Jailderson Silva
(Estudante de Jornalismo da Estácio-Ba)
Há pouco mais de um ano, a nova realidade forçou mudanças que atingiram em cheio o maior patrimônio dos clubes de futebol: sua torcida. O isolamento social, em respeito às medidas preventivas para conter o avanço da Covid-19, deixou um enorme vazio em meio a um espetáculo sem plateia. A ausência dos torcedores nos estádios, durante a pandemia provocada pelo coronavírus, mexeu financeiramente e principalmente com a rotina dos clubes de futebol pelo mundo.
No lugar de arquibancada cheia, festa e lucro para os clubes, restaram apenas o silêncio e uma saudade que só aumenta para os torcedores, além de muitos prejuízos aos times de futebol profissional. Ser testemunha, vibrar com gols e títulos, desestabilizar o adversário e viver a atmosfera de uma partida hoje se misturam à falta de perspectiva sobre quando será possível voltar a ver o futebol com público outra vez.
Muitas pessoas que tinham o estádio como sua única opção de lazer, faziam do estádio a sua terapia particular e conseguiam se desligar, mesmo que por alguns minutos de uma realidade insuportável cotidiana. Enquanto o cenário não muda, o que resta é saudade e um clima de nostalgia de ir a campo.
Na tentativa de animar os jogos e minimizar de alguma forma a ausência dos torcedores, muitos clubes apelaram para a criatividade. Alguns chegaram a apostar em barulhos artificiais no sistema de áudio dos estádios, reproduzindo os cânticos de torcida. Outros realizaram campanhas com fotos de torcedores nas arquibancadas e telões virtuais. Alguns torcedores por sua vez, enfeitam o estádio com suas bandeiras, faixas e mosaicos a cada jogo, numa demonstração de apoio em um momento tão difícil.
A torcedora do Esporte Clube Vitória, Lorena Reis, que foi levada pela primeira vez ao estádio Manoel Barradas pelo tio e frequenta o estádio desde os oito anos, hoje lamenta a distância e conta como faz para matar um pouco da saudade. “É horrível estar distante. Eu nunca imaginei ficar mais de um ano sem frequentar minha segunda casa, e isso é muito angustiante. Eu tento me distrair conhecendo ambientes novos, fazendo atividades as quais eu não tinha muito costume, mas, as vezes me pego vendo vídeos de jogos antigos e da festa que a torcida fazia na arquibancada para tentar amenizar a saudade”.
Lorena esteve no último jogo do Leão com público, contra o River do Piauí, pela Copa do Nordeste, jogo que aconteceu em março do ano passado. Ela viu o rubro-negro vencer de goleada os piauienses pelo placar de 4×1. Hoje ela conta que seu humor piorou devido ao afastamento e tem uma visão bastante pessimista do quadro de um possível retorno das torcidas aos estádios.
“Hoje em dia eu fico muito mais estressada e isso se passa muito devido a essa abstinência. Infelizmente ainda estou apreensiva em relação a algum tipo de melhora. Acredito que só vamos poder retornar aos estádios no meado de 2022 e olhe lá.”
No último final de semana, completou exatamente um ano desde a última partida na Arena Fonte Nova em Salvador. Era uma tarde de domingo, dia de rodada dupla e estádio cheio, o maior público do Esporte Clube Bahia no ano de 2020 e o último com portões abertos para a sua torcida. O esquadrão venceu o primeiro jogo por 1×0, contra o Confiança pela Copa do Nordeste e empatou o segundo pelo placar de 0x0 contra o DoceMel, pelo campeonato baiano.
Alane Santana torce para o Esporte Clube Bahia “desde que nasceu”, por influência do pai tricolor que a levava para o antigo estádio Octávio Mangabeira, nome dado à Arena Fonte Nova antes da sua reforma total. Ela conta como estava o clima nos jogos simultâneos do tricolor.
“Foi uma festa imensa, ninguém ali sabia ou tinha noção que aqueles seriam os últimos jogos com presença da torcida, muito menos que levaria tanto tempo assim para voltarmos ao lugar de nossa maior alegria. Se eu soubesse teria aproveitado muito mais. Além de torcer pro Bahia agora mais do que nunca torcemos para que a ciência vença, para que todos em breve estejamos imunizados e de volta a nossa segunda casa. “A saudade é imensa, eu olho minhas fotos, vídeos e a emoção de ter vivido tudo aquilo e a expectativa de viver outra vez me preenche. É difícil algo ocupar esse espaço”.
A psicóloga Liliane Sena, explica como torcedores podem se adequar a nova realidade desse novo modo de torcer e explica o que acontece com a cabeça do torcedor: “As atividades de lazer, como ir ao estádio por exemplo, ajudam muitas pessoas a enfrentar desgastes físicos e mentais resultantes das tensões que estamos sujeitos em nosso dia a dia. Tensões inclusive que se potencializam bastante de acordo com o momento que estamos vivendo, de pandemia e consequentemente o isolamento social”.
Ter torcedores no estádio é uma realidade ainda incerta, não se sabe quando e como os torcedores poderão voltar às arquibancadas e torcer. Enquanto isso podemos criar mecanismos para enfrentar a situação de uma forma mais leve, recriar mesmo que em casa o ambiente de estádio, do jeito que a pessoa gosta, cuidar de si através do autoconhecimento e aprendendo a lidar com suas próprias emoções, tentar encontrar outras atividades que proporcionem prazer ao individuo. Não é fácil lidar com a falta de algo que se tornou de fato essencial, mas é possível, sim, lidar com a ausência de uma forma mais agradável”.