Decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), publicado nesta quarta-feira (15), deixou preocupados dirigentes das universidades federais, que viram no texto a possibilidade de o governo interferir diretamente nas nomeações de cargos para segundo, terceiro e quarto escalões das instituições.
O texto foi publicado na edição de quarta do Diário Oficial da União, mas só entrará em vigor no próximo dia 25 de junho. Entre as alterações feitas pelo decreto estão a transferência da avaliação de escolha de “dirigente máximo de instituição federal de ensino superior”, ou seja, de reitores das federais, da Casa Civil para a Secretaria de Governo.
Atualmente, as indicações apenas dos reitores das federais são encaminhadas pelas instituições ao MEC (Ministério da Educação) e depois para a Casa Civil, que dá a validação final para o nome do escolhido.Na visão de dirigentes universitários ouvidos pela reportagem, o novo texto pode submeter ao crivo do governo também as escolhas da equipe de confiança dentro das universidades, como pró-reitores e diretores de faculdades ou centros de ensino. O texto também fala da dispensa dos profissionais desses cargos.
A partir do novo decreto, as escolhas de pró-reitores ou de diretores de centros de ensino podem ser submetidas ao crivo do ministro-chefe da Secretaria de Governo. Preocupados com uma possível violação de suas autonomias, as procuradorias de institutos federais de educação já analisaram o teor do texto e consideraram que fere a autonomia das instituições.
Reitores ouvidos pela reportagem, que pediram anonimato por medo de represália, dizem que o decreto é preocupante porque poder resultar em pessoas nomeadas pelo Planalto sem afinidade com reitor e comprometer a administração da instituição. O Conif (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica) encaminhou pedido de esclarecimentos para o MEC.
Universidades consultadas pela reportagem informaram que encaminharam o decreto para análise de suas procuradorias para uma avaliação jurídica e técnica. A Andifes (entidade que representa os reitores das universidades federais) informou que também analisa o conteúdo.
Pelo texto do decreto, o ministro titular da pasta, hoje ocupada pelo general Carlos Alberto dos Santos Cruz, poderá “decidir pela conveniência e oportunidade administrativa quanto à liberação ou não das indicações submetidas à sua avaliação”. O prazo máximo para essa tomada de decisão é de dez dias úteis após análise feita pela Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República.
Se o prazo for excedido e não houver manifestação da Secretaria de Governo, “a indicação será considerada aprovada”. A Casa Civil, responsável pela publicação do texto, nega que tenha havido a alteração da competência do presidente da República para nomeação dos reitores.
“Em relação aos demais cargos, o decreto faculta aos dirigentes das universidades e institutos federais de ensino a possibilidade de submeter os indicados à verificação de vida pregressa com base nas informações a serem registradas pelos órgãos de consulta, a saber, Abin e CGU, para auxiliar no processo de escolha dos nomes que irão o compor o quadro funcional de cargos em comissão e funções de confiança da instituição”, disse a pasta por meio de nota divulgada na noite desta quinta-feira (16).
“A submissão ao fluxo proposto pelo decreto é uma opção, que em nada interfere na autonomia das instituições de ensino, mas apenas disponibiliza um instrumento útil à decisão da autoridade”, afirma a Casa Civil.
Mais cedo, o secretário executivo do MEC, Antonio Paulo Vogel, disse que o decreto instituiu uma prática já consolidada. As universidades questionam o fato de não estar muito claro a quem é delegado o poder de nomeações por parte do presidente da República e disseram que aguardam outras normativas até que o texto entre em vigor, daqui a mais de um mês.
Gera dúvidas ainda o fato de haver no decreto um trecho que diz que “a existência de delegação não afasta a possibilidade de o ato [de nomeação ou de exoneração] ser realizado pelo presidente da República.” O decreto foi publicado no mesmo dia em que estudantes e professores organizaram protestos em pelo menos 170 cidades brasileiras contestando o bloqueio de verbas para a Educação, que paralisou bolsas de pesquisa e outros recursos para universidades e instituições de ensino.
A oposição ao governo vê no texto um ato de retaliação às manifestações e partidos como PSB e PSOL protocolaram decretos legislativos no Congresso para suspender o ato do Executivo.
Bahia Notícias