As doenças cardiovasculares matam uma pessoa a cada 40 segundos e são a principal causa de morte no Brasil. Se somarmos todas as vítimas de todos os tipos de câncer, o número de pessoas mortas por doenças cardiovasculares ainda é o dobro.
Desde o início do ano até esta quinta-feira (15), mais de 70 mil pessoas morreram por causa de problemas cardiovasculares.
Todos esses números são da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Normalmente, as vítimas costumam ter mais de 40 anos, mas embora não existam estudos recentes, é consenso entre os especialistas que o número de jovens que morrem por causa de problemas cardíacos está aumentando em todo o país.
Se levarmos em conta apenas o infarto, um dos problemas cardiovasculares mais comuns, dados do Ministério da Saúde indicam que o número vítimas com menos de 40 anos está subindo gradualmente desde 2010. Naquele ano, 2.288 pessoas com menos de 40 anos morreram por causa de um infarto. Em 2016 foram 2.746 pessoas e a maior parte, 1997 vítimas, tinham entre 30 e 39 anos.
Infarto em jovens é mais forte?
Primeiramente, é preciso entender o que são as doenças cardiovasculares. Elas englobam uma série de problemas que podem afetar o coração e os vasos sanguíneos, entre eles, pressão alta, doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, arritmia e parada cardíaca. O infarto é uma das doenças cardíacas mais comuns.
A ideia de que o infarto em jovens é mais forte faz parte do entendimento popular. Muitas pessoas acreditam que nas pessoas mais jovens o infarto é mais forte e, portanto, mais mortal. Mas não é exatamente isso o que acontece, segundo os especialistas.
O cardiologista explica que o jovem costuma ter mais força física para suportar o infarto, por outro lado não tem uma proteção chamada circulação colateral, mais comum em pessoas acima dos 40 anos.
Circulação colateral são pequenos vasos sanguíneos que surgem no coração para compensar a falta de irrigação causada por uma artéria entupida.
O processo de entupimento de uma artéria pode levar alguns anos. Durante este tempo, o organismo começa a encontrar outras formas de fazer o sangue passar e chegar ao coração, por isso, cria esses pequenos vasos. Quando o indivíduo sofre um infarto, o organismo tem essa alternativa e ganha tempo para a chegada do socorro. “Nas pessoas mais jovens, o infarto é o mesmo, mas o organismo ainda não conseguiu criar esses novos vasos, por isso, o índice de mortalidade pode ser maior”, explica Costa.
Estima-se que 10% das vítimas morrem na primeira hora após o infarto, portanto, esta proteção extra é valiosa.
Qual é a idade de risco para o infarto?
O cardiologista Fernando Costa, diretor da Sociedade Brasileira de Cardiologia, explica que já não se pode determinar uma idade de risco porque ela está diretamente ligada à exposição aos fatores de risco.
“Um jovem com uma vida desregrada, que ingere bebidas alcóolicas de forma exagerada e com frequência, está acima do peso, fuma e tem maus hábitos alimentares, ele tem mais chance de estar com entupimento de artérias, com arterioesclerose, o que pode levar a um infarto”, explica o médico.
Outro indicador de risco é a circunferência abdominal. De acordo com a Sociedade Brasileira de Hipertensão, o tamanho da cintura é o indicativo mais preciso para a avaliação dos riscos de doenças cardiovasculares e metabólicas. As medidas indicadas por especialistas são, no máximo, 88 centímetros para mulheres e 102 para os homens.
A gordura que se acumula no abdômem é perigosa porque é metabolicamente ativa, principalmente a que se concentra em volta do fígado. Ela é capaz de liberar mais de 80 substâncias químicas e hormonais consideradas agressivas para o aparelho circulatório e para o pâncreas. As consequências são índices altos de colesterol e glicose, entupimento de artérias, diabetes e hipertensão.
