Muito se fala sobre a alimentação saudável proteger contra câncer. Mas, afinal, quais são os poderes desses alimentos para evitar a mutação e multiplicação errada de células, a principal característica de um câncer? Para uma célula se cancerizar, há muitos fatores envolvidos, mas os alimentos podem, sim, ser ótimos aliados na prevenção.
O oncologista Davi Liu, da Clínica Fares, explica que existem causas do câncer que independem do estilo de vida da pessoa, como genética, hereditariedade e, no caso do câncer de mama, ser mulher já é um fator de risco. No entanto, ele ressalta que o sedentarismo e a obesidade são dois fatores diretamente relacionados ao desenvolvimento da doença.
“Certamente quem come mal vai ter mais chance de desenvolver câncer”, explica.
E até mesmo em casos genéticos, Liu conta que uma boa alimentação pode ser protetora. “Existem genes ativadores do câncer. O ambiente em que se vive pode ou não ativar genes que causam tumores ao longo da vida.”
Além disso, ele explica que a alimentação correta também protege contra outras doenças, como hipertensão, colesterol alto, diabetes e outros problemas cardiovasculares. Ou seja, quem se protege contra o câncer também é mais saudável em outras partes da vida.
De acordo com o nutrólogo Roberto Navarro, a ciência hoje tem um olhar voltado aos padrões alimentares.
“Analisaram durante décadas as estatísticas de doenças de uma região, como câncer, doenças cardíacas e degenerativas, e aí se descobriu que uma alimentação mais rica em antioxidantes, gorduras boas e fibras têm uma correlação com menor incidência de determinados tipos de câncer”, explica.
Mas afinal, o que provoca as mutações?
Navarro explica que existe um mecanismo dentro das nossas células onde está o DNA. “O DNA é uma ‘fabriqueta’ dentro das células, que carrega todas as informações que ela precisa para se auto multiplicar. Toda vez que uma célula velha se divide para formar uma nova, o DNA vai junto. O corpo faz uma cópia do DNA para reproduzir uma nova célula, e assim acontece durante toda a vida”, explica.
Pelo fato de toda célula precisar se dividir em duas antes de morrer, todo o código genético vai para a célula nova, a cópia. E é aí que pode morar o problema.
“Há evidências que na hora de tirar a cópia do DNA e formar uma nova célula, existem fatores que fazem com que ela seja copiada errada e sofra alteração na sequência do DNA, de modo com que ela seja reestruturada errada. Isso é a mutação que causa o câncer”, explica Navarro.
Com as agressões do dia a dia, seja por alimentação errada ou exposição a agentes tóxicos, o organismo luta para evitar as mutações e lança mão de vários mecanismos para proteger o DNA.
Letícia Fontes, nutróloga da Clínica MEI, explica que é fato que uma alimentação muito rica em produtos industrializados, com muitos conservantes, corantes e açúcar refinado pode predispor ao câncer.
Fígado guerreiro
Quando uma toxina potencialmente cancerígena cai no sangue, o corpo tenta anular essa ação.
“O fígado tem capacidade de absorver e modificar a estrutura física dessa substância e fazer com que ela volte para o sangue de forma a ser excretada. Porém, para o fígado fazer esse trabalho, ele precisa de nutrientes.”
E é da alimentação que vem o combustível para esse órgão vital trabalhar. As vitaminas A, C e E são essenciais nesse processo. “Há também os compostos sulfidrílicos ou enxofrados, que são fundamentais para detoxificar, como cebola, alho, brócolis, couve flor, couve manteiga. É por isso que o suco verde passou a fazer sucesso”, explica o nutrólogo.
Quando o fígado não dá conta de mandar todas as substâncias tóxicas embora e elas caem no sangue, é a vez dos antioxidantes entrarem em cena.
Antioxidantes faxineiros
Superpoderosos, eles são realmente eficazes ao evitar mutações. “Os antioxidantes diminuem o ataque dos radicais livres, que são as substâncias formadas dentro das células e que têm o poder de atacar o DNA, podendo favorecer as mutações”, explica Navarro.
Há um aumento desses radicais livres quando o organismo é exposto a agentes tóxicos. Neles estão inclusos o cigarro, as químicas ambientais, os agrotóxicos e até o excesso de sol. Além disso, uma dieta rica em açúcar e gordura animal aumenta a chance de produção de radicais livres. “Quem faz uma alimentação melhor e com alimentos mais naturais, tem risco menor.”
São as especiarias que estão no topo da lista de alimentos com mais antioxidantes. O cravo-da-índia, por exemplo, foi o campeão, seguido da cúrcuma, orégano, cominho, canela, entre outros.
“Essas especiarias têm compostos bioativos, que têm poder antioxidante muito maior do que as vitaminas”, explica Navarro.
As vitaminas e outros compostos excelentes para proteger as células dos radicais livres são vitamina A, C e E, zinco, cobre e selênio.
“São os mais potentes antioxidantes, então todos os alimentos fontes deles traz uma boa proteção”, recomenda o nutrólogo.
Compostos bioativos que protegem o intestino
Os flavonoides e polifenóis, que são classificados como compostos bioativos por não se enquadrarem como vitaminas ou minerais, são encontrados principalmente nos vegetais.
“As substâncias que dão cor aos alimentos, como a antocianina, o licopeno – que é o que dá a cor mais avermelhada aos alimentos”, conta. Nesse grupo também entra o resveratrol, composto tão famoso presente no vinho, nas uvas e no mirtillo.
Além de antioxidante, Navarro explica que há evidências de que alguns compostos bioativos vão impedir a absorção de substâncias tóxicas (e potencialmente cancerígenas) pelo intestino.
“O resveratrol, por exemplo, diminui um pouco a absorção de metais pesados, impedindo que entre tanto no corpo.” A uva roxa – tanto a casca quanto a polpa – é rica nesse composto.
Queijos envelhecidos, cogumelos, nozes e algumas leguminosa (como ervilha, lentilha e grão-de-bico) contêm um composto bioativo chamado espermidina. “Essa substância ajuda o fígado a excretar toxinas”, diz Navarro.
Ademais, o chá verde carrega polifenóis, que são excelentes antioxidantes. “Parece que tem correlação com menor taxa de câncer de estômago”, explica o nutrólogo.
Fibras do bem
As fibras também têm um ótimo papel na proteção contra o câncer. “A fibra dos vegetais prende um pouquinho os produtos tóxicos que estão no intestino e impede um pouco a absorção dessa toxina”, explica Navarro.
“A fibra fica na frente da mucosa intestinal, diminuindo o contato da toxina com a mucosa”, explica. Com isso, o fígado tem de lidar com menos produtos tóxicos, e a chance de anular o efeito deles, por ser em menor quantidade, é maior.
A nutróloga Letícia Fontes explica que uma alimentação saudável é fundamental.
“É um equilíbrio entre alimentação e estilo de vida. Não dá para viver com essa neura, de que não pode comer isso ou aquilo porque vai dar câncer. Não é bem assim. Um alimento específico, quando consumido uma vez só, não vai causar câncer. O descuido, a falta de alimentação boa sim, a longo prazo, pode provocar a doença”, conclui.
R7