Enquanto cientistas em todo o mundo correm contra o tempo para tentar entender o novo coronavírus, esse ‘inimigo invisível’ já matou mais de meio milhão de pessoas pelo mundo.
Não surpreende, portanto, que, à medida que as restrições de bloqueio começam a ser flexibilizadas em diversos países, muitas pessoas tenham medo de sair, de retomar a vida normal ou até deixar as crianças voltarem à escola.
No Brasil, diversas capitais vêm anunciando a reabertura parcial do comércio. Há uma semana, São Paulo decidiu permitir a retomada das atividades em bares, restaurantes e salões de beleza, além de estender o horário de funcionamento de shoppings, de lojas de rua, concessionárias e imobiliárias.
A partir desta segunda-feira (13/07), parques municipais e academias também poderão voltar a funcionar.
Nessa nova fase, a quais riscos estamos expostos?
Alguns argumentam que as restrições para circulação deveriam continuar até que a segurança pudesse ser completamente garantida – com uma vacina, por exemplo. Mas também é preciso levar em conta os efeitos colaterais desse tipo de estratégia.
Eles são descritos pelo consultor médico-chefe do Reino Unido, Chris Whitty, como os “custos indiretos” da pandemia, e envolvem desde o acesso desigual das populações aos serviços de saúde para tratamento de outras doenças a problemas relacionais à saúde mental, dificuldades financeiras e prejuízos à educação de crianças e jovens.
Assim, à medida que o isolamento é afrouxado, a sociedade e os indivíduos terão de tomar decisões levando em consideração riscos e benefícios.
A professora Devi Sridhar, diretora do setor de saúde pública global da Universidade de Edimburgo, diz que a grande questão neste momento é se estamos “suficientemente seguros”.
“Sempre haverá riscos. Em um mundo onde a covid-19 permanece presente na comunidade, a discussão é sobre como reduzimos esse risco, assim como fazemos com outros tipos de perigos diários, como dirigir ou andar de bicicleta.”
Ela estava se referindo à volta às aulas, mas o conceito pode ser aplicado igualmente a muitas outras situações.
A especialista diz que parte dessa equação depende das medidas tomadas pelo governo, como distanciamento social, fornecimento de equipamentos de proteção e disponibilidade de testes e rastreamento de contatos para conter surtos locais.
Sridhar critica a maneira como o governo do Reino Unido lidou com todos esses fatores.
À medida que mais liberdades voltam, a importância das decisões individuais cresce.
Talvez não se trate de encontrar a opção totalmente correta, mas a opção menos perigosa.
O estatístico David Spiegelhalter, especialista em risco da Universidade de Cambridge e consultor do governo britânico, diz que, de fato, é uma questão de “gerenciamento de riscos” — e, por isso, precisamos entender a magnitude da ameaça a que estamos expostos.
Existem dois fatores que influenciam o risco que enfrentamos com o coronavírus — o de ser infectado e, possivelmente, o de desenvolver um quadro mais grave ou mesmo morrer.
Os dados do Departamento Nacional de Estatísticas britânico (ONS, na sigla em inglês) dão um bom parâmetro desse risco de infecção.
Informações divulgadas recentemente apontam que, no Reino Unido, cerca de uma em cada 400 pessoas está infectada.
Assim, as chances de alguém no país entrar em contato próximo com um desses indivíduos — como estamos praticando o distanciamento social, mesmo quando saímos de casa — são consideradas muito pequenas, embora algumas pessoas, dependendo de seus empregos, estejam em maior risco que outras.
A esperança é que o nível de infecção diminua ainda mais com o tempo se o programa de testes e rastreamento do governo mantiver o vírus controlado.
E, mesmo que sejamos infectados, o fato é que para a maioria das pessoas o coronavírus provoca uma doença de leve a moderada — acredita-se que apenas uma em cada 20 pessoas que apresentam sintomas necessite de tratamento hospitalar.
Sabe-se que o risco é maior para pessoas idosas, com mais de 65 anos, e para aquelas com doenças pré-existentes.
Mas talvez a maneira mais fácil de quantificar o risco individual seja se questionando sobre como você se sente diante da possibilidade de morrer nos próximos 12 meses.
O que é interessante sobre o coronavírus é que, se estivermos infectados, nossas chances de morrer parecem refletir nossa chance de morrer de qualquer maneira durante o próximo ano, após os 20 anos de idade.
Por exemplo, uma pessoa normal com 40 anos tem um risco de um em mil de não chegar ao próximo aniversário e um risco quase idêntico de não sobreviver a uma infecção por coronavírus. Isso significa que seu risco de morrer dobra caso você seja infectado.
E esse é o risco médio — para a maioria das pessoas, aquelas fora do grupo de risco, a chance é efetivamente menor.
Portanto, o coronavírus está, de fato, captando quaisquer fragilidades e amplificando-as. É como embutir um risco extra em um curto período de tempo.
Se o seu risco de morrer era muito baixo, ainda permanece muito baixo.
Quanto às crianças, o risco de morrer de outras maneiras — câncer e acidentes são as maiores causa de morte — é maior do que a chance de morrer se forem infectadas com coronavírus.
Durante a pandemia até agora, três menores de 15 anos morreram de covid-19 no Reino Unido. Para comparação, cerca de 50 menores de 15 anos morrem em acidentes de trânsito no território britânico anualmente.
Portanto, o que parece crucial enquanto todos tentamos equilibrar os riscos é identificar as pessoas com risco significativo de doença grave caso sejam contaminadas pelo coronavírus — se pertencemos a um desses grupos ou temos contato próximo com alguém que faça parte.
Atualmente, o governo britânico está pedindo para 2,5 milhões de pessoas se isolarem completamente. Isso inclui quem fez transplantes de órgãos, quem está em tratamento contra o câncer e pessoas com doença respiratória grave.
Além disso, há mais de 10 milhões de pessoas que se enquadram em grupos de maior risco. Estes incluem todos os maiores de 70 anos e pessoas com problemas de saúde que variam de diabetes a problemas cardíacos.
A professora Sarah Harper, especialista em envelhecimento da Universidade Oxford, argumentou que as necessidades de “uso geral e arbitrário da idade” como critério devem ser ponderadas, pois mesmo nesses grupos o nível real de risco varia enormemente.
À medida que avançamos na pandemia, descobrir mais sobre o real risco a que estamos expostos é crucial.
R7