Alguns pacientes de covid-19 permanecem com dor, mesmo após a cura da doença. O neurologista Daniel Ciampi, do Hospital das Clínicas, especialista em dores crônicas, explica que a dor após a infecção pode ser de três tipos diferentes: a covid-19 pode piorar uma dor crônica que o paciente já tinha, o próprio vírus pode causar uma inflamação no músculo e o paciente pode ter dor devido aos procedimentos necessários para o tratamento, como internação, sedação, intubação e utilização de bloqueadores musculares.
“Cerca de 20% da população tem dor crônica, ou seja, cerca de um quinto a um quarto dos pacientes podem ter a dor agravada, pode ser a enxaqueca, lombalgia [dor na lombar], fibromialgia [dor muscular generalizada].”
Segundo o neurologista, ainda não se sabe por quanto tempo a dor após a covid-19 pode perdurar. Estudos preliminares feitos em países nos quais o pico de contaminação foi em março mostraram que em julho alguns pacientes ainda sentiam dores.
“Pode perdurar meses e isso não é raro. Temos estudos com outras infecções que também causam dores por períodos prolongados. Na chikungunya, por exemplo, 15% dos pacientes podem desenvolver dores crônicas.”
Uma pesquisa da USP (Universidade de São Paulo) sobre dores causadas pela covid-19 está avaliando os pacientes com a doença que foram internados em UTI e pacientes de outras doenças que foram internados na mesma UTI, sob as mesmas condições e medicações.
“Não há nenhum outro trabalho similar a esse. Ter essa avaliação também dos pacientes que não pegaram o coronavírus vai possibilitar verificarmos o que realmente é consequência da covid-19 e o que é decorrente da própria internação.”
O estudo já está analisando 150 pacientes e dados preliminares devem sair até novembro.
Ciampi acrescenta que a intensidade da dor varia muito de paciente para paciente, segundo ele, cerca de 15% a 20% dos infectados sentem dores fortíssimas.
O neurologista explica que o tratamento varia para o tipo de dor que o paciente sente. Dores neuropáticas são tratadas com medicação e podem ser um efeito direto do coronavírus.
Dores de fadiga muscular, quando acontece no corpo inteiro e é acompanhada de cansaço, é tratada com analgésicos, fisioterapia e atividade física. “O mais intuitivo é que a pessoa que está com dor fique em repouso, mas isso é catastrófico. Com o repouso, se perde condicionamento físico, perde elasticidade, aumenta o risco de ficar deprimido, de ganhar peso, tudo isso pode aumentar a dor.”
Por último, a dor musculoesquelética, mais localizada em articulações ou membros específicos, como nas pernas, pode ser tratada com analgésico e meios físicos, que incluem fisioterapia analgésica, acupuntura, ventosas, hidroterapia e massagem.
“O melhor tratamento é de longe a combinação de um pouco de analgésico com os meios físicos e a atividade física.”
O médico explica que as ventosas são um procedimento dolorido, que gera um fenômeno chamado contrairritação. “É uma experiência que todo mundo já teve. Você está com uma dor no pé, por exemplo, aí machuca a mão e a dor no pé some ou diminui de intensidade. As pessoas acham que é por conta da atenção, mas é um outro mecanismo.”
Segundo Ciampi, um grupo de células cerebrais são ativadas quando se tem uma dor, que libera substâncias que inibem outras dores. “Elas ficam na base do cérebro e se alongam até a medula. Quando as ventosas provocam dor, elas liberam várias substâncias inibidoras da dor, o que ajuda com outras dores no corpo.”
A acupuntura possui um mecanismo parecido, mas, além de provocar a contrairritação, a agulha também ajuda a relaxar possíveis contraturas musculares locais. A massagem também possui essa função de relaxar a musculatura local.
Já a hidroterapia funciona por meio da mudança de temperatura no local da dor. A pessoa é submersa em água quente, o que faz com que os nervos locais, que disparam a informação da dor para o cérebro, diminuam sua atividade.
O neurologista afirma que a mudança de temperatura para frio é mais utilizada quando existe uma inflamação local.
R7