A morte da atriz Tônia Carrero, na noite deste sábado (3), significa para seu neto, o diretor teatral Carlos Thiré, não um momento de tristeza, mas de saudade. Em entrevista à imprensa durante o velório da atriz, que está sendo realizado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Carlos disse que é difícil admitir que chegou o dia de se despedir da avó, a pessoa mais forte que conheceu em toda a vida. Ela conseguiu fazer da vida exatamente o que pretendeu, afirmou Carlos.
“Com isso, Tônia deixou um rastro de luz enorme que nós, que somos da família, bebemos, mas que todos da classe artística bebem, todos que lutaram na ditadura militar beberam.” Para Carlos, Tônia foi uma das criaturas mais livres com que ele já teve contato, parente ou não. “E essa mensagem fica com uma força incrível. Acho que ela já estava merecendo descansar; ela esticou a corda até onde não dava mais, e eu acho que isso tem a ver com a condição de saúde de meu pai [ator e diretor Cecil Thiré], porque ela, enquanto mãe, não abriu mão de cuidar dele até o último instante que foi possível”.
Segundo Carlos Thiré, a pessoa que Tônia foi não merece ser lembrada com tristeza. “Agora, neste momento, ela está melhor do que estava ontem”.
Tônia Carrero, que estava com 95 anos, foi diagnosticada com hidrocefalia em 1999. A doença consiste em acúmulo de líquido, o que provoca pressão no cérebro e afeta os movimentos e a fala. Parentes, amigos, colegas de profissão e muitos fãs chegam ao teatro, a todo momento, para se despedir de Tônia. O corpo da atriz será cremado nesta segunda-feira (5), ao meio-dia, no Memorial do Carmo.
Carlos Thiré destacou que a escolha do Theatro Municipal para o velório da atriz foi emblemática, porque representou todas as áreas em que ela atuou, tanto no lado artístico quanto no político e em vários outros. “Ela sempre teve o dom de unir as pessoas. Continua tendo. Estamos aqui por causa dela”.
O penúltimo espetáculo que Tônia fez foi A Visita da Velha Senhora, do dramaturgo suíço Friedrich Durrenmatt, com um elenco enorme, para celebrar o fazer teatral com os amigos. “Naquele momento, a gente viu que ela estava com um processo acelerado de andar, movimentação, da fala também”. Após pesquisas e exames, Tônia implantou uma válvula na cabeça que lhe deu sobrevida de mais sete anos, período em que voltou a atuar no teatro, fez cinema e chegou a ganhar prêmios. Após esses anos, a doença voltou com maior força e não foi mais reversível, informou o neto.
A última peça, dirigida por Carlos Thiré, foi Um Barco Para o Sonho, em Tônia atuou com Mauro Mendonça, em 2007. “Foi uma oportunidade incrível de conviver com essas duas pessoas muito fortes na minha vida de uma vez só: tanto a Tônia Carrero, quanto a minha avó. E o somatório foi muito feliz”.
Muito sensibilizada, a diretora e atriz Jacqueline Laurence limitou-se a dizer que Tônia Carrero era uma pessoa maravilhosa. “Vamos sentir muita falta dela.”
O ator Ney Latorraca lembrou que esteve com a atriz pela última vez no aniversário dela de 90 anos, em sua casa no Humaitá, Botafogo, zona sul carioca. “Nós somos uma família, a nossa classe. Quando você perde [alguém], perde uma pessoa da sua família. Me lembro de Tônia sempre dando força para mim.”
Uma imagem que permanece muito forte para Ney é a de Tônia na passeata contra a censura em 1968, ao lado de atrizes como Eva Wilma, Eva Todor, Norma Bengell, Odete Lara e Cacilda Becker. “Todas de minissaia e com uma faixa enorme dizendo ‘Abaixo a Censura’. A Tônia não estava à frente só do tempo dela como atriz, mas como mulher mesmo, moderna, pra frente. Uma bela mulher, e bela como pessoa também. Um pacote genial. Linda. Saudades.”
“Tudo de muito bom”
A atriz Clarice Niskier recordou a peça que fez com Tônia, chamada Equilíbrio Delicado, que tinha também no elenco Walmor Chagas, Camila Amado, Ítala Nandi e Luís de Lima. “Eu fazia a filha dela. Foi um ensaio na casa dela. Ensaiamos durante três meses. Convivi diariamente naquele momento. Foi em 1999.”
Para Clarice, aquela convivência foi um aprendizado. “Ela era bem-humorada, com muita história de vida, muita vitalidade, muito amor pelo teatro, com muitos amigos, linda de morrer.” Clarice afirmou que Tônia deixa um legado de dedicação, de empenho, de determinação, de muito amor e de amizade, porque era uma pessoa de cultivar as amizades. “Era tudo de muito bom.”
Em nota, a secretária municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Nilcemar Nogueira, afirmou: “Cerrem-se as cortinas. Estamos em luto. A dramaturgia perde uma referência. O Brasil perde uma estrela. Obrigada, Tônia Carrero, por compartilhar sua arte e nos emocionar ao longo de toda a temporada de sua vida. A você, nossos eternos aplausos. Descanse em paz. À família, nosso abraço fraterno.”
Temer
O presidente Michel Temer lamentou, há pouco, a morte da atriz Tônia Carrero neste sábado (3), no Rio de Janeiro. A atriz, de 95 anos, não resistiu a uma parada cardíaca. Ela estava internada na Clínica São Vicente, no Rio de Janeiro, desde sexta-feira (2) para realização de um procedimento cirúrgico que trataria uma úlcera no estômago.
“O Brasil se entristece com a morte de Tônia Carrero. A TV, o cinema e o teatro ficam com a marca indelével de seu grande talento”, afirmou Temer, em sua conta no Twitter.