O Ministério da Educação (MEC) retirou do documento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), entregue ontem (6) ao Conselho Nacional de Educação (CNE), trechos que diziam que os estudantes teriam de respeitar a orientação sexual dos demais. O MEC uprimiu também a palavra gênero em alguns trechos do documento. A versão divulgada aos jornalistas na última terça-feira (4) continha esses termos. Segundo a pasta, a última versão passou por “ajustes finais de editoração/redação”.
A BNCC define as competências e os objetivos de aprendizagem dos estudantes a cada etapa da vida escolar. O documento entregue ontem (6) refere-se ao ensino infantil e ao fundamental.
Governo
Em nota, o MEC diz que o documento “preserva e garante como pressupostos o respeito, a abertura à pluralidade, a valorização da diversidade de indivíduos e grupos sociais, identidades, contra preconceito de origem, etnia, gênero, convicção religiosa ou de qualquer natureza e a promoção dos direitos humanos”.
Segundo a pasta, a versão final passou por ajustes que identificaram redundâncias. De acordo com o MEC, o texto encaminhado aos conselheiros na quarta-feira (5) já incluía esses ajustes. “O documento apresentado à imprensa [na terça-feira], de forma embargada com antecipação, em função da complexidade do assunto, passou por uma última revisão.” “Em momento algum”, acrescemta o MEC, “as alterações comprometeram ou modificaram os pressupostos da Base Nacional Comum Curricular”.
Reações
A mudança no documento provocou reações de setores da sociedade. O secretário de Educação do Ceará e presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Idilvan Alencar, considerou “estranhas” as alterações. “Acho um desrespeito com todo o debate que foi feito.”
“Retirar o debate da orientação sexual e da identidade de gênero mascara a situação real que existe na escola hoje. Uma das causas do abandono é a homofobia. Quando se retira isso da BNCC, afasta-se do mundo real, é muito grave”, afirmou o secretário.
Segundo o coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, rede que reúne mais de 200 organizações civis, Daniel Cara, a BNCC deve se adequar à Constituição Federal, que define que todos têm que ser iguais perante a lei. “É injustificável a retirada [do termo orientaçlão sexual e da discusão sobre questões de gênero]. A escola tem missão de garantir que na sociedade todos respeitem todas as formas de identidade. Não colocar essa questão na BNCC significa que não vão refletir sobre um país que é machista, misógino, homofóbico. É um recuo grave.”
A retirada do termo orientação sexual e das discussões sobre questões de gênero da BNCC era demanda de setores conservadores do Congresso Nacional.
Histórico
Em 2014, o Plano Nacional de Educação (PNE) foi aprovado pelo Congresso Nacional, após várias discussões, sem o trecho que se referia especificamente a gênero.
A BNCC estabelece dez competências que devem ser desenvolvidas ao longo de toda a educação básica, que inclui também o ensino médio. Uma delas é que os estudantes sejam capazes de “exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de origem, etnia, gênero, idade, habilidade/necessidade, convicção religiosa ou de qualquer outra natureza, reconhecendo-se como parte de uma coletividade com a qual deve se comprometer”.
Na versão entregue aos jornalistas, entre as palavras gênero e idade, havia o termo “orientação sexual”.
Também houve alteração no trecho em que a BNCC destaca que os sistemas e redes de ensino devem incorporar aos currículos alguns temas “contemporâneos que afetam a vida humana”. Na versão entregue aos jornalistas apareciam os temas “sexualidade e gênero”. A versão final restringiu-se ao termo “sexualidade”.
Quando trata das habilidades a serem desenvolvidas em ciências, no 8º ano, a versão dos jornalistas incluía a necessidade de acolher a diversidade de indivíduos, sem preconceitos baseados na identidade de gênero e orientação sexual. A última versão traz apenas a expressão “diferenças de gênero”.
Agência Brasil