A imunização contra a covid-19 começou a se tornar realidade nos Estados Unidos nesta semana, quando foi iniciada a primeira etapa de vacinação com doses Pfizer-BioNTech envolvendo 21 milhões profissionais de saúde e 3 milhões de idosos em casas de repouso.
É uma novidade animadora para o país mais afetado pela pandemia de coronavírus no mundo — mais de 300 mil pessoas já morreram e 16,5 milhões foram infectadas nos Estados Unidos.
Mas ainda há muitas perguntas a serem respondidas ao longo do tempo, como quanto demorará para que toda a população seja imunizada e como os Estados e empresas devem proceder diante de pessoas que se recusarem a tomar a vacina.
Aqui vão algumas pistas.
Americanos com menos de 65 anos e saudáveis podem ser vacinados a partir de abril, segundo o médico Anthony Fauci, à frente do National Institutes of Allergy and Infectious Diseases (NIAID, uma agência de saúde do governo americano).
Já Alex Azar, secretário de Saúde do governo de Donald Trump, prestes a deixar a Casa Branca, previu que entre o “final de fevereiro e março” americanos já terão acesso a vacinas à venda em farmácias e redes de supermercado como CVS e Walmart.
Depois desta primeira etapa envolvendo profissionais de saúde e idosos em casas de repouso, os Estados terão maior autonomia para decidir que segmentos da população priorizar.
Moncef Slaoui, cientista-chefe do programa federal de distribuição de vacinas, a Operação Warp Speed, afirmou na segunda-feira (14/12) que pessoas jovens e saudáveis devem ser os últimos da fila.
Ele acrescentou que pelo menos 70% a 80% das 330 milhões de pessoas que compõem a população dos EUA precisam ser vacinadas para a que imunidade coletiva seja atingida.
Um dos principais desafios nesta operação de guerra contra o coronavírus é a própria produção e distribuição das vacinas.
A Pfizer enviou, nesta primeira leva, 2,9 milhões de doses, que foram distribuídas em várias partes do país.
A primeira delas foi aplicada em uma enfermeira de UTI do Estado de Nova York, na segunda-feira (14).
A empresa planeja ter vacina suficiente para 25 milhões de americanos até fim de 2020, e o suficiente para 50 milhões até março de 2021.
Enquanto isso, os Estados estão correndo para adquirir refrigeradores ultrafrios capazes de armazenar a vacina da Pfizer, que deve ser mantida em -70ºC e é enviada em pacotes de gelo seco.
Os EUA concordaram também em comprar 200 milhões de doses produzidas pela Moderna, cuja aprovação está sendo analisada pela agência sanitária Food and Drug Administration (FDA) e pode sair nas próximas semanas.
Uma vez aprovada, a empresa deverá enviar imediatamente cerca de 6 milhões de doses para 3.285 pontos nos EUA — muito mais locais do que o lançamento inicial da Pfizer.
Ambas as vacinas requerem duas aplicações. Por isso, algumas farmácias e unidades de saúde já estão fazendo registros para que os pacientes sejam lembrados sobre a segunda injeção — para a vacina da Pfizer-BioNTech, três semanas após a primeira dose, e para a Modena, quatro semanas.
A Pfizer, com sede em Nova York, e a empresa alemã BioNTech receberam uma autorização de emergência da FDA depois que testes mostraram uma eficácia de 95% na prevenção de infecções pelo coronavírus.
Na terça-feira (15), a agência informou que a Moderna produziu um medicamento 94% eficaz no combate ao vírus, o que a coloca mais perto de uma aprovação.
A autorização de uso emergencial pela FDA permite que um tratamento seja usado na população mesmo quando estudos sobre segurança e eficácia ainda não tenham sido concluídos. Críticos dizem que este processo é menos rigoroso e tem maior probabilidade de levar a complicações na saúde dos pacientes.
O FDA garante, porém, que monitora de perto os efeitos colaterais das novas vacinas.
Mesmo com o início da distribuição, os fabricantes devem continuar o processo por uma aprovação total, em vez de apenas emergencial.
Especialistas afirmam que a chegada da vacina não significa que a vida voltará ao normal imediatamente.
