Desgastado pela Operação Lava Jato e diante da proibição de doações empresariais, o Congresso debate mudanças no sistema pelo qual os brasileiros elegem deputados e vereadores.
As alterações – que se forem aprovadas até o fim de setembro valerão já na eleição de 2018 – podem provocar mudanças importantes nas disputas e nas estratégias dos partidos.
Em jogo está a distribuição dos recursos que custearão o pleito e o futuro dos congressistas – muitos dos quais envolvidos em denúncias e que tentarão se reeleger.
Grande referência no estudo de sistemas eleitorais no país, o cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz à BBC Brasil que não há modelo perfeito.
“Cada país escolhe um desenho em função de sua história, de sua tradição e da característica que quer maximizar do ponto de vista da governabilidade”, ele afirma. O atual modelo brasileiro vigora desde 1950, com algumas alterações.
A BBC Brasil explica quais os principais sistemas em discussão e seus possíveis impactos nas disputas.
Sistemas majoritários
São sistemas em que são eleitos os candidatos com mais votos e em que não são considerados os votos em partidos. Hoje o modelo já é adotado no Brasil na escolha de presidentes, governadores, prefeitos e senadores. Os seguintes formatos são agora considerados para o preenchimento das Assembleias Legislativas, Câmaras de Vereadores e Câmara de Deputados:
– Voto distrital (ou distrital puro)
A disputa se dá em distritos eleitorais, desenhados conforme o tamanho da população. Assim, cidades grandes poderiam ser divididas em vários distritos. Dependendo do modelo, os partidos poderiam lançar um ou mais candidatos em cada distrito, e se elegeriam os mais votados em cada localidade.
Segundo Maria do Socorro Sousa Braga, especialista em sistemas eleitorais e professora de ciência política da Universidade Federal de São Carlos-SP (Ufscar), o modelo daria grande poder às lideranças partidárias, pois elas seriam responsáveis por definir os candidatos. O sistema, diz ela, forçaria os partidos a lançar candidatos populares em regiões específicas e a direcionar suas campanhas para questões locais.
Candidatos que representam minorias – e têm eleitores dispersos por várias áreas – poderiam ter mais dificuldade para se eleger. Nesse sistema, segundo Braga, grupos partidários minoritários perderiam poder.
Onde é adotado: Paquistão, Reino Unido, Índia, Canadá, EUA e Bangladesh.
– Distritão
O aumentativo vem do amplo tamanho dos distritos eleitorais – no caso brasileiro, cada Estado seria um distrito nas eleições para deputado estadual e federal, e cada município seria um distrito nas disputas para vereadores.
Segundo Braga, o modelo reduziria a renovação na política. Como os votos nos partidos deixariam de contar, as legendas tendem a lançar menos candidatos e a privilegiar os mais conhecidos, com mais chances de vitória. As campanhas focariam mais os políticos como indivíduos do que como membros de determinados partidos, ela diz.
Segundo a professora, alguns deputados passaram a ver o modelo como uma solução para a proibição de doações empresariais: com menos candidatos em disputa, os escolhidos não teriam de dividir recursos de campanha mais escassos com tantos competidores.
Onde é adotado: Afeganistão, Jordânia e pequenos países insulares.
– Distritão light (ou semidistritão)
Segue as mesmas regras do distritão, mas permite também os votos nas legendas. Assim, dá mais peso aos partidos que o modelo anterior.
Braga diz que o distritão light seria uma mudança mais suave para os eleitores brasileiros, já que muitos estão habituados a votar em partidos. Segundo ela, as legendas poderiam adotar estratégias diversas: algumas enfocariam a marca partidária e pediriam o voto na legenda, enquanto outras destacariam seus políticos individualmente.
Ainda não está claro como os votos nos partidos seriam contados e redistribuídos aos candidatos (há quem defenda que sejam somados à votação de cada concorrente da legenda).
Onde é adotado: não há registros.
Sistemas proporcionais
São sistemas que tendem a dar mais peso aos partidos, já que a composição das casas legislativas é definida por fórmulas que levam em conta o peso das legendas e das coligações partidárias. Os modelos proporcionais mais conhecidos são:
– Voto em lista aberta
Atualmente em vigor no Brasil na eleição de casas legislativas (exceto o Senado). As vagas são divididas conforme a votação dos partidos, considerando-se tanto os votos nas legendas quanto nos candidatos das siglas. As cadeiras conquistadas pelos partidos são então distribuídas entre seus candidatos mais votados.
Assim, mesmo que não consiga eleger seu candidato, o eleitor pode influenciar o resultado da eleição ao ajudar a eleger outro candidato do mesmo partido. Também é possível que candidatos com muitos votos ajudem a eleger colegas com poucos votos. Esse traço, apelidado de “efeito Tiririca” em referência ao desempenho do ex-palhaço nas eleições para deputado federal em 2010 e 2014, gera críticas ao sistema, embora analistas avaliem que o efeito seja superestimado.
Para Braga, nesse modelo os partidos são estimulados a lançar mais candidatos, tentando maximizar sua votação – o que em tese dá mais espaço para a renovação partidária e a candidaturas que representem minorias.
Onde é adotado: Brasil e Finlândia.
– Voto em lista fechada
Vota-se no partido, que define a ordem de seus candidatos na lista partidária. As cadeiras são preenchidas conforme a votação de cada sigla e a ordem dos candidatos.
Segundo Braga, nesse modelo os líderes partidários têm grande poder, pois definem a ordem dos candidatos. Mas ela diz que o sistema pode estimular também um maior debate interno nas siglas para a ordenação das listas. “A primeira briga é para entrar bem posicionado na lista e, depois, disputa-se a eleição”, afirma.
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