Neste sábado (27), a tragédia de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, completa cinco anos. Naquela madrugada acontecia uma festa universitária na Boate Kiss e, no palco, se apresentava a banda Gurizada Fandangueira.
Em determinado momento, um dos integrantes disparou um artefato pirotécnico, atingindo parte do teto do prédio, que logo pegou fogo. O incêndio causou a morte de 242 pessoas e deixou 636 feridos.
Foi instaurado meses depois o processo para solucionar a causa do incêndio e, como consequência, punir os envolvidos. No entanto, o processo segue em andamento na Justiça e os quatro réus aguardam o julgamento em liberdade. “É bem triste saber que a vida não vale nada”, afirma o presidente da AVTSM (Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria) Sérgio da Silva. “É uma grande moralidade da Justiça de Santa Maria. É uma desvalorização da vida humana, do respeito às pessoas.”
O presidente da associação acredita que o Ministério Público do Rio Grande do Sul seja o maior culpado pela dificuldade de solucionar o caso – a primeira audiência foi registrada no dia 26 de junho de 2013. “Se hoje o processo está assim, é culpa do Ministério Público, que retirou a queixa contra vários funcionários públicos, que banalizou as punições desses agentes. Eles estão fazendo um trabalho mal feito”, diz.
O juiz da 1° Vara Criminal de Santa Maria Ulysses Louzada em entrevista ao R7reconhece que o processo “leva um tempo maior do que outros porque é bem complexo”. “Não adianta acelerar e faltar com qualidade na resposta”, pondera. Louzada acredita que o “litígio está correndo de forma séria e efetiva”.
Na época, a tragédia teve uma comoção popular muito grande e todos esperam pela solução do caso, não somente a associação. “Eu não posso me contaminar por questões pessoais porque é minha profissão. Eu não posso deixar me levar pela opinião pública. Eu sou técnico. Trabalho de acordo com a lei e assim a sigo”, afirma Louzada.
Louzada, que tem 27 anos de profissão, admite não ter um data final para a solução do caso. “Não existe um prazo. Pode levar ou não mais tempo. Depende de toda uma estrutura”. O juiz afirma que “tem que ter compromisso, efetividade e preocupação” com o caso.
A última atualização do processo aconteceu no dia primeiro de dezembro de 2017, quando o 1° Grupo Criminal do Tribunal de Justiça acolheu o recurso dos réus Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, sócios da boate, e Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão, integrantes da banda, e decidiu por não levar o caso ao júri. O Ministério Público, no dia oito de janeiro de 2018, recorreu da decisão.
Defesas
O advogado Omar Obregon defende o músico Marcelo Santos. Ele disse que a decisão de não levar ao júri obviamente “não agrada a todos, mas é o andamento esperado para o processo”. A defesa afirma que as pessoas estão entendendo que “ninguém entrou para matar alguém”.
Questionado sobre a atual situação domúsico, o advogado diz que a tragédia “mexeu muito com a vida dele”. Santos trabalha, eventualmente, como colocador de azulejos em algumas construções, segundo o advogado.
O ex-sócio da boate, Mauro Hoffmann, tem como sua defesa o advogado Mario Cipriani. “O fato de ter cinco anos é normal devido a complexidade do processo, número de testemunhas e pessoas ouvidas”, diz o defensor. “Eu garanto que por parte da defesa, nenhum documento foi protocolado no sentido de atrasar o processo”.
“A minha tese é de que, como o Mauro era sócio cotista do estabelecimento, ele não tinha poder de administrar o local. Logo, é ausente de responsabilidade penal. Não é questão de ir ou não ao júri, o fato é de ser crime não doloso”, afirma Cipriani.
Procuradas pelo R7, as defesas de Elissandro Spohr e Luciano Leão não se pronunciaram.
Calúnia e Difamação
No ano passado, os promotores Joel Dutra, Maurício Trevisan e Ricardo Lozza processaram um pai de uma das vítimas da Boate Kiss por calúnia e difamação. Na época, “o pai tentava provar que o Ministério Público sabia que a boate funcionava de forma irregular”.
Em manifestação, encaminhada à Procuradoria, os promotores disseram que seus objetivos sempre foram “fazer cessar as agressões e demonstrar a sua correta atuação em todos os processos envolvendo a responsabilização dos culpados pela tragédia da boate Kiss”.
No entanto, no dia 26 de agosto de 2017, o procurador-geral de Justiça Fabiano Dallazen anunciou que irá pedir ao Ministério Público a absolvição do pai processado. Ele afirmou, ainda, que não há mais nenhum sentido em prosseguir com as ações. Ele ressaltou “que, mais uma vez, o Poder Judiciário reconhece a legalidade e tecnicidade da atuação do MP neste caso”.
Na sequência, o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Marcelo Dornelles, afirmou que todo o episódio sobre a ação contra os pais das vítimas “precisa ser uma página virada, pois o interesse da Instituição sempre foi concentrar esforços na punição dos verdadeiros culpados”.
O juiz Leandro Augusto Sassi, titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria, absolveu Paulo Tadeu Nunes de Carvalho das acusações de calúnia e difamação. O magistrado considerou que, embora a acusação alegue que Carvalho caluniou os promotores, apontando que teriam praticado delito de prevaricação, se trata apenas de uma mera crítica quanto à atuação dos membros do MP.
R7