, o que podemos e o que não podemos pensar e muitas vezes essas regras são contraditórias, ou seja, seguir ou não seguir a regra vai gerar insatisfação, frustração e punição. Nesse tipo de contexto a pessoa tem que estar o tempo todo alerta para evitar essas situações desagradáveis e potencialmente danosas para sua integridade social, emocional e psicológica. Isso é um fator predominante para o desenvolvimento de ansiedade. ”
Ansiedade nunca é normal?
A ansiedade só é um transtorno quando impede a pessoa de ter uma vida saudável, quando passa a ser motivo de sofrimento.
“Em graus adequados ela melhora o nosso desempenho (por ex., tenho um exame, fico ansioso, isso me leva a estudar mais, me saio melhor no exame). Entretanto, em graus elevados ela nos traz sofrimento e prejuízos (utilizando o exemplo do exame: posso ficar tão ansioso que não consigo me concentrar, não consigo dormir, e no dia do exame não consigo sair de casa para fazê-lo) e pode configurar uma patologia”, explica Milena.
As crises de ansiedade podem provocar diversos sintomas físicos como taquicardia, dores musculares, no estômago, falta de ar e tremores. Isso não significa que a pessoa vai sentir tudo isso ou passar por crises frequentes.
“A ansiedade pode ser ligada a situações específicas (ansiedade ao falar em público, por exemplo), ou ser generalizada para várias situações na vida da pessoa. Também pode haver crises de ansiedade agudas em determinados momentos, mas em outros não; ou a pessoa ter ansiedade crônica, ficando o tempo todo com sentimentos e comportamentos de ansiedade”, explica Ana Arantes.
O tratamento também não é generalizado e muda caso a caso. “O tratamento pode ser com medicamento e terapia. Existem quadros que são passageiros, e tratando desaparecem, outros que, mesmo com o tratamento, podem ser apenas controlados mas persistem”, explica Miguel Jorge.
uol