Março foi marcado no Brasil como o mês mais mortal da pandemia da covid-19, com recordes diários de mortes que deixam a média superior a 3 mil por dia. Além do número, novos infectados pelo SARS-CoV-2 superam os 85 mil por dia.
A expectativa de que o esse quadro mude neste mês não é certa. De acordo com especialistas ouvidos pelo R7, enquanto a transmissão se mantiver no patamar atual, os óbitos continuarão crescendo. Mas, eles acreditam que as mortes não chegarão aos 5 mil diários, como ocorreu nos Estados Unidos. Em 12 de janeiro, os EUA registraram 5.463 mortes em 24 horas, segundo o jornal norte-americano The New York Times.
Para Roberto Kraenkel, professor da Unesp e que faz parte do Observatório Covid-19 BR, a situação não pode seguir como está. “É difícil saber se chegaremos até as 5 mil mortes diárias. Seria adivinhação. Se nada for feito, sim é possível. Mas, bem ou mal, quando as coisas começam a subir muito até o prefeito mais negacionista do mundo, começa a fazer alguma coisa. Se não, vai ter gente morrendo no meio da rua”, diz o especialista.
O infectologista Marcelo Burattini, da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), acredita que a tendência é que os números começem a ficar um pouco mais controlados. “O recorde de mortes é uma consequência do recorde de casos com a precariedade progressiva do sistema de atenção à saúde. A tendência é uma estabilização e depois uma queda, mas ainda com números altos, devido a curva do próprio vírus. Só que teremos um aumento de casos no futuro se não mudar a forma de ação”, explica médico.
Burattini recomenda ações claras para diminuir as taxas de transmissão do Brasil. “Na fase em que estamos temos de manter distâncias seguras, usar máscaras todas as vezes que sair de casa, só sair para o que realmente é necessário, evitar aglomeração, usar de álcool gel para fazer a higienização das mãos e buscar as informações certas e não de redes sociais”, alerta o infectologista.
A falta de medidas de prevenção e de comunicação coerente e efetiva são apontadas pelos especialistas como determinante para as quase 330 mil mortes.
“É muito fácil falarmos que a população é irresponsável, quando ela não foi informada com a intensidade e a consistência necessária. Passamos basicamente o ano inteiro só com restrição e não foi feita uma campanha efetiva de esclarecimento. Temos opiniões conflitantes, promessas de remédios que não funcionam, promessas de vacinas que não existem. Isso tudo leva a uma confusão e faz com que a população se sinta à vontade para fazer o quer fazer”, afirma Burattini.
Roberto Kraenkel acredita que a falta de preocupação com a prevenção é o mais grave no Brasil. “Não conseguimos respaldo para tomarmos atitudes preventivas. Existe um fator central para o crescimento que foi o surgimento da variante brasileira, mais transmissível e que acelerou a epidemia. Depois do que aconteceu em Manaus em janeiro, não se fez nada para o vírus não sair de lá. Os aviões continuaram lotados, saindo de lá para o Brasil todo. É evidente que ia espalhar”, afirma o professor.
O controle de transmissão e da pandemia se dá por meio da vacinação em massa, porém a imunização da população é uma medida de controle da infecção, não para resolver a situação vivida atualmente.
“A vacinação começou tarde e é importante vacinar as pessoas o mais rápido possível, para salvar vidas e evitar que aconteça novamente o momento de agora. Sendo bem realista, para resolver os quase 4 mil mortos por dia, não é com a vacina que resolve, é com o isolamento social”, ressalta Kraenkel.
O infectologista da EPM/Unifesp lembra que, embora a imunização seja importante para o futuro, não significa que o vírus vai parar de circular. “Supondo que a gente consiga o que o Ministério da Saúde está propondo, com as vacinas que temos a CoronaVac e a Oxford, a imunização não será total. Se a população achar que ao tomar a vacina, pode agir como foi feito nesse verão, vamos ter um recrudescimento da epidemia de novo porque o vírus seguirá em cirulação. Podemos não chegar nos números de agora, mas teremos números altos de casos”, ressalta Burattini.
A demora na aplicação dos imunizantes e de ações indicam que os brasileiros ainda perderão o sono com a pandemia por um tempo. “Infelizmente, mais um ano ainda sofremos com a covid. Precisamos entender por que essas pessoas estão saindo de casa? Qual é a necessidade dessa pessoa sair de casa? Qual é a orientação que preciso dar para que essa pessoa possa reduzir ao máximo o risco de contrair a infecção”, reafirma Burattini.
“A situação nesse momento é muito ruim. De fato, não houve um esforço real para evitar a situação que estamos nem para colocar comida na mesa das pessoas. Precisaremos ser mais efetivos para conter a doença e o problema social”, finaliza Kraenkel.
R7