Wagner Siqueira, consultor de organizações*
Vivemos o apogeu do empreendedorismo, exaltam todos! O colaborador se transformou numa espécie de empregador de si mesmo. Ele é o novo empreendedor, mesmo quando claramente mantém vínculos empregatícios, subordinação definida, jornada de trabalho com horários estabelecidos e, mais do que tudo, dependência econômica.
A sua opção existencial não é pela ascensão do risco da atividade empresarial. Mas o contexto do empreendedorismo corporativo o impulsiona ao desempenho dos mesmos papéis e funções, vivendo em plenitude as circunstâncias de um empresário propriamente dito. Pior ainda: não briga pelo seu negócio, mas pelo negócio dos outros.
Quando fracassa, o empresário costuma ir à falência como pessoa jurídica, mas nem sempre como pessoa física. Às vezes, fica até mais rico. Já o empreendedor-empregado inevitavelmente passa a integrar a lista dos desempregados de um headhunter, numa busca ansiosa por recolocação pelo menos próxima ou similar a que detinha antes.
Os dramas existenciais – que vão de depressões, frustrações e crises, até suicídios, como a imprensa internacional tem veiculado em números alarmantes, por exemplo, nas macro-corporações francesas – são certamente as consequências das novas formas de organização do trabalho praticadas nestes primeiros anos do Século XXI.
Não são os problemas pessoais não tratados dos empregados que os levam a atos de desespero e à depressão nos ambientes de trabalho. Esses atos são a resposta dilacerante de empregados, ditos colaboradores e empreendedores, que sucumbem no cotidiano de uma realidade de trabalho que lhes é totalmente adversa.
Aquele colaborador que se suicida nos convoca para ver o que é visível, mas não é visto no mundo das organizações. Estamos crescentemente produzindo sobreviventes, mortos-vivos ou zumbis no cotidiano de nossas organizações, e nem nos damos conta disso. É claro, os reiterados casos de suicídio nos escandalizam!
Nunca se exaltou tanto “o trabalho em equipe”, “o vestir a camisa”, “o ter o espírito de grupo”, mas as avaliações individualizadas de desempenho e de cumprimento de metas e de resultados produzem o dilaceramento psicológico e moral do empregado-empreendedor como pessoa.
O suicídio é o ato derradeiro de libertação de muitos que, ao fracassarem, não suportam mais a submissão às estratégias sutis de exploração humana praticadas hoje no mundo do trabalho sob a fachada do empreendedorismo corporativo, a nova resposta capitalista ao problema da luta de classes, o dernier-cri da ideologia instrumental a serviço da aristocracia financeira detentora massiva do capital majoritário das organizações.
(*) Wagner Siqueira é consultor de organização, diretor-geral da UCAdm – Universidade Corporativa do Administrador e conselheiro federal junto ao CFA – Conselho Federal de Administração. Autor dos livros “Estratégias de Intervenção em Consultoria de Organização” (de 2021, publicado pela Amazon); “As Organizações São Morais?” (de 2014, Editora Qualitymark), “As Seitas Organizacionais” (de 2005, Editora Fundo de Cultura) entre outros.
Site: www.wagnersiqueira.com.br