Com o aumento do fluxo de imigrantes venezuelanos este ano para o Brasil, o município de Pacaraima (RR), que faz fronteira com o país vizinho, passou a enfrentar o problema da superlotação nas salas de aula.
O sistema de educação pública da cidade atendeu 1.338 alunos em 2017, entre brasileiros e venezuelanos nas três escolas da sede. Este ano, a rede municipal atingiu o número de 2.030 estudantes matriculados da creche até o 6º ano do Ensino Fundamental I, sendo que 530 são estrangeiros.
Em março deste ano, o secretário municipal de Educação, Agamenon Rodrigues encaminhou um relatório ao MEC apontando a situação e pedindo medidas emergenciais, mas, segundo ele, não foi atendido até o momento.
“Se a gente não tiver ajuda, vamos ter um colapso na educação do município. Hoje a gente não atende mais devido à falta de espaços nas escolas. A creche hoje era para atender 120 alunos, nós estamos atendendo 280. Fizemos adequações em algumas salas para poder atender esses alunos. Da mesma forma as outras escolas estão com as salas superlotadas”, afirmou Rodrigues em entrevista à Agência Brasil.
O documento foi entregue novamente ao MEC ontem (21) ao secretário executivo adjunto da pasta, Felipe Sigollo, que esteve no município como parte da equipe interministerial que visitou o município de Pacaraima e se reuniu com atividades locais e agentes sociais para avaliar a situação e colher a situação sobre os migrantes venezuelanos.
No último sábado (18), moradores do município expulsaram venezuelanos de barracas e abrigos e atearam fogo a seus pertences, em um princípio de revolta contra a presença deles na cidade.
Rede municipal de educação
A rede municipal de ensino de Pacaraima é formada por oito escolas, sendo que cinco delas atendem às comunidades indígenas e três concentram o fluxo urbano de estudantes na sede do município.
A Escola Municipal Casimiro de Abreu, que atende do 3º ao 6º ano do ensino fundamental, conta com uma estrutura de 12 salas de aula com capacidade para atender 600 alunos, estava com 689 alunos matriculados em março deste ano, sendo 211 venezuelanos. A Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental Alcides da Conceição Lima, que atende as etapas da pré-escola II ao 2º ano do Ensino Fundamental I estava com 62 alunos acima de sua capacidade: 566 alunos matriculados sendo 134 venezuelanos.
A Creche Municipal Jessyca Christine Carvalho da Cruz, que atende as etapas de creche e pré-escola I e II com capacidade para 120 alunos, estava em março com 263 alunos matriculados sendo 70 venezuelanos. As escolas atendem nos dois turnos, matutino e vespertino, com 2030 alunos matriculados.
O recurso que a secretaria recebe é destinado a alunos brasileiros e venezuelanos documentados e cadastrados no censo de 2017 e não contempla o aumento da demanda em 2018. O município não trabalha com listas de espera e tanto alunos brasileiros quanto venezuelanos estão aptos para fazer inscrição no momento de abertura das matrículas.
O documento entregue ao MEC apresenta uma série de opções para atender o aumento da demanda de estudantes no município: construção de creche, adaptação nas escolas municipais da sede, contêineres e aluguel de prédios particulares além da compra de material didático , pedagógico, alimentação e transporte escolar. O município também pediu a antecipação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) referente a 2018.
“Hoje, se a gente tivesse espaço e qualquer construção ou se tivesse contêineres, qualquer coisa, a gente atenderia mil alunos da migração. A demanda seria mil alunos. Então a gente fez relatórios, enviamos para o MEC mas até o presente momento não tivemos nenhuma resposta”, afirmou o secretário municipal de Pacaraima.
Por fazer divisa com a cidade venezuelana de Santa Elena de Uairén, nas escolas do município de Pacaraima 90% dos professores falam espanhol, que também é uma disciplina da grade curricular das escolas. O secretário municipal estima que nas turmas de educação infantil na faixa de 3 a 5 anos o número de venezuelanos chegue a 60% em relação aos brasileiros.
“A gente não atende porque não temos vagas nas escolas. E os que chegaram, que a gente pode atender da melhor forma, a gente acolheu. Então, o município tem acolhido independente da nacionalidade, a gente tem atendido todos os alunos e a gente tem feito trabalho nas escolas, onde a gestão, os professores e os alunos aceitam de bom modo todos esses alunos”, afirmou o secretário de Pacaraima.
Adaptação
Uma das dificuldades encontradas pelos alunos estrangeiros para ingressar no ensino municipal de Pacaraima é o custo da tradução juramentada da documentação escolar. Com o aumento do fluxo migratório, a secretaria abriu mão dessa exigência para que os estudantes estrangeiros pudessem ser acolhidos nas escolas.
“Eles chegam lá e muitas vezes estudaram um período, que é diferente no Brasil em relação à Venezuela. A maioria não tem condições de fazer a tradução e o município abriu o leque. A gente recebe, faz uma análise e uma prova de classificação pra saber em que nível esses alunos estão pra poder cursar no Brasil”, afirma Rodrigues.
Para ingressar na rede municipal de educação de Pacaraima, os estudantes venezuelanos passam por uma avaliação de adaptação ou reclassificação em qualquer época do período letivo considerando o documento apresentado pelo aluno e seu desenvolvimento ou na série correspondente. A matrícula do aluno estrangeiro pode ser feita em qualquer época do ano ou período letivo a ser cursado de imediato desde que esteja garantida a possibilidade de cumprimento dos critérios mínimos de carga horária, dias letivos e frequência estipulados pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96).
Transporte escolar
Entre os pedidos apontados no documento entregue em março deste ano ao MEC, o município de Pacaraima pede a aquisição de 10 ônibus escolares. Hoje a cidade possui quatro veículos para esse objetivo, sendo que dois atendem às comunidades indígenas e dois fazem o transporte dos estudantes urbanos, o que inclui o transporte dos alunos que residem em Santa Elena de Uairén. Anualmente, a Secretaria aluga mais quatro veículos para auxiliar nesse transporte.
Após o episódio de violência contra os venezuelanos neste sábado, o prefeito de Paracarima, Juliano Torquato (PRB) cancelou temporariamente o transporte de cerca de 300 alunos brasileiros e venezuelanos residentes em Santa Elena.
“Saiu muito áudio dizendo que queimaram os carros brasileiros que entrassem na Venezuela. Ficamos com medo pela integridade física dos alunos”, afirmou o secretário municipal Agamenon Rodrigues em entrevista à Agência Brasil.
Após uma reunião com a prefeitura ontem, ficou definido que os ônibus escolares voltarão a buscar normalmente os estudantes a partir de hoje (22).
Refúgio
Até junho deste ano 24.356 venezuelanos pediram refúgio no Brasil segundo dados do Ministério da Justiça, o que representa um crescimento de 26,6% em relação ao ano anterior.
Apenas em Roraima, principal acesso dessa população ao país, foram registrados 18.374 pedidos de refúgio no primeiro semestre deste ano, número maior do que o total de pedidos em todo o país registrados em 2017, um total de 17.865.
A Agência Brasil procurou o MEC para comentar os pedidos do município de Pacaraima, mas a pasta não se pronunciou sobre o assunto até a publicação da matéria.
Agência Brasil