O desmatamento ilegal de uma área de preservação ambiental no bairro de São Marcos, em Salvador, durante o período do carnaval ainda é um mistério para órgãos públicos de fiscalização. A situação foi denunciada por moradores do local, que disseram que a derrubada de árvores na reserva de mata atlântica começou na sexta-feira (24). Especialistas dizem que o local desmatado, que fica na Travessa Alto do Mandu, que dá acesso à Avenida Gal Costa, pode demorar até 20 anos para se recompor.
Nesta quinta-feira (2), representantes de movimentos ambientalistas foram ao Ministério Público (MP-BA) para protocolar um documento pedindo a instauração de um inquérito para apurar e punir os responsáveis pelo desmatamento.
A Companhia de Polícia de Proteção Ambiental (Coppa) disse que o desmatamento teria sido feito por uma construtora, mas não informou o nome da empresa, e ainda destacou que o relatório da apuração sobre o caso será encaminhado para a Promotoria de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público da Bahia (MP-BA) para adoção das medidas cabíveis.
“[O documento] Vai ser encaminhado para o delegado e para a Coppa [Companhia de Polícia de Proteção Ambiental], para que eles possam investigar se existe algum alvará, alguma autorização, para que possamos chegar a autoria”, afirmou a promotora de Justiça Márcia Teixeira.
Para a representante do Instituto Búzios, de defesa ambiental, Marcele do Valle, não há dúvidas que a ação foi ilegal. “Já ficou patente que as coisas que aconteceram ali estavam ilegais, porque não tinha alvará. As pessoas foram abordadas e não tinha nenhuma placa de indicação da obra”, destacou.
O secretário estadual de Meio Ambiente, Geraldo Reis, disse que não houve nenhum pedido de licença para desmatar o espaço. “As informações que nós temos, tanto através do Inema [Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos] como através da Sucom [Secretaria Municipal de Urbanismo], é que não houve nenhum pedido de licenciamento nem no estado e nem na prefeitura”, destacou.
A bióloga Daniela Falcão falou sobre os impactos causados pelo desmatado e disse que a área vai demorar ao menos duas décadas para se recompor. “A gente vê que houve perda de árvores, da vegetação e da fauna. Espécies que são mais lentas, como répteis, anfíbios invertebrados, morreram. A gente pode ver que o córrego está aterrado. Sempre que a gente tem esses cursos d’água, é preciso preservar as áreas no entorno, que a gente chama de mata ciliar. Elas têm que ser mantidas porque senão o rio tende a ser assoreado”, disse.
Até a quarta-feira, uma das máquinas utilizadas para o desmatamento continuava no local e, de acordo com moradores, foi retirada durante a madrugada desta quinta-feira, por homens armados. “Duas e meia da manhã dessa madrugada, cerca de dez homens levaram a máquina daqui. Agora, que são esses homens ninguém sabe”, afirmou a enfermeira Thamires Marques.
A Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado (Sedur) classificou a situação como crime ambiental e disse que aguarda a identificação dos criminosos pela polícia para tomar as medidas cabíveis. O órgão divulgou, ainda, que vai manter a fiscalização na área.
Caso
De acordo com a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), moradores denunciaram que a derrubada das árvores na área de reserva de Mata Atlântica começou, de forma repentina, na sexta-feira de carnaval, no dia 24 de fevereiro. Conforme o órgão, a Coppa foi acionada na manhã de sábado (25), por volta das 6 horas, para atender a denúncia e, ao chegar ao local, interrompeu a ação realizada por uma construtora.
No entanto, logo após a saída dos agentes da Coppa, o desmatamento foi retomado no mesmo dia. Houve nova denúncia de moradores e, na terça-feira (28), guarnições da Coppa e da 50ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM) e representantes da Sucom estiveram no local e lavraram um Auto de Infração de Embargo e Notificação em nome de um dos operadores das máquinas que estavam no local. Segundo a Sema, desde então a obra encontra-se paralisada.
A Sema informou que testemunhas foram ouvidas e o maquinário foi apreendido. De acordo com o órgão, a área possui remanescente da mata atlântica em estágio médio de regeneração e uma nascente, com consequente assoreamento, decorrente das atividades de terraplenagem e erradicação de vegetação nativa com utilização de tratores. No local do desmatamento, consta uma placa atestando de que se trata de uma área de preservação.
“É uma área que tem nascente, é uma área de preservação ambiental. E é assim, está aberto. Acabou com metade da floresta”, conta Deise Lima, supervisora de Recursos Humanos e moradora do bairro.
Morador da região, o aposentado Jorge Leal mostrou indignação. “A princípio, sentimento de espanto. Fizeram uma coisa muito violenta, rápida e que está deixando todo mundo triste. Fora os animais, micos. Todos os animais gritando. Realmente, foi triste”, contou.
Do G1 Bahia