Durante a semana em que a cidade de São Paulo registrou índices recordes de frio, moradores de rua procuraram alternativas para tentar superar e lidar com as baixas temperaturas, principalmente durante a noite e a madrugada. Na praça Dom José Gaspar, no centro de São Paulo, algumas pessoas em situação de rua ergueram barracas de camping e ficavam nas calçadas envoltos em cobertores e edredons que receberam de doações.
Quatro amigos que estavam na região falaram à reportagem do R7, nesta quinta-feira (20), das táticas que usam para sobrevier nas ruas. Entre as estratégias, além dos cobertores doados pela população, o grupo recorre a caminhadas pelas ruas durante a madrugada para se manter aquecido e bebidas e drogas também são usadas no momento de fugir do frio.
De acordo com o morador Fernando*, “é a maior dificuldade” estar em situação de rua e, segundo ele, o que mais incomoda é a falta de alimentação e de um banheiro. Ele conta que é de Bauru, interior de São Paulo, e que ficou preso durante 12 anos e seis meses. Depois de cumprir a pena, ele diz que a família não o quis mais e que, desde então, fica nas ruas.
— Tô há sete meses em São Paulo e dois anos na rua.
Mostrando o RG para a reportagem, ele diz que tem “o nome limpo” e que sua parte ele “já pagou”. O homem diz que consegue sobreviver, mas com “sofrimentos”.
— Tem que encostar num canto aí [para fazer as necessidades]. Às vezes as pessoas fazem piada da gente.
Nesta quarta-feira (19), a Prefeitura de São Paulo inaugurou o primeiro albergue de emergência de inverno para atender pessoas em situação de rua. Além disso, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social ampliou de 79 pessoas para 717 o número de assistentes sociais que atuam na abordagem de moradores em situação de rua, no período noturno, na intenção de direcioná-los a um dos abrigos que fazem parte da rede de atendimento.
Para os moradores, mesmo com os abrigos, nem sempre ir para um local assim é a melhor solução. Ricardo*, que também está em situação de rua, conta que os centros de acolhida, muitas vezes, são palco de grandes disputas por território entre os frequentadores.
— É um atropelando o outro… a gente não tem paz.
Ele conta que perdeu o pai e a mãe aos sete anos em um acidente e que, “de lá pra cá, só calçada”. Recentemente, ele diz que “foge do frio” andando pra esquentar ou “tomando um negócio”. As doações também ajudam bastante.
— Esse edredom, sabe como eu consegui? Gritando “eu tô com frio”. Apareceu uma mulher na janela do prédio e falou “espera um pouquinho”.
Marta*, a única mulher do grupo, diz que além de ter que pensar em como fugir do frio durante as madrugadas, também tem que se preocupar com a proteção para não ser vítima de abuso sexual. Para isso, ela fica sempre ao lado dos colegas homens.
Para o frio ela diz que “depende da esmola de alguém” e que “uma noite no albergue não resolve sua vida”. Em determinado momento, ela pega sua garrafa de cachaça e oferece para a reportagem: “quer um pouquinho”? Mas também diz que isso “nada vai mudar” em sua realidade.
R7