O fim de ano é marcado por celebrações e momentos de união familiar, mas, nos casos de muitas famílias, a realidade não é bem essa…
Infelizmente, no Direito é comum que sejam vistas verdadeiras “guerras de famílias”: brigas que surgem entre familiares por conta de guarda ou pensão dos filhos, heranças deixadas pelos pais e situações do gênero.
Com as famílias juntas em uma mesma casa para as festas de final de ano, é comum que essas brigas se intensifiquem.
Você sabia que é possível evitar, ou, pelo menos, reduzir bastante a ocorrência de conflitos nas famílias por meio de um bom planejamento sucessório?
Chamamos o advogado André Andrade, especialista em Direito de Família, Sucessões e Planejamento Sucessório para falar um pouco sobre essa questão:
O que é o planejamento sucessório?
Planejar a sucessão é, de forma resumida, não apenas esperar que as coisas aconteçam na sua família de forma aleatória quando você não estiver mais aqui, mas sim organizar o futuro da família da melhor forma possível – tanto financeiramente quanto emocionalmente, evitando desgastes entre seus parentes e garantindo que sua família não se destrua quando você partir.
Quando uma pessoa vem a falecer, a regra é que seja feito um inventário dos seus bens, com a divisão do patrimônio na forma como a lei estabelece. Além disso, se a pessoa deixou filhos menores, também é a lei que vai definir quem ficará com a guarda destes filhos.
O planejamento sucessório funciona como uma forma de fazer valer a vontade da pessoa, dentro, é claro, dos limites jurídicos para tanto, mas não se sujeitando ao que estabelece a lei.
Pode-se dizer que o ato de planejar a sua sucessão é um ato preventivo, uma vez que aquele que faz a sucessão pode escolher para quem deixar seus bens, quem será guardião de seus filhos e afins, prevenindo, assim, uma série de complicações futuras que poderiam vir a gerar essas “guerras de famílias”.
Além disso tudo, o planejamento sucessório funciona para uma importante economia de tempo e de dinheiro, pois são muito mais céleres e econômicos que os inventários judiciais ou extrajudiciais.
Quais os instrumentos do planejamento sucessório?
Vários são os instrumentos utilizados no planejamento sucessório e a escolha de um deles dependerá do objetivo daquela pessoa que realiza o planejamento. Podemos listar os seguintes instrumentos para planejar a sucessão:
1 – Holding familiar
A holding familiar costuma ser a “queridinha” dos planejamentos sucessórios. Trata-se de uma empresa controladora de bens, normalmente no formato de empresa limitada (Ltda.), e tem como principais vantagens: a possibilidade de economia no âmbito tributário; a melhor administração dos bens que integram o patrimônio, que estão sob gerência da empresa criada; a maior simplicidade para fazer a divisão do patrimônio e dos frutos que ele gera, a exemplo de aluguéis de imóveis; a maior proteção ao patrimônio em vida, pois uma eventual execução contra a pessoa física não fará com que os bens sejam objeto de penhora; dentre outros.
2 – Doação e usufruto
Apesar de parecer simplória, a doação é um poderoso instrumento para quem deseja se organizar em vida e definir para quem irão os seus bens.
As principais vantagens da doação são: 1. Evitar a realização do inventário, mesmo havendo reserva de usufruto (que se extingue automaticamente com o falecimento do doador); 2. Dissolver possíveis brigas na família decorrentes de uma disputa pelo patrimônio, pois o proprietário já transmitiu o seu patrimônio de forma prévia; 3. Economia em relação aos impostos que devem ser pagos para a transmissão do patrimônio; 4. Proteção da família contra execuções e dívidas que porventura teriam que enfrentar.
É comum observar que existe um receio de perda de controle de patrimônio ao realizar uma doação, mas isso pode ser contornado por meio do instituto do usufruto (que é, em resumo, uma cláusula que permite que o doador mantenha todos os direitos em relação ao bem, com exceção do direito à venda), bem como por meio das cláusulas restritivas de direito, tais como: cláusulas de inalienabilidade (impedimento de venda do bem doado); cláusulas de incomunicabilidade (esse bem não poderá ser dividido com o cônjuge/o companheiro de quem recebeu a doação) e cláusulas de impenhorabilidade (vedação à possibilidade de penhora do bem). Ambos os instrumentos são protetivos ao doador e permitem o controle do patrimônio mesmo com a doação.
