A recente instituição da Política Estadual de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme foi um importante passo para melhoria no atendimento dessa parcela da população baiana. No entanto, uma das principais medidas previstas – a construção de um centro de referência para tratamento da doença – está encalhada em uma barreira burocrática.
Um prédio localizado na Avenida Centenário deve abrigar a nova unidade. De acordo com o secretário estadual da Saúde, Fábio Vilas-Boas, o espaço foi adquirido pelo governo do Estado, com recursos próprios, por R$ 6 milhões. Outros R$ 7 milhões foram captados junto ao Ministério da Saúde, para reforma e aquisição de equipamentos. O problema é que esse recurso continua nas mãos do governo federal.
O gestor informou, em entrevista ao Bahia Notícias, que o único entrave para a concretização do centro de referência é a liberação por parte da Caixa Econômica Federal (CEF), que indica constantemente, desde janeiro, a necessidade de mais documentos. “Não há uma boa vontade de querer adiantar as coisas, uma celeridade. É um processo burocrático que está se arrastando há um ano”, explicou Vilas-Boas. “A gente tem projeto, recurso, tudo já garantido há mais de dois anos”.
A opinião é compartilhada pelo antropólogo Altair Lira, representante da Associação Baiana de Pessoas com Doença Falciforme (ABADFAL). Para ele, a dificuldade encontrada no andamento do processo pode ser classificada como racismo institucional. “Quando falamos em racismo institucional, estamos falando de uma ação ou omissão de um ente para transformação de determinada realidade envolvendo a população negra. Por exemplo, quando foi lançada uma portaria para organização da assistência religiosa nos hospitais é porque se percebeu que algumas religiões tinham trânsito dentro dos hospitais, enquanto outras não. No caso, se tratavam de religiões de matriz africana. É uma compreensão de que o Estado, ao permitir determinada religião e não permitir outras, age com racismo”, comparou.
A ABADFAL estima que, na Bahia, há mais de 10 mil pessoas com doença falciforme, distribuídas em todos os municípios do estado, com maior incidência em Salvador e Recôncavo Baiano. De origem genética e com predominância entre a população negra, a doença falciforme se caracteriza por um defeito observado na estrutura das hemácias, que assumem um formato de foice. Lira argumenta que a enfermidade foi descoberta em 1910, mas apenas em 2005 o Brasil instituiu a primeira política pública voltada ao seu tratamento. Já a Bahia, estado com maior incidência, só efetivou a medida neste ano. “É um século sem assistência a essa doença, então não dá para demorar mais um século para liberar os recursos. Quanto mais se protela, mais se colabora para essa desassistência”, ressaltou.
A Caixa informou, em nota, que o recurso somente será passível de liberação após o atendimento de pendências do projeto de engenharia e titularidade da área de intervenção. Até o momento, segundo a instituição, apenas o quesito sobre o licenciamento ambiental foi plenamente atendido. A Caixa ressaltou que, legalmente, só poderá ser publicado edital de licitação após a emissão do laudo de análise de engenharia. O contrato de repasse foi celebrado, em 29 de dezembro de 2017, com a Fundação de Hematologia e Hemoterapia da Bahia, à qual será vinculado o centro estadual.
Bahia Notícias