Existem alguns agravantes, como o histórico familiar. Filhos, netos ou sobrinhos de pessoas que tiveram um infarto com menos de 55 anos são potenciais vítimas de uma arterioesclerose precoce e podem sofrer um infarto ou uma parada cardíaca antes dos 40 anos, principalmente se levar uma vida desregrada.
Para Costa, essas pessoas deveriam fazer um acompanhamento cardiológico a partir dos 20 anos. “Isso diminuiria o número de vítimas de doenças cardiovasculares”, afirma.
Infarto em jovens atletas
Casos recentes de jovens atletas profissionais que morreram em decorrência de problemas cardíacos chamaram a atenção.
No dia 4 de março, o capitão da Fiorentina, Davide Astori, foi encontrado morto no hotel onde o time italiano estava em concentração, na cidade de Udine. A autópsia confirmou parada cardíaca.
Cinco dias depois, Thomas Rodrigues, 18 anos, jogador do Tours, time da segunda divisão do futebol francês, morreu enquanto dormia. A direção do clube ainda não confirmou a causa da morte, mas as primeiras suspeitas são de uma parada cardíaca.
Outro caso recente que chocou o mundo esportivo foi o de Charlie Craig. O ciclista britânico de 15 anos sonhava em representar a Inglaterra nas Olimpíadas, mas morreu depois de um treino intenso. De acordo com o cardiologista que acompanhou o caso, Charlie pode ter passado por surtos de adrenalina, o que teria provocado uma série de ataques cardíacos.
O médico Luciano Baracioli, cardiologista da Unidade Clínica de Coronariopatia Aguda do Incor/USP, explica que é preciso entender que um atleta que morre em campo ou depois de um jogo ou treinamento, não necessariamente teve um infarto ou parada cardíaca.
“A maior parte tem uma morte súbita de origem cardíaca. Existem outras doenças que podem causar morte súbita, doenças genéticas que prejudicam o coração e podem desencadear arritmia durante a atividade física”, explica o cardiologista.
Ele conta que, no Brasil, não existem pesquisas ou dados específicos, mas nos Estados Unidos, onde a questão é bem documentada, a maior causa de morte de atletas não é o infarto, mas outros problemas cardíacos.
Uma destas doenças é a cardiomiopatia hipertrófica que atinge uma em cada 500 pessoas.
Trata-se de um problema genético que causa o crescimento das células musculares do coração. As paredes ventriculares ficam mais grossas e isso prejudica o fluxo sanguíneo, coração sente dificuldade em bombear o sangue.
A cardiomiopatia hipertrófica pode causar palpitações e arritmias, o que pode levar à morte durante a prática esportiva. O problema pode ser agravado pela dificuldade de detecção, muitos pacientes são assintomáticos.
Outro problema que pode causar infarto ou parada cardíaca é a hipercolesterolemia familiar, uma mutação genética hereditária que impede o fígado de metabolizar o excesso de LDL, o mau colesterol. O resultado são níveis de colesterol muito altos, que independem dos hábitos ou do estilo de vida.
Baracioli explica que toda a pessoa que pretende começar uma atividade física, seja algum esporte ou academia, precisa fazer uma avaliação médica. Uma simples conversa com um avaliador físico não é o suficiente.
“Uma avaliação séria é formada por três etapas. Uma entrevista sobre os hábitos de vida do indivíduo, a investigação do histórico familiar e exames. O principal é o eletrocardiograma, mas dependendo do histórico do paciente, outros podem ser feitos”, explica o cardiologista.
Mesmo quando se fala em jovens atletas, é importante observar os fatores de risco para doenças cardíacas, como hipertensão, diabetes, colesterol alto e obesidade. Mas a isso somam-se, ainda, outros fatores como o uso de drogas estimulantes: cocaína, ecstasy e esteroides anabolizantes.
Os atletas também precisar estar atentos ao fator genético. “Se o pai, mãe ou irmãos tiveram infarto, a chance de essa pessoa ter doença de colesterol grave ou outro problema é alta”, alerta Baracioli.
R7