Mas vale lembrar que existem algumas restrições colocadas em lei para a doação, a exemplo da impossibilidade de doação universal (doação da totalidade do patrimônio). Um advogado especializado em Sucessões e Planejamento Sucessório certamente saberá orientar acerca destas vedações e, mais ainda, planejar a sua sucessão da forma mais efetiva, econômica e tranquila possível.
3 – Testamento
O testamento talvez seja o mais conhecido instrumento de planejamento sucessório.
Dentre as principais vantagens do testamento, é possível citar: a possibilidade de determinação prévia dos bens entre os herdeiros e a escolha de novos herdeiros e legatários; evitar litígios entre os herdeiros por falta de concordância quanto à divisão dos bens; a possibilidade de instituir um curador para os filhos menores ou até mesmo de já determinar quem será o tutor destes filhos no caso de falecimento dos genitores, de modo que as crianças não dependerão de decisão da justiça nesse sentido; a possibilidade de instituir encargos específicos para os herdeiros; dentre outras.
Vale lembrar que um testamento pode ser feito de forma particular, mas o mais comum é que seja utilizada a forma pública – será levada a registro no Cartório de Notas. Para que o testamento seja válido e não venha a ser passível de anulação no futuro, é necessário respeitar uma série de regras estabelecidas em lei, o que certamente será observado pelo advogado especialista ao elaborar esse instrumento.
4. Seguro de vida
O seguro de vida é um excelente instrumento de planejamento sucessório, que conta com diversas modalidades, e pode ser muito útil para quando a sucessão se instaurar.
Dentre as principais vantagens do seguro de vida, vale destacar: a isenção do pagamento do ITCMD e a desnecessidade de passar pelo inventário; o fácil acesso do beneficiário ao patrimônio líquido após o falecimento do segurado, bastando apenas a apresentação dos documentos necessários; o seguro de vida não responde pelas dívidas do falecido, ou seja, não é preciso que o valor do seguro seja usado para o pagamento de eventuais dívidas deixadas pelo segurado; a livre escolha do beneficiário, podendo ser pessoa que figura ou não como herdeira do falecido.
5. Previdência privada
A previdência privada é uma aposentadoria que não está ligada ao sistema do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e também funciona como um eficiente instrumento de planejamento sucessório.
Existe um entendimento de que a previdência privada se igualaria ao seguro de vida e assim poderia se usufruir das vantagens desse como a isenção do imposto de transmissão e a desnecessidade de inventário.
Importante observar, porém, que os tribunais vem aos poucos resistindo a aplicar a analogia das regras do seguro de vida à previdência privada e determinando a inclusão desta no inventário, não sendo assim o instrumento mais interessante para fins sucessórios.
O que é importante ter em mente ao fazer o planejamento sucessório?
Vale lembrar que é possível utilizar mais de um desses instrumentos ao planejar a sucessão. Na verdade, isso é algo bastante recomendável, pois cada um dos instrumentos acima tem uma série de vantagens pode ser interessante associá-los para um melhor resultado do planejamento sucessório conforme cada caso.
O mais importante é que o planejamento sucessório seja feito de forma individualizada, conforme as necessidades e os desejos de cada pessoa, por um profissional especializado e qualificado, para garantir que ele efetivamente cumprirá o seu objetivo e não irá ao contrário, gerar ainda mais problemas futuros.
Sobre André Andrade
Advogado, inscrito na OAB/BA 65.674, bacharel pela Universidade Federal da Bahia, pós-graduado em Advocacia Contratual e Responsabilidade Civil pela EBRADI, em parceria com ESA-SP, membro associado da Academia Brasileira de Direito Civil (ABDC) e mestrando em Família na Sociedade Contemporânea na UCSAL. Atualmente é sócio do escritório de advocacia Bezerra Viana Andrade Braz. Contato: @advogadoandreandrade / 71 99976-8547