Durante quase quatro horas, uma adolescente de 13 anos foi submetida a uma sessão de tortura que envolveu facadas, socos e pauladas em Trindade (GO). A vítima teve o aparelho ortodôntico arrancado da boca com faca, além de ser obrigada a cavar uma cova, onde seria sepultada por suas algozes. O que mais chocou a polícia foi o fato de as agressões terem sido cometidas por quatro adolescentes, supostamente por ciúmes.
Segundo a polícia, as garotas não demonstraram arrependimento e contaram detalhes do crime com frieza. Para a psicanalista especialista em psicopatia Júlia Barany, a ideia de cometer o crime pode ter sido de apenas uma garota, mas as demais foram seduzidas pelo “efeito manada”, que é um caso de atração grupal.
— Muitas vezes na história, um líder leva todo um grupo ou povo a uma alucinação coletiva. Hitler e outros líderes fizeram isso, assim como algumas gangues também. Um dominador leva o resto a fazer o que cada um individualmente jamais faria. É um fenômeno psicológico.
De acordo com a psicanalista, nesse estado de dominação do mais forte, o mais fraco não tem como se defender. Ele teme por sua própria sobrevivência e, como está dentro da dominação, não tem capacidade de discernimento.
— É como se consciência ficasse em segundo plano. A pessoa não tem necessariamente um distúrbio de personalidade. Ela é apenas dominada.
O psicólogo e professor do departamento de psicologia social da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Helio Deliberador, concorda com a psicanalista, e acredita que a influência tem proporção ainda maior por serem adolescentes.
— O que acontece é que nessa idade elas são muito influenciadas por lideranças negativas, de quem alguém mais ousado que protagoniza o papel de chefe do bando e os outros fazem. Nessa fase, eles ainda estão em formação.
De acordo com o professor, crianças e adolescentes que cometem crimes violentos geralmente viveram rejeição dos pais e têm famílias desestruturadas para poder tratar o outro de maneira tão cruel.
— Muitas vezes, essas crianças assistiram às situações em que os adultos foram violentos. Elas podem agir de forma perversa e se tornar pessoas sem sentimento.
Toda a sessão de tortura foi filmada e o vídeo seria assistido durante a comemoração pela morte da vítima. Segundo Deliberador, este ato é bastante comum, principalmente, entre os mais jovens.
— Isso reproduz um pouco a sociedade do espetáculo em que vivemos, em que tudo para ser verdade tem que ter imagem e ser submetido ao coletivo.
Recuperação?
Durante entrevista à Rede Record, a mãe da vítima afirmou ter medo de quando as adolescentes saírem da internação. Por serem menores de 18 anos, elas só podem ficar até três anos em centros socioeducativos. Segundo ela, as adolescentes podem sair do local “ainda piores e matar por qualquer coisa”.
O professor acredita que, caso tenham um bom atendimento, as suspeitas podem se recuperar e conviver bem em sociedade.
— Tem que ter tratamento digno e sério para essas pessoas, como psicoterapia grupal. [Desta forma], será possível resgatá-las para a vida social regular, com respeito às regras de convivência.
Já a psicanalista faz ressalvas:
— Se elas forem psicopatas, não têm conserto. Elas vão continuar sendo o que são hoje e vão reincidir. Uma das características do psicopata é que ele não para de fazer o que faz, a não ser que seja preso ou impedido. Se nenhuma for psicopata, é possível que elas se deem conta do que fizeram.
Para a especialista, exames para detectar transtornos mentais deveriam ser feitos em todos os suspeitos de crimes violentos e critica o sistema judiciário brasileiro.
— Há testes, como o mapeamento do cérebro em funcionamento, para saber se alguém é psicopata. Mas só é usado quando o suspeito mata. Ou seja, tem que esperar matar alguém para ser retirado da sociedade. O correto seria examinar todos para descobrir.
R7