É inerente ao ser humano: sempre estamos tentando prever como será o futuro. Em grande parte das vezes, claro, nossas previsões estão erradas –basta assistir aos filmes “2001: Uma Odisseia no Espaço” e “De Volta Para o Futuro” para notar a quantidade de projeções que não se confirmaram. A falha em previsões é o tema do livro “Superprevisões: A arte e a ciência de antecipar o futuro”, escrito por Dan Gardner, com quem o UOL conversou, e por Philip Tetlock.
Psicólogo e cientista social, Tetlock demonstra no livro que, ao prever o futuro, um especialista é apenas um pouco melhor do que um leigo. E por que isso ocorre? Dan Gardner cita várias razões. Entre elas, uma certa “teimosia” de quem faz previsões.
Nós tendemos a nos agarrar a qualquer coisa que sirva para basear algo em que acreditamos, enquanto recusamos aquelas que não apoiam nossas crenças. Quando fazem previsões, as pessoas tendem a tirar conclusões muito cedo e continuar com elas mesmo com evidências de erro.”
Dan Gardner
É claro que outros problemas também cooperam. Entre eles, estão a crença de que tendências devem sempre continuar e a falta de humildade para aprender com erros enquanto tenta prever o que ocorrerá. Se há tantas previsões furadas, por que continuamos a tentar projetar o que vai ocorrer? Simplesmente não temos como evitar isso.
“Em grande parte, não temos escolha. Toda decisão que fazemos é em perspectiva futura – seja para a poucos segundo de agora ou anos e décadas. Para contratar alguém, você tem que prever como a pessoa vai se sair no trabalho. Para casar, tem que prever se o casamento vai durar. Não tem como evitar. O problema é que pensamos que são coisas feitas por pessoas no ‘departamento de previsões’, não algo que todos fazemos todos os dias. Aí não levamos tão a sério como deveríamos”, afirma Dan Gardner.
Veja a entrevista com o autor Dan Gardner:
UOL: Qual é o principal erro que leva a previsões que não se confirmam?
Dan Gardner: O erro mais comum é de simplesmente assumir que tendências deverão continuar. O exemplo clássico é o Japão. Quando a sua economia estava crescendo, nos anos 70 e 80, houve inúmeras previsões que simplesmente assumiram que a taxa de crescimento do Japão continuaria. Se você estendesse esta linha para o futuro, o Japão em breve dominaria a economia global. Ou seja, parecia verdadeiro. E muitas vezes as pessoas tratam o sentimento da verdade como a verdade.
UOL: O que faz um especialista se aproximar do que vai acontecer no futuro?
DG: Primeiro, quem faz superprevisões não tem certezas. Como todo bom cientista sabe, não sabemos nada com certeza. No lugar da certeza, eles pensam em termos de “talvez”. Tudo está entre 1% e 99% e o objetivo é identificar a probabilidade mais precisa possível. Eles também evitam o erro de pensar que uma grande ideia pode responder a todas as suas questões. Eles querem consultar diferentes perspectivas, análises, formas de olhar para um problema e sintetizam isso para surgir com uma única visão.
Outro elemento essencial é a capacidade de admitir erros e mudanças de curso. Isto soa óbvio, mas é extraordinário como as pessoas são obstinadas. Nós tomamos uma decisão e seguimos com ela, não importando novas informações que surjam. “Superprognosticadores” não são prognosticadores que não cometem erros, mas que aprendem com seus erros, mudam seus pensamentos e aprendem com a experiência.
UOL: Se as previsões estão erradas com tanta frequência, por que ainda são usadas?
DG: Em grande parte, não temos escolha. Literalmente toda decisão que fazemos é em perspectiva futura – seja para a poucos segundo de agora ou anos e décadas–, então temos que tomar estas decisões sob crenças do que achamos que vai acontecer. Para contratar alguém, você tem que prever como a pessoa vai se sair no trabalho. Para casar com alguém, tem que prever se o casamento vai durar. Não tem como evitar previsões. O problema é que pensamos que são coisas feitas por pessoas no “departamento de previsões”, não algo que todos fazemos todos os dias. Aí não levamos tanto a sério como deveríamos.
UOL: Quando vemos uma previsão, há um indicativo de que ela está tentando provar uma tese pré-elaborada?
DG: Há dois fatos básicos na psicologia. Um: as pessoas geram respostas rapidamente e sem esforço. Uma questão é colocada e pronto: você quase imediatamente já tem a sensação do que é a resposta. Dois: assim que temos a sensação, nós tendemos a nos agarrar a qualquer coisa que apoia nossa crença enquanto recusamos as que não apoiam. Neste sentido, a resposta rápida e intuitiva fica cada vez mais arraigada – mesmo que esteja totalmente errada.
Quando as pessoas fazem previsões, o mesmo ocorre. Elas tendem a tirar conclusões muito cedo e continuar com elas mesmo com evidências de erro. “Superprognosticadores” sabem disso, então se policiam constantemente testando seus próprios pensamentos e se perguntando: “isto realmente faz sentido? É para isto que as evidências apontam?”. Para eles, uma crença não é um tesouro a ser guardado, mas uma hipótese a ser testada.
UOL: As pesquisas para eleições entram nas altas taxas de erro? Por quê?
DG: Porque a realidade é infinitamente complexa. E pessoas são infinitamente complexas. Quando você tenta prever julgamentos de milhões de pessoas você está tentando fazer algo absolutamente difícil. Não é uma surpresa que as pessoas não sejam boas nisto – e não é uma surpresa que os prognosticadores que são bons tendem a ser intelectualmente humildes, sempre olhando para novas informações ou perspectivas de outros.
UOL: Por que as pessoas tendem a rejeitar previsões pessimistas? Podemos ver isso com o aquecimento global e com os efeitos da superpopulação. É só uma negação natural?
DG: As pessoas não rejeitam todas as previsões pessimistas, só algumas. De fato, se você olhar para projeções famosas do último século, a maioria é mais pessimista. Têm vários razões psicológicas para isto, mas a mais básica é algo que psicólogos chamam de “viés da negatividade”. Nós priorizamos informações negativas. Então, se você quer ser ouvido, gritar “leão!” é geralmente mais efetivo do que “tudo limpo!”. Claro que é verdade que importantes previsões pessimistas têm menos atenção, com a mudança climática sendo o maior exemplo. Mas há vários razões para isso e não acho que o fato da previsão ser ameaçadora é uma delas.
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