“Uma vacina complementará as outras ferramentas que temos — não as substituirá”, afirmou Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS).
“Uma vacina por si só não vai acabar com a pandemia.”
Lavar as mãos, manter o distanciamento social e usar máscaras continuarão sendo regra até que um número considerável de pessoas tenham sido vacinadas.
Anthony Fauci afirmou que o relaxamento dessas medidas pode acontecer nos EUA até o outono de 2021 (no hemisfério norte, ou seja, a partir de setembro) ou até que 70% da população dos EUA tenha sido vacinada.
Há preocupação no país sobre o percentual de pessoas dispostas a receber a vacina — uma pesquisa recente da Gallup mostrou que 58% dizem que sim, ante 50% em setembro.
Os ex-presidentes Barack Obama, George W. Bush e Bill Clinton prometeram ser vacinados diante das câmeras, em um esforço para encorajar outros a tomarem a vacina.
Já o atual presidente Donald Trump, derrotado nas urnas em novembro, disse que ainda não está programado para receber a vacina, mas espera fazê-lo “no momento apropriado”. Ele foi diagnosticado com a covid-19 em outubro e se recuperou após tratamento no hospital.
Inicialmente, Trump indicou que funcionários da Casa Branca estariam entre os grupos prioritários a receber a vacina, mas depois tuitou que eles devem recebê-la “um pouco mais tarde, a menos que seja particularmente necessário.”
Os Estados podem tornar a vacinação obrigatória?
De acordo com um caso histórico julgado pela Suprema Corte em 1905, os Estados têm o poder de exigir a vacinação de seus residentes.
O caso Jacobson vs. Massachusetts surgiu durante uma epidemia de varíola em Cambridge, Massachusetts, quando um morador se recusou a receber a vacina.
Na época, o Estado afirmou que todos seus residentes deveriam ser vacinados ou revacinados — caso contrário, pagariam uma multa de US$ 5 (cerca de US$ 150, ou R$ 760, em valores de 2020).
Em sua decisão, a Suprema Corte afirmou que os direitos do indivíduo não superam a necessidade de garantir a segurança coletiva.
Entretanto, um tribunal de Massachusetts decidiu depois que Estados não têm autoridade para impor a injeção e podem apenas emitir multas.
O secretário de Saúde da Pensilvânia disse que não emitirá qualquer mandato, mas um representante do governo da Virgínia afirmou que o Estado está considerando medidas coercitivas.
As empresas privadas nos EUA têm o direito de impor a seus funcionários certas vacinas, dizem os especialistas, mas é improvável que o façam enquanto as vacinas tenham aprovação apenas emergencial — já que podem levar a complicações de saúde.
A Ford Motor e a Kellogg disseram que vão disponibilizar a vacina aos seus funcionários de forma voluntária.
Muitos hospitais e clínicas de saúde requerem vacinação anual contra a gripe, e todos os 50 Estados exigem vacinação das crianças em idade escolar.
Em geral, trabalhadores podem ser dispensados da aplicação de vacinas quando tiverem problemas de saúde que poderiam ser agravados ou, em alguns Estados, se tiverem objeções por motivo religioso.
O governo americano diz que as vacinas compradas com o dinheiro do contribuinte serão gratuitas, mas os pontos de vacinação ainda podem cobrar pela aplicação.
Essa taxa pode ser reembolsada por planos de saúde ou pelos programas Medicaid e Medicare — redes de segurança social para americanos de baixa renda e idosos.
Em julho, o Departamento de Saúde dos EUA anunciou um acordo de US$ 1,95 bilhão (R$ 9,9 bi) para garantir 100 milhões de doses de vacinas da Pfizer.
A Moderna recebeu quase US$ 1 bilhão (R$ 5 bi) do governo americano para pesquisas sobre o coronavírus. A empresa deve receber um adicional de US$ 1,5 bilhão (R$ 7,6 bi) por 100 milhões de doses, de acordo com um acordo assinado em agosto.
Bilhões de dólares também foram prometidos a outras empresas farmacêuticas, caso elas consigam colocar mais vacinas no mercado.
R7