Participante dos Jogos de Londres-2012 e do Rio-2016, Fernanda Garay, 34, briga por uma vaga para estar em Tóquio-2020. A presença na seleção brasileira de vôlei é incerta diante da concorrência acirrada, mas não faltam à gaúcha de Porto Alegre vontade e esperança de se garantir na lista do técnico José Roberto Guimarães em seu provável adeus à equipe nacional.
Ela, que completará 35 anos no próximo dia 10, não renovou contrato com o clube Dentil/Praia e anunciou que, após essa temporada com a seleção, vai dar pausa na carreira para ser mãe.
“A gravidez dura nove meses, imagino que é um dos momentos mais difíceis e desejo que todas as mulheres possam vivenciá-la de uma forma especial. Passado a gravidez, é uma outra etapa, a de criar e formar uma criança, um ser humano”, diz Garay à reportagem.
Desde 14 de abril, a atleta está confinada com as demais convocadas no centro de desenvolvimento da Confederação Brasileira de Voleibol (CBV), em Saquarema (RJ). No dia 20 deste mês, a seleção embarca para Rimini, na Itália, onde disputará a Liga das Nações (VNL) entre 25 de maio e 20 de junho.
Depois disso, Guimarães vai apresentar a sua lista com as 12 jogadoras escolhidas para representar o Brasil nos Jogos de Tóquio. Toda essa rotina longe de casa serve de estímulo para a ponteira não querer saber de vôlei tão cedo.
“Como eu faria com uma criança? Não sou mãe, mas me conheço. Tenho saudade da minha mãe, pai, irmãos, marido, cachorro”, diz Fê Garay após o encerramento do período de quatro anos no Praia. “Agora estou focada na seleção. Quero viver o momento com minha família, me dedicar ao projeto de ser mãe.”
Antes de se apresentar à Zé Roberto, Fernanda já havia se hospedado em Saquarema para as semifinais e finais da Superliga, entre 25 março e 5 de abril. O Praia, de Uberlândia, perdeu a decisão para o Itambé/Minas, de Belo Horizonte.
A maternidade tem sido um dos assuntos recorrentes em Saquarema, com dicas e histórias de Camila Brait, Dani Lins, Tandara e Sheilla, jogadoras que tiveram filhos e retomaram a carreira nas quadras.
“Muitas mulheres me contam que a maternidade dá uma força ainda maior, maturidade”, disse a ponteira. “Me dediquei à carreira até aqui, planejo agora vivenciar o momento [de ser mãe] sem voltar com sacrifícios.”
Elogiada por Zé Roberto em live no perfil da CBV, Garay disputa posição com Natália e Gabi, pilares da seleção, além da promissora Ana Cristina, 17 , e Rosamaria, que atua como ponteira e oposta.
“É uma disputa bem acirrada, isso é o que a gente espera de uma seleção”, afirmou a atleta. “Venho de boa Superliga e me sinto bem fisicamente, quero aproveitar ao máximo esse período de treinamento.”
Dona do ponto final que deu o ouro ao Brasil em Londres-2012, na decisão contra os EUA, ela defendeu a seleção desde as categorias de base e se firmou na equipe adulta aos 24 anos –a partir de 2010, quando foi convocada no lugar de Mari, lesionada, para o Mundial no Japão.
Embora rivais pela vaga em Tóquio, Garay tem sido uma das conselheiras de Ana Cristina. Fernanda e Ciça, mãe de Ana, atuaram juntas e são amigas. “Eu a carreguei literalmente no colo, fico aqui babando porque a Ana é talentosa. Eu e minha família somos fãs dela.”
A gaúcha convive com a distância dos parentes desde a adolescência. Ela deu seus primeiros passos no vôlei na escolinha da Sogipa (Sociedade de Ginástica de Porto Alegre). Aos 15 anos, foi convidada para defender o São Caetano.
Em seu portal, há depoimento contando que a mudança para São Paulo foi importante para se valorizar e lidar com dificuldades impostas pela sociedade, como o preconceito racial. “Sofri durante a infância, em quadra não senti nenhuma ofensa. Hoje também tenho muita bagagem e experiência para lidar com essa situação.”
A pandemia e os protestos desencadeados em 2020 após o assassinato de George Floyd por policiais em Minneapolis (EUA), segundo a jogadora, colocaram luz sobre a urgência de combater o racismo.
“A gente deu um passo nessa luta na pandemia e, infelizmente, também pelo que ocorreu nos Estados Unidos. Trouxeram olhares do mundo inteiro para o quanto precisamos melhorar”, diz a ponteira.
“Essa necessidade de distanciamento social é uma oportunidade de reflexão, crescimento. Podemos, sim, ter mais empatia, porque essa doença nos ensinou que não é [necessário] cuidado só para conosco, mas com todos.”
Bahia Notícias