Uma nova fase da Operação Lava Jato, deflagrada na manhã desta terça-feira (10), teve como um dos alvos Fábio Luis, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A ação envolveu 47 mandados de busca e apreensão, com nove pessoas físicas e 21 empresas como alvos.
A Polícia Federal chegou a pedir a prisão de Fábio e outros investigados, porém o MPF (Ministério Público Federal) afirmou que não havia necessidade, e o requerimento foi negado pela juíza Gabriela Hardt. Ela considerou o longo tempo decorrido desde a representação inicial (a primeira peça do MPF foi protocolada em junho de 2018) e a ciência dos alvos sobre a investigação.
Não há mandado de busca em endereços de Fábio Luís, apenas em empresas que seriam ligadas a ele, segundo o Ministério Público Federal.
A suspeita é a de que empresas do grupo Gamecorp/Gol, controladas por Fábio e outros investigados, receberam repasses do grupo Oi/Telemar, que, em troca, teria sido beneficiado pelo governo petista.
Os pagamentos, que somam R$ 132 milhões de 2004 a 2016, teriam sido usados na compra do sítio em Atibaia (SP) frequentado pelo ex-presidente.
O MPF aponta que Jonas Suassuna e Fernando Bittar adquiriram a propriedade usando parte de recursos injustificados das empresas que administravam em conjunto com Fábio. Kalil Bittar, irmão de Fernando, também é alvo das investigações.
“[Houve] uma complexa rede de operações financeiras e societárias que demonstram e indicam operações de tráfico de influência, de formação de crime organizado, de lavagem de dinheiro”, afirmou o delegado da Polícia Federal, Sergio Busato.
A área onde está a casa, o lago e outras benfeitorias do sítio de Atibaia está registrada em nome de Fernando Bittar, filho de Jacó Bittar, amigo de Lula que atuou na fundação do PT. Outra parte do sítio está em nome de Suassuna.
No final de novembro, o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) condenou Lula por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do sítio —a acusação estava ligada às reformas no local, enquanto a investigação atual da Lava Jato é sobre a compra da propriedade. O tribunal aumentou a pena fixada para Lula na primeira instância, de 12 anos e 11 meses de prisão para 17 anos e 1 mês.
Ficha-suja e impedido de disputar eleições, o petista segue solto devido à decisão do Supremo Tribunal Federal favorável à prisão só depois de esgotados os recursos nos tribunais superiores —entendimento que permitiu sua soltura no mês passado, após 580 dias de cumprimento de pena por condenação no caso do tríplex de Guarujá (SP).
No caso do sítio, segundo a Justiça, Lula recebeu vantagens indevidas das empreiteiras Odebrecht e OAS em troca de favorecimento em contratos da Petrobras. Segundo a acusação, as reformas e benfeitorias realizadas pelas construtoras no sítio configuraram a prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Já a defesa de Lula alega que ele não teve direito a um processo justo pois a maior parte da causa foi conduzida pelo atual ministro da Justiça, Sergio Moro, que, para os advogados, não agiu com imparcialidade durante a investigação e a ação penal do caso.
Outra alegação é a de que não há provas de que Lula atuou para beneficiar a Odebrecht e a OAS em contratos da Petrobras, ou seja, não está comprovada nenhuma contrapartida do líder petista em favor das companhias.
Os valores repassados entre as empresas e agora alvos da Lava Jato envolvem contratos que, segundo o MPF, não teriam condições de serem cumpridos.
Em troca dos repasses, o governo petista teria ajudado o grupo Oi, como na aquisição da Brasil Telecom, em 2008. As regras da Anatel não permitiam a operação, mas um decreto assinado pelo ex-presidente Lula na ocasião acabou admitindo a compra.
“A cronologia dos fatos e as decisões administrativas e políticas que foram tomadas desde o anúncio de intenção da fusão e o que acontecia ao tempo em que essas decisões eram tomadas é bastante suspeito”, apontou o procurador Roberson Pozzobon.
Os procuradores também suspeitam da atuação do petista José Dirceu, enquanto ministro da Casa Civil de Lula, em favor da empresa. Eles indicam que, de 2009 a 2014, a Oi transferiu cerca de R$ 10 milhões para uma empresa e um escritório de advocacia ligados ao petista, sem contrapartida. Além disso, teria arcado com despesas pessoais de Dirceu e seus familiares no período.
