A intenção do governo federal de repassar à iniciativa privada a administração de ao menos 14 aeroportoscoloca a Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária) em um dos momentos mais delicados da sua história, segundo especialistas ouvidos pelo R7.
A estatal, fundada em 1973 durante o governo militar de Emílio Garrastazu Médici, chegou a administrar mais de 66 terminais em 2011, mas agora caminha para um encolhimento.
Ao fim de 2016, a Infraero registrou 104,7 milhões de embarques e desembarques nos 60 aeroportos que administrava.
Com os terminais já leiloados e com as futuras concessões, a expectativa é de uma perda de 62,6 milhões de embarques e desembarques: queda de 60%, levando em conta os números do ano passado.
Somente as concessões dos terminais de Porto Alegre (RS), Florianópolis (SC), Salvador (BA) e Fortaleza (CE), em março, significam uma perda de 23,3% do número de passageiros da estatal em relação a 2016.
No ano que vem, será a vez de Congonhas (SP), segundo mais movimentado do País, Recife (PE), Vitória (ES), Maceió (AL), Aracaju (SE), João Pessoa (PB), Campina Grande (PB), Juazeiro do Norte (CE), Cuiabá (MT), além de terminais menores em Mato Grosso e o aeroporto de Macaé (RJ). Isso vai representar a perda de, ao menos, 36,5% para a Infraero em número de passageiros.
O aeroporto de Congonhas responde sozinho por cerca de 20% do movimento de passageiros da rede da Infraero.
Para o professor Amandio Furtado, de gestão de aeroportos do curso de aviação civil da Universidade Anhembi Morumbi, o fato de o governo Temer tirar a Infraero das licitações deste ano já indica um papel secundário para a estatal.
— A questão da Infraero é bem difícil de ser equalizada. A Infraero vai ter que se reinventar, justamente porque quase todos os ativos que ela administra vão passar para a iniciativa privada. Vai ter que passar por um processo de equilíbrio financeiro, que não vai ser fácil, porque boa parte da receita está saindo da mão dela.
O encolhimento da Infraero teve início em 2011, diante da necessidade de obras rápidas e robustas em aeroportos para a Copa do Mundo de futebol. Na época, o governo de Dilma Rousseff (PT) repassou o controle de Guarulhos (SP), Viracopos (SP), Confins (MG), Galeão (RJ) e Brasília a empresas privadas.
Mesmo assim, a Infraero manteve 49% de participação nesses terminais, fatia que agora o governo de Michel Temer (PMDB) planeja vender.
Furtado ressalta que a fatia que o governo quer vender nos quatro aeroportos deverá ser usada para custear um programa de demissão voluntária na estatal e minimizar essa queda brusca de receita nos próximos anos.
O presidente da Infraero já manifestou preocupação com a concessão anunciada pelo governo. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, o prejuízo decorrente disso poderia chegar a R$ 3 milhões.
Já o professor da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo) Gilson Garófalo avalia que esses movimentos do governo apontam para o fim da Infraero.
— A gente segue uma trilha em que a Infraero daqui a pouco deixa de existir. Ela vai perdendo participação, e a ideia talvez seja essa. Como uma das poucas estatais remanescentes, dentro dessa linha de raciocínio, ela deixa de existir.
Embora esteja “desaparecendo”, vale lembrar que a Infraero ainda administrará cerca de 40 aeroportos menos rentáveis, os quais dificilmente o governo conseguirá vender no futuro (veja tabela abaixo).
Furtado acrescenta que a estatal reestruturada poderá ter um novo papel na aviação brasileira.
— É uma empresa muito importante e serve, inclusive, como um órgão regulador além da Anac [Agência Nacional de Aviação Civil] nessa questão de intercâmbio entre espaço aéreo e infraestrutura aeroportuária.
A empresa teve um prejuízo líquido (após os investimentos) de R$ 751,7 milhões em 2016. No ano anterior, o rombo havia sido ainda maior: R$ 3 bilhões. No primeiro semestre deste ano, o prejuízo líquido foi de R$ 276 milhões.
Procurada, a Infraero disse que não vai comentar as concessões dos aeroportos.
O grupo que assumiu o aeroporto de Viracopos, em Campinas, entrou em dificuldades financeiras e precisou devolver o terminal ao governo federal no mês passado. A Infraero era sócia do negócio, com 49% de participação.
Porém, apesar da dificuldade dos controladores, a estatal também estava endividada e não podia tomar empréstimos para injetar no aeroporto.
O secretário de Aviação Civil, Dario Rais Lopes, chegou a criticar a concessão nesses moldes, feita por Dilma.
Agora, a União pretende licitar novamente Viracopos, já no novo modelo, sem qualquer participação da Infraero.