Nesta semana, o senador Pedro Chaves (PSC-MS), relator da Medida Provisória (MP) 746/2016, que estabelece a reforma do ensino médio, deverá apresentar seu parecer à comissão mista que analisa a medida no Congresso Nacional. Às vésperas da apresentação,no encontro do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), que ocorreu até a última sexta-feira (25) em Brasília, a Agência Brasil conversou com alguns dos secretários sobre as mudanças previstas na MP e sobre como estão se organizando para implementá-las.
Atualmente, o ensino médio tem 8,1 milhões de matrículas, a maioria em escolas públicas (87%) da rede estadual (80%), ou seja, a implementação da MP recairá principalmente sobre os estados. As realidades são diferentes em cada unidade da Federação. Algumas estão mais adiantadas e pretendem começar a colocar o modelo em prática em 2018, como São Paulo. Para o Rio de Janeiro, a crise financeira implica que o estado tome “uma fase de cada vez”.
Entre as principais alterações que constam na MP estão a ampliação da jornada escolar das atuais quatro horas obrigatórias por dia para sete horas, progressivamente. Quanto à estrutura curricular, a MP estabelece que parte do ensino médio seja voltada para os conteúdos que serão definidos na Base Nacional Comum Curricular, atualmente em discussão no Ministério da Educação (MEC), e parte para itinerários formativos, que serão escolhidos pelos estudantes. A MP define cinco itinerários: linguagens; matemática; ciências da natureza; ciências humanas; e formação técnica e profissional.
Com a flexibilização, apenas português e matemática serão obrigatórios nos três anos do ensino médio.
A MP sofre resistência no país por parte de professores, educadores e estudantes, que promovem atos, greves e ocupações em diversos estados. Para os secretários, o desafio é também promover o diálogo com os diversos setores da educação.
Distrito Federal
Uma das possibilidades de implementação da MP discutida no Distrito Federal é o modelo de escolas vocacionadas, ou seja, escolas que concentrem um ou alguns dos itinerários formativos e que os estudantes tenham escolas mais ou menos próximas umas das outras, com várias possibilidades para que possam escolher.
Segundo o secretário de Educação, Júlio Gregório, as discussões ainda estão em curso. Os debates serão levados às escolas, que elegerão representantes para discussões nas regionais de ensino. “É importante que tenhamos um ensino médio que contemple as possibilidades de o aluno ser protagonista do processo e poder optar de acordo com a sua área, sua aptidão”, diz.
Quanto à oferta de ensino técnico, uma das propostas é colocar à disposição dos estudantes os cursos oferecidos nas escolas técnicas que já existem e serão construídas no DF e ampliar a oferta para além dos estudantes que fazem o ensino médio nesses locais, atendendo às escolas próximas. “Esse desenho de articulação permite inclusive a otimização do orçamento. As escolas técnicas são mais caras. Quando planejamos esse desenho, socializamos melhor o dinheiro investido no centro de formação, na medida em que você o coloca à disposição do maior número de alunos, integrando a educação”, explica.
Rio de Janeiro
Diante de um grave crise financeira, o estado do Rio de Janeiro se prepara para aderir gradualmente ao novo modelo. “Todos os estados estão com a mesma dificuldade, os mesmos questionamentos. Existe um orçamento, existe uma arrecadação, isso tem que ser adaptado”, diz a representante da Subsecretaria de Infraestrutura da Secretaria de Educação, Julia Sant’anna.
Ela afirma, no entanto, que a MP será aplicada e que o estado tem escolas de referência, onde metodologias de ensino semelhantes já são aplicadas. Isso deverá facilitar a ampliação para a rede. O estado aderiu integralmente, com todas as vagas que lhe são reservadas, ao Programa de Fomento à Implementação de Escolas em Tempo Integral para o ensino médio, pelo qual o MEC oferece R$ 2 mil a mais por aluno por ano para ajudar os estados.
“Não é uma mudança fácil, mas é um passo, depois outro passo, é exequível”, diz Julia, “O Rio de Janeiro está aderindo com 100% do que pode aderir, vamos dando passos conforme for caminhando a arrecadação”.
Pernambuco
Pernambuco é tido como referência pelo Ministério da Educação na implantação do tempo integral no ensino médio. Atualmente, segundo o secretário de Educação, Fred Amâncio, 43% das escolas funcionam com uma jornada de sete horas por dia, ou seja, os estudantes ficam mais tempo na escola e têm atividades no contraturno.
Amâncio atribui ao tempo integral o fato de o ensino médio do estado ter saído da 21ª posição, em 2007, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que mede a qualidade da educação por meio de avaliações em português e matemática, e ter alcançado o topo do ranking, em 2015, junto com São Paulo, na última divulgação.
