Uma colher de chá de óleo, medida com exatidão. É assim que o professor Tim Benton se lembra de sua mãe preparando a fritura dos alimentos.
Durante a sua infância, nos anos 1960, o óleo de cozinha ainda era um produto precioso, utilizado com parcimônia.
Hoje em dia, no entanto, ele é tão abundante e barato que o usamos sem restrições em tudo: desde o tempero da salada às frituras.
Isso não se limita à culinária: o óleo é também um ingrediente comum da maior parte dos produtos que compramos no supermercado.
Na verdade, o óleo vegetal, especialmente o de soja e o de palma (ou dendê), está entre os oito ingredientes – os outros sendo trigo, arroz, milho, açúcar, cevada e batata – que fornecem 85% das calorias consumidas mundialmente.
A cada dia que passa, não importa o país em que vivemos, todos temos uma dieta parecida – rica em calorias e pobre em nutrientes.
Calorias muito baratas
É um processo que o professor Benton, pesquisador da Universidade de Leeds especializado em segurança alimentar e sustentabilidade, relaciona diretamente ao comércio global.
A produção de óleos vegetais e as culturas oleaginosas cresceram consideravelmente nas últimas três décadas.
Esse crescimento foi incentivado por uma combinação de acordos comerciais, que tornaram mais barato e fácil exportar e importar óleo, e políticas governamentais. Por exemplo, os subsídios em países como Malásia e Indonésia, destinados a aumentar a produção para exportação, ajudaram a baixar o preço do óleo vegetal.
Em muitos casos, esse comércio de alimentos ajudou a reduzir a fome ao dar “aos mais pobres acesso a calorias baratas”, destaca.
Mas ele afirma que isso significa que mais pessoas estão consumindo produtos importados menos saudáveis do que os disponíveis a nível local – e isso também teria ajudado a nos tornar mais gordos.
Estamos mais gordos
Mais de 50 por cento da população mundial não têm um “peso saudável”, de acordo com uma recente pesquisa coordenada pelo professor Benton. E a obesidade em todo o mundo mais do que dobrou desde 1980.
“Os mais pobres ainda lutam para consumir as calorias necessárias e estão abaixo do peso. Nos países ricos, porém, a pobreza geralmente não impede que as pessoas deixem de ingerir calorias, mas faz com que parem de ter uma dieta rica em nutrientes”, diz a pesquisa.
A professora Corinna Hawkes, diretora do Centro de Política Alimentar da Universidade de Londres, diz que o grande aumento das fontes de calorias desde o início da era da globalização vem do cultivo de oleaginosas.
“Houve um súbito e forte aumento da oferta de óleos de soja e palma e, a meu ver, isso está diretamente relacionado com as políticas que tornaram a sua comercialização mais fácil”, explica.
“Como se tornou muito mais fácil e barato para a indústria de alimento importá-los, não houve um desestímulo ao uso desses óleos”, continua.
Uma pequena quantidade de gordura é parte essencial de uma dieta saudável e balanceada. Mas gorduras são ricas em calorias, por isso consumi-las em grande quantidade pode aumentar o risco de sobrepeso ou obesidade. Gorduras saturadas ou trans também são associadas a doenças cardíacas.
A professora Hawkes diz que o baixo custo e a grande oferta de óleo levaram a mudanças de hábitos culinários de alguns países. Na China, por exemplo, a comida é preparada em grandes quantidades de óleo, assim como no Brasil.
Mas além do aumento do comércio de oleaginosas, acrescenta a professora, é importante notar que a venda de frutas e vegetais também aumentou e isso significa que muitas pessoas viram a sua dieta melhorar.
Desequilíbrio
A professora Hawkes chama atenção para um outro fator, que ela chama de “a questão da quinoa”. A crescente procura por este “superalimento”, cultivado há milênios nos Andes – os incas o chamavam de “grão dos deuses”, pois era a sua principal fonte de proteína -, tem feito seu preço disparar e tirado ele das prateleiras de países onde a quinoa se originou, como Peru, Bolívia, Equador e Colômbia.
A questão que surge está no centro da controvérsia que envolve a globalização: o aumento do consumo de quinoa beneficiou de maneira desproporcional populações que já tinham um cardápio privilegiado.
Ou seja, enquanto quem tem acesso a informações sobre nutrição e saúde estaria se tornando mais saudável graças ao comércio globalizado, pessoas que não possuem esse conhecimento estariam vendo a qualidade da sua dieta piorar.
No entanto, isso é desmentido por um recente estudo da London School of Economics (LSE), que analisou 26 países entre 1989 e 2005, período de grande expansão da globalização.
A pesquisa concluiu que a chamada “globalização social” – as mudanças na maneira como trabalhamos e vivemos – é o que está nos tornando gordos, e não a maior oferta de alimentos baratos e mais calóricos.
A culpa pela obesidade deve ser atribuída ao fato de que agora estamos cada vez mais sujeitos a trabalhar, a comprar e a socializar sem precisar se movimentar, diz a autora do estudo, Dr. Joan Costa-Font.
Ela diz que o consumo continua o mesmo dos tempos pré-globalização, em que as necessidades eram outras, quando “as pessoas tinham que andar até os lugares e não havia tantas atividades que nos faziam poupar energia como hoje”.
“Os indivíduos tinham contatos sociais mais próximos, cozinhavam e gastavam mais tempo com as tarefas domésticas diárias”, analisa.
Costa-Font diz que as pessoas têm novas necessidades e por isso, por se movimentarem menos, deveriam comer menos – ou se movimentar mais.
Ele cita os Estados Unidos como exemplo. Embora os índices de obesidade no país cheguem a quase 35 % da população, este percentual vem se mantendo praticamente o mesmo na última década.
- “Esta é uma boa notícia. Pode ser que os EUA estejam começando a aprender como comer e adaptar o seu estilo de vida à globalização. A hipótese é de que este aumento da obesidade seja apenas transitório”.
Terra