O apresentador da BBC e médico Michael Mosley recrutou voluntários saudáveis para um documentário sobre o sono. A ideia era entender o que ocorre com o nível de açúcar no sangue em diferentes situações.
Como Mosley também tem seus problemas de sono, resolveu participar da pesquisa como voluntário. No texto abaixo, ele conta o que aprendeu com a experiência:
“Eu sofro de um pouco de insônia e sei que quando não consigo dormir ao menos sete horas eu me sinto cansado e irritado.
Também já percebi que uma noite de sono ruim afeta minha memória. A relação entre o sono e a memória não é nova e a única teoria plausível é que durante o sono nosso cérebro transforma algumas lembranças de curto prazo, coletadas naquele dia, em uma espécie de arquivo de longo prazo, liberando espaço para mais memórias.
Então se você não pega no sono pesado o suficiente, essas memórias serão perdidas.
Independentemente de essa teoria estar certa ou não, ter uma boa noite de sono é particularmente importante para estudantes que estão fazendo revisões para provas – melhor do que ficar acordado se preparando.
Mas o que realmente me surpreendeu, enquanto fazia o documentário The Truth about Sleep (‘A Verdade sobre o Sono’, em tradução livre) para a BBC, foi descobrir o quanto uma péssima noite de sono pode afetar a quantidade de açúcar no sangue e a fome, até em voluntários saudáveis.
Para entender melhor essa relação, pedimos ajuda à médica Eleanor Scott, que trabalha na Universidade de Leeds, na Inglaterra.
Recrutamos um grupo de voluntários saudáveis e, com a supervisão dela, fizemos um monitoramento das atividades e da glicose deles a cada cinco minutos para entender o que acontecia com o nível de açúcar no sangue.
Depois, pedimos que os voluntários dormissem normalmente por duas noites. Depois, que fossem para a cama três horas mais tarde do que o normal, seguidas por duas noites em que poderiam dormir quanto quisessem.
Naturalmente, como um homem que gosta de novas experiências, eu decidi participar. E posso dizer que não é nada agradável ficar acordado quando você não quer e quando todos em sua casa já estão dormindo.
Foi uma surpresa desagradável saber quanto meus níveis de açúcar subiram nos dias em que tive que me privar do sono, e quanto isso me fez ficar faminto.
O mesmo aconteceu com os outros voluntários. Quando nos encontramos com a médica para pegar os resultados, todos reclamaram de aumento de apetite.
Um deles chegou a falar: “Eu queria muitos biscoitos, não um só. Eu comeria uns dez. E cheguei a escrever no meu diário o dia em que comi dez bolachas recheadas”.
“Isso não é normal?”, perguntei.
“Certamente não é normal para um café da manhã”, ele respondeu.
E o aumento foi tão significativo que alguns voluntários que até então eram saudáveis entraram na área considerada de risco para diabetes do tipo 2. Esses problemas melhoraram após algumas boas noites de sono.
A médica Eleanor Scott observou que há muitas provas coletadas a partir de grandes pesquisas que sugerem que as pessoas que dormem menos do que sete horas por noite são mais suscetíveis à obesidade e a desenvolver a diabetes 2.
Mas por que isso acontece?
“Sabemos que dormir pouco altera seus hormônios do apetite, e deixa as pessoas com mais fome e com menos chances de sentirem saciadas. Também sabemos que a falta de sono provoca vontade de comer doces, o que poderia explicar o desejo das bolachas recheadas”, disse Scott.
“Além disso, se você está acordado quando não deveria estar, você produz mais hormônios do estresse, o cortisol, que pode influenciar seu nível de glicose no dia seguinte.”
Uma análise recente do King’s College, em Londres, revelou que as pessoas que dormem mal consomem, em média, 385 calorias a mais por dia – que se acumulariam ao longo do tempo.
Mas a falta de sono não provoca somente uma explosão no seu nível de açúcar ou enlouquece seus hormônios da fome. Os pesquisadores também descobriram que algumas áreas do cérebro relacionadas a recompensas também ficam mais ativas quando você está cansado. Em outras palavras, você fica mais motivado a procurar por comida.
Dormir o suficiente é importante não somente para adultos, mas também para crianças.
Em outro estudo recente, pesquisadores pegaram um grupo de crianças da pré-escola, entre 3 e 4 anos de idade, que estavam acostumadas com sonecas frequentes no período da tarde, e não apenas cortaram essa soneca vespertina, mas também as mantiveram acordadas por duas horas além do horário que normalmente estavam acostumadas a dormir.
No dia seguinte, as crianças comeram 20% mais calorias do que o normal, e particularmente mais açúcar e carboidratos. Depois disso, puderam dormir quanto quisessem. No dia seguinte, ainda consumiram 14% mais calorias do que o normal.
Todos esses casos mostram a importância de se ter uma boa noite de sono.
R7