“Nós iniciamos esse processo. Algumas experiências que temos em tempo integral talvez tenham facilitado esse processo em Pernambuco, mas é claro que a MP vai implicar todo um redesenho da rede, vai redesenhar a estrutura da escola”, observa. “Nosso desafio daqui para a frente, a partir da aprovação, será intensificar os debates”.
Alagoas
Alagoas discute como implementar as mudança em um estado de distintas realidades, segundo o secretário de Educação, Luciano Barbosa. “Temos que mapear a carência de profissionais em determinadas regiões do alto sertão alagoano, médio sertão, zona da mata, de cada região. Em Maceió é mais fácil de reter recursos humanos”, diz.
O estado têm 13 gerências regionais e, em cada um delas, há uma discussão técnica sobre a melhor adequação da rede de nível de médio à MP. “Isso está sendo discutido em função da realidade. Com um Ideb de 2,8 em 2015, o estado teve o segundo pior resultado, junto com o Rio Grande do Norte.
“Temos uma dívida muito grande com educação, precisamos implementar, talvez mais rapidamente, medidas que em outros estados já foram implementadas”, diz Barbosa.
São Paulo
O estado de São Paulo se prepara para iniciar as mudanças na rede a partir de 2018, segundo o secretário adjunto de Educação, Francisco Carbonari. “Como essa implantação vai evoluir, vai condicionar o tempo [de implantação em toda a rede]. Se a implantação for bem sucedida, as coisas ficarão mais fáceis, se houver algum problema na implantação, as coisas ficarão mais difíceis”, afirma. Até lá, o estado deverá amadurecer um modelo para tirar a MP do papel.
A intenção do estado é acabar com as disciplinas. “Temos alguns modelos, o principal deles é romper com o esquema estrutural das disciplinas para trabalhar com componentes curriculares. Não é uma coisa simples e demanda um trabalho grande porque temos uma cultura institucionalizada de trabalho por disciplina, as formações dos professores são focadas no trabalho por disciplinas”.
Sobre a expansão do modelo definido para toda a rede, o estado ainda não tem previsão, principalmente por questões financeiras.”Talvez São paulo seja percentualmente o estado que mais sofre com queda de arrecadação, que é onde ela cai mais significativamente. Existem questões que a conjuntura vai definir e a gente não tem, neste momento, informações suficientes para dar essa respostas”, diz Carbonari.
Amazonas
Um dos modelos que o Amazonas examina é perguntar para os estudantes o que eles querem cursar, qual itinerário formativo pretendem seguir em cada escola e, a partir daí, a secretaria oferece, de acordo com a demanda. “Não é simples, mas é o caminho que eu defendo, não dá para colocar o aluno no centro da discussão e não contemplar os sonhos e as vontadades dele”, diz o secretário de Educação, Algemiro Ferreira.
Quanto à infraestrutura, a secretaria pretende começar ofertando o que falta às escolas que já têm mais recursos. O estado é um dos que oferecem ensino de quatro horas em parte da rede. A partir de 2017, a intenção é ampliar essa oferta para cinco horas por dia. “Selecionaremos as escolas com quadras, com laboratório, que precisam de investimento mínimo, para já fazê-lo em 2017. As que precisam de adequação maior, de quadras de esporte, gradativamente vamos estruturando”.
O secretário defende que a reforma seja feita gradativamente. “Não se consegue fazer um reordenamento de uma vez só”. Ele lembra que o estado passa por dificuldades financeiras, como o restante do país, e que isso também freia a implementação em curto período de tempo.
Santa Catarina
Santa Catarina passou recentemente, em 2014, por um processo de revisão do currículo e, de acordo com a secretário adjunta de Educação, Elza Marina Moretto, a intenção é conciliar as mudanças recentes com a MP. “Temos a tradição de base curricular de Santa Catarina. Mudam as equipes gestoras, mas a proposta continua avançando, foi construída com base na democracia”, afirma.
No estado, segundo Elza, 25% da rede têm acesso ao ensino técnico, o que favorece a implantação da reforma. O principal desafio agora é “apaziguar a rede do ponto de vista de como estão interpretando a reforma do ensino médio. Se tivesse se constituído por um projeto de lei, a coisa tinha ganhado outro caminho, a MP é sempre uma coisa meio antipática, sempre verticalizada. As pessoas estão se perdendo na discussão de que é uma MP e não estão discutindo tanto o conteúdo da medida”.
Elza acrescenta que a questão financeira deverá pesar na implementação. “A gente sabe que para fazer tudo isso tem que ter financiamento. Não dá para fazer toda essa inovação com o dinheiro que temos. Vai requerer contratação de professor, mudança curricular, infraestrutura, coisa que a curto, médio e longo prazo vai ter que ser pensado”.
Agência Brasil