As 158 famílias do Território Quilombola Jatobá (BA) comemoram, nesta quarta-feira (30), a imissão na posse do imóvel rural – desapropriado pelo Incra – com 13,7 mil hectares.
Localizado no município de Muquém do São Francisco, no Velho Chico, o território está na etapa final de sua regularização fundiária. Enquanto não são titulados comunitariamente, as famílias irão receber o Contrato de Concessão e Uso (CCU) da terra.
Essa área corresponde a quase totalidade do perímetro do território que é de 15,4 mil hectares. Cada hectare corresponde, aproximadamente, a um campo de futebol.
O superintendente regional do Incra na Bahia, Carlos Borges, destaca a segurança jurídica que as famílias terão a partir da posse do Incra sobre o imóvel rural.
“Além da segurança da terra, as famílias terão acesso às políticas públicas da agricultura familiar e às modalidades do Crédito Instalação”, acrescenta Borges.
“Para nós significa liberdade. Era um sonho que se torna realidade. É um momento histórico”, assegura o presidente da Associação dos Remanescentes de Quilombo do Jatobá, João Rodrigues da Silva.
Já o quilombola Jacó Saturnino se recorda que a bisavó de sua mãe já tinha sido sepultada no cemitério da comunidade. “Nossa luta é antiga, a associação foi criada em 1998. Esse momento é aonde mais longe chegamos”, conta.
Jornada
Embora o Incra tenha instaurado o processo de desapropriação da Fazenda Jatobá em 2010, somente após 12 anos, a Justiça Federal decretou a sua desapropriação. Os herdeiros do proprietário foram indenizados pelo Instituto pelas terras obtidas.
O território também é formado por área da União, que se refere a Linha Média de Enchente Ordinária (LMEO). São as terras que margeiam o rio São Francisco. Em 2007, a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) outorgou a titulação de 1,7 mil hectares referente a esses trechos.
Mas a jornada da comunidade Jatobá por reconhecimento começou em 2004 quando foi certificada pela Fundação Cultural Palmares. Em seguida, teve o processo de regularização fundiária aberto pelo Incra.
O Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), publicado em 2006, foi elaborado através de um convênio entre o Incra, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade do Estado da Bahia (Uneb).
Em 2007, a autarquia federal publicou portaria de reconhecimento e a Presidência da República decretou, em 2009, o imóvel rural Fazenda Jatobá como de interesse social.
Comunidade Jatobá
O nome Jatobá é originário das diversas árvores de mesmo nome que existem na comunidade, formada por pequenos lugarejos denominados de Cipó, Barreiros, Jatobá e Limoeiro.
A relação entre os quilombolas desses locais é antiga. Eles têm grau de parentesco e, no passado, compartilhavam do mesmo cemitério. Eles são originários de escravos fugidos, tanto do Nordeste, como de fazendas de criação de bovinos da região.
O Relatório Antropológico do Jatobá retrocede há 150 anos de história de ocupação da comunidade. Em 2006, o documento identificou famílias que já estavam na 6ª geração de descendentes dentro da comunidade. O documento aponta que o primeiro grupo se instalou no local, por volta de 1870.
O rio São Francisco tem forte impacto nas famílias do Jatobá. Os quilombolas cultivam pequenas áreas na vazante do rio, chamadas de lameiros; como também “fazem roça” na ilha de Paratinga e em áreas próximas às moradias. Eles pescam e criam animais, principalmente, galinhas e cabras.
De acordo com o relatório, para os quilombolas do Jatobá, a terra não é somente fator de produção, mas também de bem social e espaço de construção de sua cultura.
“Eles plantam, criam, coletam e caçam, organizam festejos, desenvolvem rituais, brincam e estabelecem suas relações sociais e dão sentido de pertencimento à terra”, conta o documento.