Em 1988 Edson Gomes fincou, de uma vez por todas, as raízes em mentes e corações com o disco Reggae Resistência, seu LP de estreia, com um som vindo do recôncavo baiano que remetia à música de outro homem negro de longos cabelos trançados e, que como Edson, cantava o amor e contra mazelas da sociedade: Bob Marley.
A carreira do baiano havia começado 15 anos antes, na cidade de Cachoeira. E é essa conta que faz Edson Gomes celebrar em 2022, aos 66 anos, os seus 50 anos de carreira como o reggae-man que virou sinônimo do gênero musical no nordeste brasileiro.
Dono de hits como “Árvore”, “Camelô”, “Liberdade” e “Malandrinha”, Edson Gomes moldou gerações e carrega uma legião de fãs por todo país.
Mas por pouco, a música não perdeu a voz questionadora de Edson para o futebol. Atuando como meia, Edson mostrava talento nos campos de Cachoeira. Na vitrola, Tim Maia e Renato e Seus Blue Caps eram quem mais chamavam sua atenção. Ele dividiu paixões até os 16 anos, quando viu sinais de que a música seria a primeira opção.
Cantor de chuveiro, Edson recebeu elogios de um vizinho, que confeccionava violões. O apreço do homem ao seu timbre foi o empurrão que Edson precisava para soltar a voz nos palcos. No ano seguinte, ele cantou no festival da Colégio Estadual de Cachoeira e ficou com o primeiro lugar. Nascia uma carreira de sucesso e, pela primeira vez na cidade, o ‘Tim Maia de Cachoeira’ era premiado.
Edson seguiu cantando e vencendo festivais no estado. No começo dos anos 80 morou em São Paulo, onde trabalhou na construção civil mas, em seguida, retornou para a Bahia. Em 1983 trabalhou em Cachoeira, em uma fábrica de celulose. Após nove meses veio a demissão que o jogaria de vez na música.
Ele retomou a carreira cantando no recôncavo. É também nesse período que o caminho de Edson Gomes cruza com uma amizade que seria determinante na sua história: Nengo Vieira.
”Quando a gente se encontrou, foi que nem o chiclete e a boca, não se desgrudou mais.”’
Parceria de quase quatro décadas
Mesmo nascidos em Cachoeira, Nengo e Edson se tornaram amigos em um evento em Salvador, o Canta Bahia. Para Nengo, a Edson trouxe a genialidade da composição para sua musicalidade, o que faz da dupla dois troncos do reggae.
O músico diz ainda que quando o conheceu, Edson fazia reggae sem saber do que se tratava, em referências ou inspiração. Apaixonado por reggae, Nengo apresentou o ritmo a Edson. A parceria de quase quatro décadas seria fundamental para emoldurar o trabalho de Edson.
”Eu falei: Edson, a sua música é reggae, negão (..) Ele é tão autêntico, tão original, que ele nem sabia que a música dele era essa. Ele não tem influência. A melodia dele é a melodia de Edson. Quando você ouve uma música de Edson, não tem como não identificar.”
E a música de Edson Gomes surgia sem maiores dificuldades. Em pedaços de papelão, ele escrevia algumas composições. Em 1985, ele gravou o primeiro compacto após vencer um novo festival.
A relação dos cantores perpassou o profissional e se tornou como uma irmandade para Nengo. Ele foi parceiro musical de Tin Tim Gomes, irmão de Edson e estará presente na comemoração dos 50 anos de carreira.
”Me sinto muito honrado em poder falar sobre Edson, esse cara único que sempre trouxe a verdade em forma de arte”, conta.
Em 1986, em Salvador, Edson venceu, como melhor interprete, o Troféu Caymmi, um dos mais tradicionais do estado. A partir daí, vem a produção do primeiro disco. Em 1988, Edson Gomes entrou nos estúdio WR, de Wesley Rangel, o mesmo que seria responsável pelo nascimento do Axé Music e do Samba Reggae no estado.
