Do rico bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, ao pobre bairro de São Miguel Paulista, na zona leste, colégios eleitorais se encheram neste domingo (7) para escolher os novos conselheiros tutelares da cidade. A mobilização, que começou a internet nas últimas semanas, foi chamada por alguns votantes de “efeito Bolsonaro”: a polarização do país chegou até os Conselhos Tutelares, com campanhas para eleger conselheiros conservadores ou progressistas. Os Conselhos Tutelares são responsáveis por zelar pelos direitos das crianças e dos adolescentes. Os eleitos neste domingo terão mandato de quatro anos. Até a publicação deste texto, o comparecimento às urnas não havia sido divulgado, mas, na avaliação do poder público e dos votantes, a mobilização foi mais significativa neste ano do que na eleição extemporânea de 2016, a mais recente, quando votaram 113 mil pessoas. O prefeito Bruno Covas (PSDB) votou em um colégio na Vila Madalena, zona oeste da cidade. Para ele, a polarização “acontece porque você tem não somente lideranças comunitárias participando, mas também partidos políticos envolvidos, igrejas”. “É normal e natural que você tenha movimentos organizados a cada vez que você tem um papel mais importante a ser destacado”, afirmou. “A eleição do Conselho Tutelar vem ganhando força a cada ciclo, a gente vê a mobilização, a quantidade de pessoas vindo votar. Eu, pelo menos, estou achando [que há] mais gente do que quatro anos atrás [na última eleição]”, disse o prefeito. A analista de recursos humanos Rita Ventura, 50, concorda. “A eleição é extremamente importante nessa situação em que o país está.” Ela foi votar com sua irmã, Renata Ventura, 49, que trabalha com educação de crianças em uma ONG. “Tem que ser gente que tem conhecimento do trabalho com crianças. Houve uma mobilização muito maior neste ano, onde eu trabalho a gente se mobilizou para vir votar. Votamos em Pinheiros, mas nossa preocupação maior é na periferia”, diz. A 40 quilômetros de lá, em São Miguel Paulista, a escola Darcy Ribeiro também estava cheia. A reportagem viu santinhos de pelo menos quatro chapas espalhados pelo chão. O professor Lúcio Roberto, 30, diz que vê uma mobilização maior desta vez, mas acha que “o pessoal tinha que ser muito mais engajado”. “Eu trabalho com educação, e a gente precisa desse amparo do conselheiro tutelar. Por isso voto em quem é conhecido, quem é atuante na proteção das crianças”, diz. Cláudio Gomes, 52, que está desempregado, é mais enfático: “Vim votar para tirar os evangélicos daqui. É sério o negócio”, disse, aludindo à forte a atuação de grupos religiosos nessas entidades. No bairro da zona leste, a chefe de uma seção disse que uma série de eleitores foram votar com uma lista de nomes sem que soubessem o que aquela votação significava. São Miguel é uma das regiões com o maior número de candidatos, 40. Regiões mais distantes do centro e em geral mais pobres tiveram, em geral, um número muito maior de candidatos. Em Pinheiros, onde o prefeito votou, foram 10 –o que significa que, mesmo quem não ganhou, entra como suplente. A eleição, neste ano, foi feita com assessoria do Tribunal Regional Eleitoral e urna eletrônica em todas as cidades com mais de 300 mil habitantes no estado. O pleito ocorreu de forma unificada em todo o país. Era preciso levar documento de identidade e título de eleitor, o que gerou confusão, já que na eleição geral, basta o RG. Muita gente tentou votar assim. A falta de informações foi uma das principais queixas. O motorista Carlos Henrique, 60, reclamou que “faltou divulgação”. “Só soube no fim dessa semana, num anúncio em um relógio de rua. Agora não dá tempo mais de me cadastrar para votar em uma coisa tão importante”, disse. A reportagem avisou que não era necessário nenhum cadastro, bastava comparecer com os documentos exigidos. “Olha aí, falta informação”, rebateu Carlos. Também houve problemas de logística. Em uma escola na Bela Vista, na região central da cidade, cidadãos reclamaram que as urnas estavam no segundo andar do edifício e que idosos e pessoas com baixa mobilidade não puderam votar, por problemas de acessibilidade. O pleito ocorre a cada quatro anos. Em 2015, a eleição em São Paulo foi suspensa após denúncias de problemas com o sistema de votação eletrônica. Uma nova eleição foi convocada para o início do ano seguinte, dessa vez com cédulas em papel. Houve improviso e até caixas de sapato e de sabão em pó fizeram as vezes das urnas. Neste ano, não houve denúncias graves de irregularidades, segundo a promotora Fernanda Beatriz Gil da Silva Lopes, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Infância e Juventude e Idoso. No interior, houve registros de boca de urna e de transporte irregular de eleitores. Esses crimes não estão sujeitos às penalidades da lei eleitoral, mas de leis municipais.Esses casos serão investigados, e os candidatos podem perder seus mandatos, caso sejam eleitos, diz Lopes. “A gente estima que por volta de 10% dos eleitores compareceram, um número expressivo para uma votação local”. A secretária Municipal de Direitos Humanos, Berenice Giannella, afirmou que recebeu uma lista de candidatos a se votar com o logo da prefeitura no topo. Ela disse que avisou o Ministério Público assim que soube do caso, e divulgou comunicado afirmando que a prefeitura não apoiava nenhuma candidatura.
Folhapress