Outros mandados de busca dessa fase da investigação têm como objetivo apurar possíveis irregularidades no relacionamento entre o grupo Gamecorp/Gol com a Vivo/Telefônica.
Os procuradores encontraram movimentação na ordem de R$ 40 milhões entre as empresas de 2014 a 2016, num projeto denominado “Nuvem de Livros”.
Questionados sobre o longo período de investigações para se chegar à operação, os procuradores alegaram que as provas foram coletadas em diferentes fases da Lava Jato e que o esquema investigado é complexo, demandando tempo para sua construção.
“Os fatos são bastante complexos, as investigações se iniciaram há muito tempo. Especificamente para deflagração dessa operação foram somadas provas de três operações anteriores da Lava Jato e isso é bastante significativo porque mostra a importância de investigações conexas em termos de provas sejam mantidas no mesmo local”, disse Pozzobon.
Algumas provas foram coletadas, segundo o procurador, nas fases 14, 24 e 34 da Lava Jato, esta última deflagrada em setembro de 2016.
Pelo Twitter, o ex-presidente Lula afirmou que a operação desta terça é uma “demonstração pirotécnica de procuradores viciados em holofotes”. O petista diz ainda que o MPF recorre a “malabarismos” para o atingir, perseguindo sua família.
A defesa do ex-ministro José Dirceu afirmou que todos os recebimentos dele já foram alvos de investigação, “portanto qualquer nova acusação é pura invencionice”.
A Telefônica disse por meio de nota que está fornecendo todas as informações solicitadas e que continuará contribuindo com as autoridades. “A Telefônica reitera seu compromisso com elevados padrões éticos de conduta em toda sua gestão e procedimentos”, completa.
Também em nota, a Oi afirmou que atua de forma “transparente e tem prestado todas as informações e esclarecimentos que vêm sendo solicitados pelas autoridades, assegurando total e plena colaboração com as autoridades competentes”.
A Folha de S.Paulo revelou numa série de reportagens em outubro de 2017 indícios de que os repasses feitos pela Oi a empresas do Grupo Gol, de Suassuna (que atua nas áreas editorial e de tecnologia e não tem relação com a companhia aérea de mesmo nome), não tinham contrapartida econômica ou estavam superfaturados.
Foi o caso do fornecimento do conteúdo da “Bíblia na voz de Cid Moreira” pela empresa Goal Discos, de Suassuna, para a Oi. Documentos obtidos pela Folha de S.Paulo indicam que a empresa de telefonia arrecadou apenas R$ 21,1 mil com o programa num período em que teve de pagar R$ 16,8 milhões à firma do empresário.
O acordo foi assinado em janeiro de 2009, dois meses após Lula assinar decreto que viabilizou a compra da Brasil Telecom pela Oi.
A Folha de S.Paulo também revelou que o Grupo Gol conseguiu firmar um acordo com a Vivo cinco meses após encontro do petista com executivos espanhóis da Telefônica, dona da operadora brasileira. O acordo incluiu a “Nuvem de Livros” entre os produtos oferecidos aos clientes da empresa de telefonia no Brasil.
O jornal também mostrou que um contrato da Prefeitura do Rio de Janeiro que beneficiou empresa de Suassuna gerou prejuízo milionário à administração municipal, segundo auditoria feita pelo TCM (Tribunal de Contas do Município).
As informações foram apresentadas por Marco Aurélio Vitale, por sete anos diretor comercial do grupo empresarial de Jonas Suassuna, e checadas pelo jornal ao longo de dois meses.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele disse que firmas foram usadas como fachada para receber recursos da Oi direcionados a Fábio Luís Lula da Silva e seus sócios.
De acordo com ele, o Grupo Gol mantinha contratos “sem lógica comercial” tendo como único objetivo injetar recursos da empresa de telefonia nas firmas de Suassuna. “A Gol conseguiu um tratamento que não existe dentro da operadora”, afirma.
Vitale foi testemunha da investigação da PF e escreveu um livro sobre os anos em que trabalhou na Gol.
Bahia Notícias