Os antibióticos, ao atacar as bactérias, exercem uma pressão seletiva sobre elas, que lutam para sobreviver. Aquelas que não são extintas são chamadas de resistentes ou superbactérias. Elas se multiplicam, passando o gene da resistência à prole, conforme explica a infectologista Ana Gales, diretora do Laboratório Especial de Microbiologia Clínica da Unifesp.
Embora pacientes em ambiente hospitalar estejam mais expostos à infecção por superbactérias, elas já foram encontradas até em praias, lagoas e rios no Brasil, como o rio Carioca, que atravessa diversos bairros do Rio de Janeiro e deságua na Praia do Flamengo, conforme registrado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), em 2014. O Brasil conta, desde o ano passado, com um plano de ação nacional para combater a proliferação das superbactérias, alinhado com a OMS.
Existem cerca de 500 mil pessoas com suspeita de infecção por bactérias resistentes a antibióticos em 22 países, segundo a infectologista. As superbactérias mais relatadas são Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Staphylococcus aureus e Streptococcus pneumoniae.
Cerca de 700 mil pessoas morrem por ano em decorrência da resistência bacteriana, ou seja, devido às superbactérias. A partir de 2050 a estimativa é que esse número passe a 10 milhões, superando o número de mortes por câncer, de 8,2 milhões, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).
A infectologista explica que a resistência bacteriana é um processo natural entre esses micro-organismos, mas pode ser acelerada pelo uso inadequado e excessivo de antibióticos, utilização generalizada desses medicamentos na agricultura e na pecuária, más condições de higiene, aumento de pacientes imunodeprimidos, falhas no controle de infecções hospitalares e demora no diagnóstico das infecções bacterianas.
Um relatório da OMS revelou que o Brasil é um dos maiores consumidores de antibiótico do mundo, com 22,75 doses diárias consumidas a cada mil habitantes. O país está na 19ª colocação, à frente de países como Bolívia, Canadá, Peru, Espanha, Portugal e Alemanha.
A KPC (klebsiella pneumoniae) é superbactéria mais frequente em infecções em UTIs no Brasil. O avanço da sua resistência se acentuou a partir de 2010, quando foram registrados os maiores surtos que afetaram vários Estados do país, com dezenas de mortes. Em 2017, novos surtos de KPC foram registrados em São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso e Bahia.
Para combater o problema e, por consequência, se proteger, a infectologista orienta o uso apropriado de antibióticos na medicina e também na agropecuária. “Muitas vezes, animais saudáveis são submetidos desnecessariamente a esses medicamentos para o ganho de peso”, afirma. Além disso, garantir o saneamento básico e incentivar o desenvolvimento de novos medicamentos. “Não podemos esquecer ainda do papel essencial da prevenção de doenças por meio da vacinação e de simples hábitos de higiene, como a lavagem constante de mãos” .
R7