Com a chegada do horário de verão, vem sempre a polêmica. Enquanto alguns celebram os dias mais longos, há quem reclame da “hora a menos” de sono ao adiantar os ponteiros do relógio.
Um estudo da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, já mostrou que os brasileiros estão entre os que menos dormem no mundo. A média é de 7h36 por noite. O que, para muitas pessoas, não é suficiente.
Muitas pesquisas sugerem que reduzir o sono, deliberadamente ou de outra forma, pode ter um impacto sério no organismo.
Algumas noites mal dormidas podem afetar o controle de açúcar no sangue e fazer com que a gente coma demais. Chegam até a bagunçar nosso DNA.
Há alguns anos, o programa da BBC Trust Me I’m a Doctor (“Confie em mim, eu sou médico”, em tradução livre para o português) realizou um experimento em parceria com a Universidade de Surrey, na Inglaterra. Eles pediram a voluntários que reduzissem suas noites de sono em uma hora durante uma semana.
Simon Archer, que ajudou a executar o experimento, descobriu que o fato de ter uma hora a menos de sono por noite afetou a atividade de diversos genes dos participantes (cerca de 500 no total), incluindo alguns associados à inflamação e ao diabetes.
Ou seja, não há dúvidas sobre os efeitos negativos da falta de sono no organismo. Mas que efeitos as noites mal dormidas podem ter na saúde mental?
Para descobrir, a equipe do programa Trust Me I’m a Doctor se juntou a cientistas do sono da Universidade de Oxford para conduzir um experimento de pequeno porte.
Desta vez, foram recrutados quatro voluntários que têm o hábito de dormir profundamente. Eles foram conectados a dispositivos que monitoram o sono com precisão. Nas três primeiras noites, dormiram oito horas seguidas, sem interrupção.
Já nas três noites seguintes, o sono dos participantes foi limitado a apenas quatro horas.
E qual foi o resultado?
Sarah Reeve, estudante de doutorado que conduziu o experimento, ficou surpresa com a rapidez com que o humor dos participantes mudou.
“Houve um aumento na ansiedade, na depressão e no estresse. Também aumentou a paranoia e o sentimento de desconfiança em relação a outras pessoas”, revela.
“Dado que isso aconteceu após apenas três noites de privação de sono, é muito impressionante”, completa.
Três dos quatro voluntários consideraram a experiência desagradável. Mas um dos participantes disse não ter sido afetado.
“Essa semana provavelmente não me afetou tanto quanto pensei “, afirmou Josh. “Me sinto perfeitamente bem – nem feliz, nem triste, estressado ou qualquer coisa.”
Os testes realizados mostraram, no entanto, um quadro bem diferente.
As emoções positivas de Josh diminuíram bruscamente após duas noites de sono interrompido, enquanto as emoções negativas começaram a aumentar.
Desta forma, embora ele se sentisse bem, havia sinais de que ele estava começando a ser afetado mentalmente.
O resultado do teste confirma a descoberta de um estudo muito maior, que analisou o impacto da privação do sono na saúde mental de estudantes.
Pesquisadores recrutaram mais de 3,7 mil alunos de universidades do Reino Unido que já tinham relatado dificuldades para dormir.
Eles foram divididos aleatoriamente em dois grupos. O primeiro participou de seis sessões online de Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) destinadas a melhorar o sono. Já o outro recebeu apenas conselhos padrão.
Dez semanas após o experimento, os estudantes que foram submetidos à terapia apresentaram uma redução de 50% nas taxas de insônia, acompanhada de melhorias significativas na pontuação para depressão e ansiedade, além de diminuição da paranoia e alucinações.
A pesquisa, considerada o maior estudo randomizado controlado de tratamento psicológico para a saúde mental, sugere fortemente que a insônia pode causar problemas de saúde mental, em vez de ser simplesmente uma consequência.
Daniel Freeman, professor de psicologia clínica na Universidade de Oxford, que liderou o estudo, acredita que uma das razões pelas quais a privação do sono é tão prejudicial para nossos cérebros é porque ela incentiva o pensamento negativo repetitivo.
“Temos mais pensamentos negativos quando somos privados de sono e ficamos presos neles”, explica.
Ele não acredita, no entanto, que algumas noites mal dormidas signifiquem que a pessoa vai ter uma doença mental. Mas, segundo ele, o risco de fato aumenta.
“A cada noite, uma em cada três pessoas está tendo dificuldade para dormir. Talvez 5% a 10% da população geral tenha insônia. Muita gente lida com isso e segue com suas vidas. Mas isso aumenta o risco de uma série de dificuldades relacionadas à saúde mental.”
Mas há também o lado positivo. A pesquisa mostra que ter uma boa noite de sono pode ajudar a melhorar a sensação de bem-estar.
Norbert Schwarz, professor de psicologia da Universidade do Sul da Califórnia, faz uma metáfora.
“Ganhar US$ 60 mil (R$ 196 mil) a mais por ano tem menos efeito na sua felicidade diária do que uma hora a mais de sono por noite”, afirma.
Sendo assim, tenha uma boa noite.
R7