Nascia o disco Reggae Resistência. A partir dali, as palavras de Edson Gomes adentraram como hinos nas casas de centenas de famílias baianas, especialmente as da periferia.
Mais do que letras de amor e com conscientização social, Edson Gomes traz em suas letras ensinamentos. O cantor foi responsável por levar nas suas letras assuntos que dificilmente a periferia aprenderia em sala de aula, como a vitória da Etiópia na guerra contra a Itália do fascista Mussolini.
Nengo Vieira destaca que esse tipo de músicas de protestos colocaram nos holofotes problemas de uma camada da sociedade excluída e silenciada e que por isso, o reggae passou a ser marginalizado.
”O reggae é um elemento que entrou na brincadeira da música como uma pedra no sapato de um gigante, por sempre falar sobre coisas que confrontam. A música de Edson ”Barrados” é uma metáfora. Barrados no baile é o proletariado, o preto, o pobre. Quem nunca é ”bonito” o suficiente para entrar na festa”, lembra.
Crítico do “sistema”, Edson Gomes se diz um pensador solitário e recusa rótulos. Avesso à entrevistas, diz que sua música não é política e critica o que chama de proibição do pensamento.
“Hoje em dia você não pode mais dizer o que você quer dizer, não pode pensar, lógico que você tem que respeitar, mas hoje em dia você não pode mais dizer”, disse Edson em entrevista ao cantor da banda Adão Negro, Serginho, que apresenta o podcast BahiaCast. O programa é umas das poucas oportunidades, onde é possível ouvir o que pensa Edson Gomes para além de suas composições.
Além de um legado de sucessos musicais, Edson Gomes conta com parceria dos filhos Isaac e Jeremias, que também seguem a carreira musical.
Inspiração Edson Gomes
O topógrafo baiano Oldair Sena, de 54 anos, cresceu na cidade de Itajuípe, no sul da Bahia, e considera que foi marcado pela música de Edson Gomes por descrever sua realidade.
”Na nossa adolescência tinha Bob [Marley], mas as músicas não tocavam o coração porque não entendíamos o idioma. Quando veio Edson, a gente entendia que ele estava falando de amor, resistência e coisas do nosso cotidiano.”
Edson tornou-se inspiração para Oldair e um grupo de amigos. Inspirados na música “Cão de Raça” que fala sobre as dificuldade que o povo, o topógrafo e seus amigos criaram um grupo de ajuda à comunidade carentes no sul da Bahia em 1987.
”Nós criamos um grupo ‘Cães de Raça’. Fazíamos coletas de alimentos, ajudávamos na vacinação de crianças nos postos, distribuição de brinquedos.”
A inspiração é tanta que Oldair decidiu tatuar na pele um verso de Edson Gomes da música “Escola”, que para o topógrafo diz muito sobre o passado de seu povo: ”Viemos na fúria do mar, vivemos na fúria do mandar”.
Celebração no palco
Neste sábado, Edson Gomes celebra os 50 anos de carreira com um show no WET, em Salvador. Além dele, a noite ainda vai contar com a apresentação da atração internacional, Steel Pulse, além de Nengo Vieira e Diamba.
Os ingressos para Arena Tin Tim Gomes e Lounge Malandrinha estão disponíveis, no Pida Piedade, Liberdade e Salvador Shopping, na loja Bora Tickets (Shopping da Bahia), ou através do site.
SERVIÇO:
- O que: Edson Gomes – 50 anos de carreira
- Quando: 21 de maio
- Onde: WET, Paralela
- Hora: a partir das 21 horas
- Atrações: Edson Gomes, Steel Pulse, Nengo Vieira e Diamba.
- Ingressos: Arena Tin Tim Gomes e Lounge Malandrinha.
- Vendas: loja Bora Tickets (Shopping da Bahia), loja do Pida Piedade, Liberdade Salvador Shopping, ou através do site boratickets.com.br.
- Mais informações: @boratickets
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